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Sem-tetos de Genebra lutam por casa

O "Rhino" é a casa ocupada mais conhecida de Genebra. Keystone

Um dos "squats" mais conhecidos de Genebra, o "Rhino", luta contra as autoridades cantonais de Genebra contra expulsão dos seus 70 moradores.

A justiça já ordenou que os habitantes abandonem o complexo de casas ocupadas até 22 de novembro, porém a maioria decidiu resistir.

O “Rhino”, um complexo de três prédios localizado nas proximidades do Hospital Universitário de Genebra, é um dos últimos bastiões de um movimento que fez de Genebra, há uma década passada, a capital européia da ocupação de casas abandonadas (squatting).

Porém o squat, que nos últimos dezessete anos conseguiu com sucesso rebater todas as tentativas de desocupação, precisa agora lutar pela sua sobrevivência.

O último movimento desesperado de defesa foi a entrega de um abaixo-assinado com 12 mil assinaturas em agosto, solicitando às autoridades que o governo compre os prédios e feche contratos de aluguel com os moradores originais. Para aumentar a pressão, simpatizantes participaram no último sábado (5.11) de um protesto para alertar à população sobre a situação precária do “Rhino”.

– Existe um risco muito grande de que o prazo de desocupação seja cumprido e que tenhamos de abandonar a casa. Porém as autoridades e os proprietários do complexo não devem subestimar a frustração que estamos sentindo e também de muitas pessoas na cidade. Não somos um squat qualquer – conta um dos moradores Maurice Pier à swissinfo.

Crise no mercado imobiliário

Os sem-tetos de Genebra ocuparam pela primeira o complexo de prédios abandonados em 1988. Isso ocorreu num período em que a segunda maior cidade da Suíça vivia uma grande especulação no mercado imobiliário e falta crônica de habitações.

Desde então, o Rhino, cuja marca registrada é um rinoceronte, se esforça para se estabelecer como centro cultural alternativo, oferecendo gastronomia e também espaços para música experimental.

Porém a venda do complexo em 1998 a um novo proprietário trouxe medo e apreensão para os moradores. Com razão: o pedido de renovação dos prédios foi autorizado pela administração da cidade em 2004. A ordem de evacuação foi entregue aos moradores um ano depois. Ao mesmo tempo, todas as negociações entre as duas partes terminaram sem sucesso.

– Desde o início já queríamos pagar aluguéis. Mas o principal objetivo sempre foi manter o caráter comunitário do Rhino. Infelizmente não foi possível negociar com o proprietário. Agora queremos ficar nos prédios e deixá-los fora do mercado imobiliário, para que eles possam ser utilizados como moradias à preços moderados.

Briga programada

Jean Rossiaud, sociólogo da Universidade de Genebra, acredita que se nenhuma solução for encontrada nas próximas semanas, o final desse caso pode ser trágico.

Para ele, o Rhino continua sendo um símbolo forte na luta dos partidos de esquerda contra a especulação imobiliária, de prédios vazios e de aluguéis extremamente elevados que caracterizam Genebra desde os anos 80.

Em meados dos anos 90, Genebra era uma das cidades européias com o maior número de casas ocupadas: 140 casas e cerca de mil sem-tetos. A ocupação ocorreu com a conivência das autoridades, que também reconheciam o problema criado pelas centenas de propriedades vazias por especulação.

A explicação do fenômeno está no fato das autoridades cantonais terem fechados os olhos ao problema, devido à existência de cinco mil prédios e casas deixados propositalmente vazios pelos seus proprietários.

Porém a chegada de novos proprietários, com recursos suficientes para renovar essas centenas de propriedades, fez com que ordens de despejo fossem enviadas aos quatro cantos da cidade.

– Squats como o Rhino são vistos pela população de Genebra como algo mais importante do que simples casas ocupadas. Elas também são símbolos na luta contra a especulação imobiliária. Existe uma fama em torno do Rhino e eu acredito que se as autoridades autorizarem a expulsão dos seus moradores, eles irão se defender nas ruas. Tudo depende se a justiça e os partidos de direita irão querer ou não um conflito – analisa Rossiaud.

De uma coisa, o sociólogo está certo: seja o Rhino for desocupado ou “institucionalizado” pelo cantão, isso será o capítulo final da história do movimento de casas ocupadas em Genebra.

Linha final

O promotor público de Genebra, Daniel Zappelli, explica à swissinfo que existem apenas dois meios para evitar a execução da ordem de despejo: uma delas é se os moradores abandonarem suas casas livremente; a outra é se eles chegarem a um acordo com o proprietário dos prédios.

– Se não houver um acordo, não existe saída para o despejo. Nesse caso, se os moradores não partirem livremente, eles serão retirados à força pela polícia – reforça Zappelli.

O promotor lembra também que o abaixo-assinado pedindo a compra dos prédios pelo governo não irá interromper os moinhos da justiça. Caso os ocupantes ilegais abandonem o Rhino, o complexo deve ser transformado em centro habitacional com aluguéis reduzidos, para diminuir o déficit crônico de habitações em Genebra.

– Se for preciso escolher entre a ocupação ilegal e a criação de novos apartamentos, é óbvio que prefiro a segunda solução – conclui.

swissinfo, Adam Beaumont

De acordo com o sociólogo Jean Rossiaud, a primeira onde de ocupação de casas abandonadas ocorreu em Genebra por volta dos anos 80.

O “Rhino” faz parte da segunda leva de ocupação de casas e é visto como uma reação à crescente especulação imobiliária na segunda maior cidade da Suíça.

A terceira onda de ocupações ocorreu na metade dos anos 90, como resposta ao número crescente de prédios e casas vazios em Genebra: 4.877 em 1996.

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