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Citadinos viram agricultores de montanha

A pradaria alpina de Alp Ludera no cantão dos Grisões, 1.798 metros acima do nível do mar. swissinfo.ch

A paisagem é idílica, o dia inteiro. O trabalho é duro. Quem decide passar um verão fazendo queijo nas montanhas dos Alpes suíços precisa muita perseverança e idealismo.

É o caso das jovens Christiana e Carolyn, alemãs, e da austríaca Marlene. Elas trabalham juntas em Alp Ludera, no cantão dos Grisões (leste da Suíça).

São cinco horas da manhã. Quando o despertador toca, as três mulheres se levantam rapidamente da cama. Christiana busca as vacas no pasto e as leva para o estábulo. Cada um dos animais tem seu próprio lugar, um número e um nome.

Aos poucos o dia vai clareando, desvendando toda a beleza do mundo alpino. Marlene, 27 anos, tem a função de mestre-queijeira. Ela coloca fogo na madeira do forno e começa os primeiros preparativos para a produção. Antes das 60 vacas passarem pela máquina ordenhadeira, elas tomam o café da manhã. Vinte outros animais ainda estão no pasto, em “licença maternidade”. Em breve elas receberão seus bezerros e por isso não são ordenhadas.

Relação de trabalho intacta 

A pradaria alpina de Alp Ludera está localizada a 1.798 metros acima do nível do mar e pertence ao vilarejo de Fanas, no cantão dos Grisões (leste). O chalé é novo e tem máquina de lavar, chuveiro e todos os utensílios e equipamentos para a produção do leite alpino e manutenção dos animais. Oito agricultores da região deixam suas vacas sob os cuidados das três estrangeiras que trabalham no chalé.

Marlene, que estudou agronomia biológica em Viena e aprendeu a fazer queijo na Suíça, ressalta como é positivo o relacionamento das jovens com os agricultores locais. “Somos valorizadas e recebemos o apoio necessário. Eles são fazendeiros simpáticos e engajados”. Além disso, ao contrário de outras regiões, em Alp Ludera os voluntários são bem pagos para trabalhar nas pradarias alpinas: aproximadamente oito mil euros, para cada uma durante os quatro meses de verão.

“Elas fazem um bom trabalho. Quando nossa foice quebrou, em dois dias já tínhamos uma nova. Os fazendeiros nos oferecem a infraestrutura, o que naturalmente também é de interesse próprio: eles querem obviamente que suas vacas retornem em boa forma das montanhas e que seja produzido um bom queijo durante esses meses”, explica Carolyn.

Devido à crescente dificuldade de encontrar pessoal local para trabalhar nos tradicionais ofícios dos Alpes, os agricultores passam a contratar estrangeiros. As estatísticas constatam que eles já seriam um terço.

A engenheira agrícola Christiana, 32 anos, fica triste e pensativa quando turistas de passagem nas montanhas lhe perguntam o que está fazendo nas montanhas. “Eu conheço cada pedra e não me sinto estranha aqui, mas como se fosse a minha própria casa. Os turistas deveriam, sim, ficar felizes de estarmos fazendo esse trabalho com satisfação.”

Trabalho duro 

Os 750 litros de leite tirados nos últimos três dias servem para fazer 15  queijos de cinco quilos. Eles são guardados em um depósito, onde durante as próximas semanas deverão ser virados e tratados para adquirir o tradicional sabor. “No início do verão chegamos a ter 900 litros por dia”. Agora o pasto nas pradarias alpinas começa a se esgotar, o que se reflete na produção das vacas. Em agosto o trabalho começa a diminuir, o que permite às voluntárias de colher amoras ou outras ervas na montanha.

Nesse meio tempo, Christiana traz as vacas de volta do pasto, o que se nota pelo aumento do volume dos seus sinos. Ela distribui alguns tapinhas em algumas delas, enquanto Carolyn as motiva com um sonoro “ôooo, ôooo, ôooo”. O cão corre atrás latindo com alegria.

“Estamos aqui tão próximas da natureza e dos animais. Quando minha colega sai do estábulo e nos cumprimentamos, percebo então que ela é uma apaixonada como eu. Estamos juntas nessa missão. São esses poucos momentos de alegria nesse trabalho”, explica a Carolyn, 41 anos, formada em pedagogia social e originária de Munique, Alemanha.

O trabalho de produzir o queijo dos Alpes obriga a uma boa coordenação e solidariedade, pois o dia a dia é muito duro, sobretudo nas primeiras semanas, quando a labuta diária chega a 15 horas. “Tudo é novo, inclusive para nós e as vacas”, acrescenta Carolyn, que já passa sua segunda temporada de verão nos Alpes.

As três mulheres se conheceram em um encontro de camponeses alpinos na cidade de Witzenhausen, Alemanha. Lá elas decidiram que iriam trabalhar juntas na cooperativa de Ludera durante um verão. As três citadinas se entendem como uma espécie de “comunidade de destino”. Elas trabalham, vivem e comem juntas, dividindo tudo entre elas, sejam as boas ou as más experiências.

Choque cultural 

O trabalho nas alturas consome muito da energia das três mulheres. “Mais do que quatro meses não iríamos aguentar”, avalia Marlene. Apesar disso, ela reflete sobre o retorno próximo à Viena com uma mescla de sentimentos. Na realidade, ela está fascinada pelo seu cotidiano atual, onde tudo está nas mãos da equipe, sejam os pastos, as vacas, os cuidados com o leite e finalmente a manufatura desse queijo especial. 

“Quem dá o tom aqui é o sol e as vacas. Quando retornar à Viena, vou me perguntar se faz algum sentido estar em um lugar com tanta gente, barulho e esse excesso de impressões. Meus olhos e ouvidos ficam sobrecarregados. Já aqui na montanha domina o ritmo da natureza.”

Para Carolina, os Alpes formam uma paisagem “que atinge seu coração” e onde se sente bem. “Aqui estranhos pouco apitam na nossa vida. Quando recebemos essa missão, sabemos o que precisamos fazer. Mas como fazê-lo, é por nossa conta.”

Mesmo estando feliz com o retorno próximo à sua cidade, ela já sente falta das montanhas. “Nos Alpes eu me espalho. Já na cidade tenho de me encolher para não estar batendo nos cantos.” 

As pradarias alpinas de Alp Ludera estão na região de Prättigau, no cantão dos Grisões (leste da Suíça), a 1.798 metros acima do nível do mar.

A cooperativa agrícola que cuida das pequenas queijarias alpinas ocupa voluntários de junho ao final de setembro. Eles são responsáveis por 80 vacas de oito agricultores originários do vilarejo de Fanas (400 habitantes). 

Além das vacas, cada chalé de Alp Ludera também abriga 30 porcos e cabras, além de algumas galinhas e um cachorro de pastoreio.

Em cada temporada são produzidos mil queijos, cada um com cinco quilos, além de cem quilos de manteiga alpina.

Os novos chalés foram reequipados em 1994 com aparelhos modernos para a produção e tratamento de queijo.

Adaptação: Alexander Thoele

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