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Presença suíça na Bienal de Arquitetura de Veneza

Jürg Conzett, engenheiro e curador da exposição no pavilhão suíço. Keystone

A Bienal de Arquitetura de Veneza deste ano tem por tema “Pessoas Encontram a Arquitetura”. O argumento é propício para a maré de turistas que desembarca todos os dias na cidade de Marco Polo.

Os visitantes podem dar a volta ao mundo sem sair dos quarteirões ilhados pelos canais. A presença de 43 participantes de 53 países, entre eles a Suíça, representada na banca de jurados, mostra um mosaico arquitetônico atual e futurístico em escala planetária.

O título da exposição fala muito de perto à Suíça, país de montanhoso onde construir sua infraestrutura sempre foi um desafio para seus muitos arquitetos e a engenharia civil.

O Pavilhão da Suíça trouxe “Paisagens e Infraestrutura”, uma grande mostra curada pelo engenheiro Jürg Conzett. Ele apresenta para o público uma viagem pelo país através de fotografias e maquetes. A mostra traz também recortes de jornais e revistas de época com artigos e ilustrações de algumas obras. “Sim, esta foi uma escolha pessoal, o roteiro foi baseado nas minhas vivências, depois saímos para fotografar e encontramos tantas coisas interessantes”, diz Jürg Conzett à swissinfo.ch.

Jóias arquitetônicas suíças

A mostra divide-se em 23 salas, com obras que cobrem quase cinco séculos. Elas vão de 1545, como a Chibrücke Stalden, uma construção de Ulrich Ruffiner, na forma de uma elipse sobre a gola de Mattervispe, até a Dorfbrücke, no cantão do Valais (sudoeste), de 2010, realizada por Conzett, Bronzini e Gartmann, com as pedras locais. O trabalho rende a devida homenagem aos pioneiros e aos seus discípulos, inclusive a influência exercida e aperfeiçoada pelo arco primordial usado pelos romanos antigos.

As fotografias não estão em ordem cronológica, mas na sequência em que foram retratadas ao longo do inverno, primavera e verão nos últimos nove meses. Este foi o tempo de gestação do inventário pessoal do curador Jürg Conzett, apaixonado por pontes e viadutos desde criança. Os grandes painéis em preto e branco refletem o olhar do homem através do filtro técnico do engenheiro. Eles foram feitos pelo fotógrafo de Zurique, Martin Linsi.

Obras que nascem da racionalidade da engenharia, ao longo do tempo acabam evoluindo com a criatividade da arquitetura. E é justamente o diálogo entre as duas disciplinas que ajuda a escrever a história da intervenção do homem na natureza, em benefício próprio e com o possível respeito ao meio ambiente. Uma atenção extrema ao detalhe apresenta, sob uma curiosa perspectiva, os colossos de cimento, concreto, aço, madeira e pedra como obras-primas exibidas numa galeria ao ar livre.

A rotina diária muitas vezes camufla a beleza e a grandiosidade de uma obra de engenharia sem a qual, a vida seria muito mais difícil, ainda mais se ela não pudesse ser adaptada às necessidades modernas. Basta pensar na travessia da gola de Viamala, complexo composto por uma primeira ponte, de 1790, depois alargada em 1821 e, finalmente, duplicada com uma segunda, em 1938. Fenômeno semelhante e mais recente ocorreu com o viaduto Farbtobel, obra realizada paralela
ao original semidestruído por uma avalanche. Os pilares da nova obra foram erguidos paralelos às antigas pilastras que acabam servindo como proteção extra.

Assistir às etapas da construção também provoca um grande efeito emocional. Em 1910, o viaduto ferroviário Sitter de Südostbahn ganhou um enorme vão central em aço. A nova estrutura de 900 toneladas foi apoiada, temporariamente, no canteiro composto por uma torre com cem metros de altura, adjacente à velha ponte de madeira Kubel, de 1780, construída pelo carpinteiro Hans Ulrich Grubenmann.

Em outros casos, o homem chega a alterar o curso da natureza para o bem comum. A rodovia Sustenpass, realizada entre os anos de 1938 e 1946, por Rudolf Walther e Eugen Nil, é um primor de integração entre da engenharia ao meio ambiente. Para chamar a atenção do motorista distraído pela paisagem, eles se preocuparam em proteger o meio fio do precipício com pequenos blocos de cor e forma vivas, com pedras da região. E, como grande ideia, desviaram um pequeno riacho e o transformaram numa cachoeira há poucos metros da rodovia.

Suíços originais

Na contramão desta integração entre obra e meio ambiente, está um dos nomes fortes da arquitetura suíça: Valerio Olgiati, presente no espaço Arsenale. Ele defende a independência da construção do contexto no qual foi realizada. O Perm Museum XXI surge como um grito de liberdade de uma arquitetura livre, assim como outros três projetos, The Yellow House, o National Palace Museum, em Taiwan e o Atelier Bardill. As fundações estão à mostra, como um peixe fora d’água. A inspiração para tanta ousadia ele busca no quintal de casa. Os estábulos são obras muito bonitas, mas sem nenhum nexo com o contexto, isso sem falar nos templos e igrejas de época.

