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Noite saudade no Festival de Oron

O festival acontece no ambiente mágico do castelo de Oron (www.swisscastles.ch) www.swisscastles.ch

Um dos últimos festivais do verão suíço ocorreu num ambiente muito particular: um castelo de mais de 800 anos, o castelo de Oron.

Uma das três noites foi dedicada ao tema “saudade”, com Taiomara (jovem artista brasileira) e os consagrados Bonga, angolano, e Teófilo Chantre, cabo-verdiano.

Convenhamos, um festival de música em um castelo de mais de 800 anos é algo raro e de um ambiente muito particular. Duas salas do castelo foram reservadas para o festival pago, uma com programação de jazz outra com música do mundo “world musique”.

Um festival “off” gratuito ocorre ao ar livre (se o tempo ajuda) ou no páteo interno do castelo. Toda a organização é feita por voluntários e só os artistas são pagos.

Saudade com Caetano e Chico

Na segunda edição, no primeiro fim de semana de agosto, na sala reservada à música do mundo, uma noite teve o tema “saudade”, com as versões brasileira, cabo-verdiana e angolana.

Começou com Taiomara, uma jovem cantora e violonista paranaense (21 anos) recentemente radicada na Suíça. Ela conta que começou a tocar com 7 anos.

– Era canhota mas o violão acabou ficando na mão direita mesmo. Aí fui tendo contato com artistas paranaenses e fui estudando, inclusive no conservatório, no Paraguai. Tinha épocas de contatos mais intensos com a música e outros menos. De uns três ou quatro anos para cá é que me dediquei mesmo.

Em Oron, ela interpretou principalmente Chico Buarque e Caetano Veloso e diz que só toca para os outros o que ele mesmo gosta. Taiomara trabalha atualmente no projeto do primeiro disco, previsto para o ano que vem, com 8 músicas de sua autoria.

A riqueza de Cabo Verde

A noite saudade continuou com o músico e compositor cabo-verdiano Teófilo Chantre. Antes de ser conhecido pelo seu próprio trabalho e gravado quatro discos até agora, Teófilo Chantre compôs algumas das mais conhecidas músicas para Césaria Evora, cantora que colocou Cabo Verde no mapa mundial da música.

– Ela é incortornável na música cabo-verdiana e eu aceito que meu nome seja associado ao dela sem reticências. Também foi graças a ela que eu me tornei conhecido. Eu penso que ela ficará para sempre com essa imagem, em todo caso até que apareça outra pessoa com sua envergadura. Eu gosto muito dela e reconheço o papel que ela teve para a nossa música.

A música cabo-verdiana difere de outras músicas africanas por ser mais melódica e mais rica em harmonia. Teófilo Chantre atribui esse fato a vários fatores como as múltiplas influências africanas, européias – através do violino, do violão e do acordeão – e brasileiras (a partir dos anos 20). A mentalidade insular contribuiu e “talvez por ter escolhido a música para compensar os tos problemas da vida cotidiana”.

A familiaridade das duas músicas, cabo-verdiana e brasileira, deve-se à esse espécie de substrato cultural comum, o que criou um grande parentesco cultural entre Cabo Verde e Brasil. “Sempre que encontramos músicos brasileiros, dizemos que são músicos irmãos porque rapidamente vão entender a nossa música”.

Bonga e a África profunda

Para encerrar a noite “saudade” no castelo de Oron, o angolano Bonga solicitou aos organizadores que tirassem as cadeiras da sala porque ele queria botar fogo no castelo. Há anos que Bonga é o principal nome da música angolana mas seu trabalho já ultrapassou em muito as fronteiras angolanas.

Bonga é muito crítico do que vê à sua volta afirma, entrevista a swissinfo “felizmente ainda resta um lado bom da África que é a música.

– A música dá harmonia e ela é fundamental para a vida das pessoas porque contribui para o equilíbrio. Eu dou ritmo ao mundo e meu ritmo é africano. Ainda bem que isso existe (risos). A particularidade da África é a vivência real. Mesmo quando chora, o africano canta, mas com muito ritmo e muita harmonia.

A música “forte” do mundo

Bonga diz que só escuta a música “forte do mundo”, de gente que tem postura porque defende suas tradições específicas porque respeita a identidade de cada um. Para ele, a música que tem raízes é aquela que define toda uma civilização. “Essa é a música fundamental”, afirma.

O músico angolano gosta, portanto, de folclore, e de vozes. Cita as de Miriam Makeba, Rey Charles, Luiz Gonzaga e Jackon do Pandeiro. Questionado se, para o africano que é, a música instrumental tem menos valor, Bonga responde:

– De jeito nenhum, é a instrumentação típica que dá luz às vozes. A tradição começa com a instrumentação. O que vocês chamam de berimbau, em Angola é ungo, o que xilofone para nós é marimba. A África para mimm é o berço mas, quando eu ouço um chorinho, aquilo me embala, me leva aos píncaros da lua.

Bonga vive há muitos anos em Portugal mas afirma tem quase tudo (risos) de angolano porque “não tirei nada do que eu trouxe cá pra fora e é isso que faz de mim o artista que sou”.

– Antes de mais nada eu sou um defensor acérrimo da música de Angola, principalmente do semba que, segundo dizem, é o pai ou mãe de outros ritimos como o guagancó cubano e samba brasileiro. É isso que me anima a estar na vida.

Depois de retiradas as cadeiras, Bonga colocou fogo no público que dançou até as duas da madrugada no castelo de Oron.

swissinfo, Claudinê Gonçalves

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