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Polanski entra com recurso contra prisão

O cineasta franco-polonês durante a rodagem do filme "Oliver Twist" (1985). AFP

Quatro dias após a prisão do cineasta franco-polonês Roman Polanski no aeroporto de Zurique, seus advogados entram com recurso no Tribunal Penal Federal em Bellinzona.

As autoridades judiciais têm dez dias para tomar uma decisão. Na imprensa helvética e americana, críticas são feitas à detenção.

Como informa a imprensa, os advogados de Roman Polanski entraram com recurso contra a sua prisão em Zurique. Agora um tribunal federal suíço em Bellinzona tem dez dias para tomar uma decisão. A possibilidade de pagar fiança para aguardar em liberdade o embate jurídico que poderá levar à sua extradição aos Estados Unidos existe, mas é muito remota. Como as autoridades explicam, o cineasta franco-polonês não tem residência fixa na Suíça, ou seja, o perigo de uma nova fuga é considerável.

Porém, Polanski é um grande fã do país dos Alpes. Há mais de 40 anos ele frequenta as montanhas do cantão de Berna, onde possui há um ano um belo chalé na região de Gstaad. A casa tem o pomposo nome de “Milky Way”. Como informa o jornal Blick, o franco-polonês é visto sempre nas ruas e cafés do fino vilarejo, sendo considerado uma pessoa “discreta” e “simpática”. Ele chegou a passar dois meses do último verão no local.

Críticas da imprensa

A imprensa helvética é pouco piedosa com Polanski. O Le Temps lembra que “mesmo um grande cineasta não está acima da lei”. O jornal francófono lembra que o ato sexual com uma pessoa menor de 16 anos é um delito grave, mesmo se a vítima consentiu o ato. Além disso, o eleitor helvético aprovou nas urnas em novembro de 2008 a não prescrição de crimes ligados ao abuso sexual de menores de idade. O mesmo vale para os Estados Unidos pelo fato do cineasta ter fugido antes do julgamento.

Porém, outros editorialistas questionam a validade – ou “conveniência” – da detenção de Polanski. O NZZ considera completamente justa a atuação das autoridades, mas lança uma questão complicada: por que nos últimos anos nenhum país europeu prendeu o cineasta, apesar de este circular livremente por vários deles desde os anos 1970?

“Parece pouco convincente o argumento de que os Estados Unidos tenham feito pressão sobre a Suíça, assim como a possibilidade desta tirar vantagem dessa prestação de serviço às autoridades americanas”, escreve o NZZ. Ao contrário, segundo o jornal de Zurique, “é pouco provável que a América tenha grande interesse em reabrir um caso capaz de revelar diversos erros jurídicos já documentados”.

Também nos Estados Unidos se escutam críticas semelhantes. O Los Angeles Times lembra que o Estado da Califórnia vive hoje uma situação dramática de cortes nos orçamentos do seu sistema carcerário e da libertação, obrigada por autoridades federais, de mais de 40 mil detentos das prisões devido à superlotação. A questão: “É válido gastar os poucos dólares restantes dos contribuintes para colocar Roman Polanski, após tantos anos, atrás das grades?”.

Prisão correta

Para a Suíça, a situação começa a se tornar um pouco embaraçosa. Questionada por jornalistas, a ministra das Relações Exteriores, Micheline Calmy-Rey, declarou que “faltou um pouco de tato”.

Ela não foi informada da operação com antecedência e agora enfrenta a ira de artistas e representantes dos governos da França e da Polônia. Porém, ressalta, assim como sua colega, a ministra da Justiça e Polícia, Eveline Widmer-Schlumpf, que a prisão de Polanski foi, do ponto de vista jurídico, absolutamente correta. O acordo de cooperação com os EUA não abre brechas ou exceções.

Entrevista de 1987

O fato concreto é que a polêmica tem trazido à tona várias lembranças do passado. Uma delas voltou a ser exibida em todos os jornais: a primeira entrevista de Roman Polanski à opinião pública americana desde a sua fuga dos Estados Unidos.

Datado de 1987, o vídeo (clicar no link à direita) mostra como o cineasta considerava o ato sexual cometido contra a jovem de 13 anos. “Eu sei agora que foi um erro, mas aconteceu simplesmente”, declarou. Depois: “Na época tinha dificuldade para me convencer de que isso era um erro. Eu pensava simplesmente que ninguém havia se ferido”.

À jornalista, o cineasta se mostrou como vítima de uma guerra cultural. Ao mesmo tempo, ele estava tendo um caso com a atriz Nastassja Kinski, na época com dezesseis anos.

Ao ser questionado sobre sua paixão por mulheres muito jovens, Polanski se enfureceu. Ele qualificou os americanos de “hipócritas” e defendeu a relação. “Nós vivemos a nossa vida. Ninguém se feriu. Eu não compreendo isso: por que devo ser punido pela minha paixão por jovens mulheres?”.

Alexander Thoele, swissinfo.ch (com agências)

O crime pelo qual Polanski é acusado ocorreu em 1977. Aos 44 anos, o cineasta havia convidado uma jovem de 13 anos, Samantha Geimer, para uma sessão de fotos para a revista Vogue, na residência do ator Jack Nicholson, em Los Angeles. Segundo os autos, o diretor deu à menina champanhe e tranquilizantes, antes de pedir que tirasse suas roupas. Em uma piscina, os dois completaram o ato sexual. Posteriormente Geimer declarou que teve medo do cineasta e por isso se sujeitou ao seu assédio.

O cineasta contestou, na época, a versão da menina, mas confessou ter tido relações sexuais com a menor de idade. Ele foi preso e liberado mediante pagamento de 2.500 dólares de fiança. Durante as investigações, Polanski foi detido novamente, dessa vez por 42 dias. Pouco depois, embarcou em um avião para Londres e depois para Paris, onde vive até hoje com sua esposa, a atriz Emannuelle Seigner. Ele nunca mais retornou aos EUA, nem para receber o Oscar em 2003 pelo filme “O Pianista”.

Polański nasceu em Paris, em 18 de agosto de 1933, com o nome de Rajmund Liebling. Ele era filho de Ryszard Polański (também conhecido por Ryszard Liebling), de religião judaica, e Bula Polański (nome de solteira Katz), uma católica.

Em 1937, a sua família voltou à Polônia. A sua mãe morreu num campo de concentração, mas ele conseguiu evitar a prisão e o envio aos campos, escapando do Gueto de Varsóvia, e passou a Segunda Guerra Mundial em fuga permanente, de um lugar para o outro. Ao final da guerra estudou na Polônia, tendo concluído estudos na escola de cinema de Łódź, em 1959.

Seu primeiro filme de longa-metragem, realizado em 1962 e falado em polonês, A Faca na Água, recebeu boa acolhida da crítica e o lançou numa carreira internacional dirigindo filmes em inglês e francês.

Trabalhou como ator nos filmes Uma Simples Formalidade (1994), do diretor Giuseppe Tornatore, O Inquilino (1976), do próprio, e Dança dos Vampiros (1967), também dirigido por ele.

Casado com a atriz francesa Emmanuelle Seigner desde 1989, entre seus principais trabalhos estão Repulsa ao Sexo, O Bebê de Rosemary e Chinatown. (Wikipédia em português)

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