No mesmo espaço Arsenale, o suíço Hans Ulrich Obrist, um dos mais importantes curadores de arte da Europa, montou um set televisivo e cinematográfico, uma verdadeira instalação audiovisual. Famoso pelas entrevistas com os artistas, desta vez, além de colocar o patrimônio de mais de duas mil horas de conversas gravadas – com nomes que vão de Cedric Price (1934-2003), arquiteto visionário, aos distantes e renomados japoneses anciãos, pais do metabolismo arquitetônico – HUO, como é conhecido na intimidade, conversa com os arquitetos participantes da Bienal. Dezenas de monitores exibem uma trilha sonora feita com quem entende do riscado, com inteligência e simplicidade.

Já nos Giardini de Veneza, outro aquiteto de formação suíça, Christian Kerez, de origem venezuelana, apresenta uma arquitetura integrada, na qual um simples ponto de um quarto se relaciona com o todo da obra. Para melhor entender o conceito expresso pelo arquiteto, é necessário perceber o conjunto como autossuficiente e rígido ao mesmo tempo. A ideia é ter uma construção com personalidade mesmo se for destinada a um uso diferente do original. Algo do tipo: “ a caravana passa, mas, o prédio fica”.

Ousadia futurística

Num mundo globalizado os arquitetos começam a procurar soluções locais nos exemplos universais. Zurique se prepara para o futuro espelhando-se nas megalópoles asiáticas. O desafio é moldar na realidade suíça as respostas arquitetônicas dadas a uma série de desafios como o crescimento urbano desenfreado, o aumento da densidade demográfica, o uso de espaços abandonados, a falta de áreas e o respeito ao meio ambiente. O Instituto Suíço de Veneza, deu uma importante contribuição para o debate sobre o tema com a mostra “ Hong Kong em Zurique?”.

O belo palácio a beira do grande canal abriga vinte propostas com a transposição adaptada de edifícios de Hong Kong para Zurique. Os autores deste exercício futurístico, Emanuel Christ e Christoph Gantenbein, professores da Escolha Politécnica Federal de Zurique (ETH), foram buscar no Oriente, a inspiração para a Zurique de amanhã. Na cidade asiática a luta é para conseguir espaço para construir casas e locais de trabalho.

Soluções pragmáticas colocam à prova a percepção ocidental de crescimento urbano sem diminuir a qualidade de vida que se reflete em serviços públicos, em novos quarteirões residenciais, na preservação de áreas verdes ao redor e dentro das cidades. “Não existe um ponto de contato entre Hong Kong e Zurique, a começar pela grande diferença de densidade demográfica. Nossos projetos provocam uma reflexão sobre o futuro das nossas cidades”, explica Christoph Gantenbein à swissinfo.ch.

Os estudos servem para delinear prováveis estratégias urbanas e transformar blocos e torres envidraçadas em unidades habitacionais de pouco impacto visual e ambiental. Mesmo diante da utopia, a Suíça segue um trilha que una o homem à natureza, se possível sem usurpar de um o que é de outro.

Guilherme Aquino, Veneza, swissinfo.ch

A Bienal de Arquitetura é o maior evento mundial da área. Neste ano, a curadora é a japonesa Kazuyo Sejima, autora, entre outras obras primas da arquitetura mundial, do prédio da Rolex Learning Center, em Lausanne, onde lecionou na Escola Politécnica Federal (EPFL).

Ela e o sócio Ryue Nishizawa venceram o Pritzker Archietcture Prize 2010, o Oscar da arquitetura.

O prêmio Leão de Ouro para a carreira foi dado ao arquiteto holandês Rem Koolhaas porque “cria prédios que estimulam a interação entre as pessoas”, afirmou Kazuyo Sejima.

Já o Leão de Ouro para a memória foi para o arquiteto Kazuo Shinohara, falecido em 2006

A Bienal é um local de confronto de ideias e troca de informações. Neste ano já foram assinados 23 protocolos com faculdades de arquitetura que vão da Inglaterra à Geórgia.

A exposição, aberta no dia 29 de janeiro, vai até o dia 21 de novembro.

Dos 53 países, alguns participam pela primeira vez da Bienal: Tailândia, Ruanda, Malásia, Irã e República de Bahrain.

Os jurados desta Bienal são cinco: dois italianos, uma vietnamita, uma japonesa e um suíço, Moritz Küng.

O principal prêmio da Bienal por nação foi para a República do Bahrain.

O Leão de Ouro para o melhor projeto Exhibition People meet in architecture foi para a japonesa Junya Ishigami.

Os vídeos dos principais encontros oficiais da Bienal podem ser vistos através dos site: www.labiennalechannel.org.

O trabalho de Jürg Conzett e Martin Linsi resultou num livro com 272 páginas e 162 fotografias.

O engenheiro Jürg Conzett é membro da Comissão Federal dos Monumentos Históricos, desde 2009.

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