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Suíça e Brasil retomam negócios após a crise

O secretário de Estado, Jean-Daniel Gerber Keystone

Jean-Daniel Gerber é um homem atento ao que acontece no cenário econômico mundial. Responsável por conduzir recentes reformas em seu país, o secretário de Estado de Economia da Suíça iniciou pelo Brasil uma visita à América Latina na qual pretende qualificar relações com algumas economias emergentes.

Além disso, Gerber acompanha de perto a crise econômica na UE e as rusgas recentes com os Estados Unidos.

Acompanhado por uma comitiva formada por empresários suíços, Gerber teve no Brasil reuniões com o ministro do Planejamento, Nélson Machado, com a prefeita em exercício de São Paulo, Alda Marco Antonio, e com dirigentes da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Leia a seguir a entrevista exclusiva concedida pelo secretário de Estado à swissinfo.ch no dia 8 de julho:

swissinfo.ch: Quais são os principais objetivos de sua visita ao Brasil?

Jean-Daniel Gerber: Eu estou aqui para analisar juntamente com meus amigos brasileiros as relações econômicas entre a Suíça e o Brasil e melhorar ainda mais essas relações. Em 2009 nós passamos um ano difícil, por conta da conjuntura econômica. As exportações caíram, de uma parte e de outra.

Hoje, estamos muito contentes porque as exportações têm uma forte retomada. As exportações suíças para o Brasil nos últimos quatro meses aumentaram cerca de 19% e as exportações brasileiras para a Suíça aumentaram cerca de 11%. Isso demonstra que essas duas economias são dinâmicas.

swissinfo.ch: Qual o estado atual das relações econômicas entre a Suíça e o Brasil?

J-DG: Quando nós temos uma relação intensa com um país, existem também problemas, por suposto. A Suíça não tem problemas, por exemplo, com o Malauí, pois nós não mantemos relações econômicas.

Com o Brasil, nós temos, naturalmente, alguns problemas. Posso citar dois ou três. A Suíça não tem um acordo bilateral de tributação de impostos com o Brasil. Essa questão dos impostos é extremamente importante pelo fato de que nós temos numerosas indústrias que se implantaram aqui no Brasil.

Cerca de 33 bilhões em investimentos suíços já entraram no Brasil e há aqui mais de cem mil postos de trabalho criados pelas empresas suíças. Conseqüentemente, um acordo bilateral de tributação é absolutamente indispensável. A Suíça não pode ter uma tributação discriminatória em relação aos nossos principais concorrentes, que são os alemães, os franceses e os italianos. As negociações sobre esse tema com o governo brasileiro devem ser iniciadas no fim de agosto ou início de setembro, e nós esperamos concluir um acordo rapidamente.

Um segundo elemento é que a Suíça não tem um acordo de proteção de investimentos com o Brasil. Nós concluímos um acordo em 1990 que, no entanto, jamais entrou em vigor porque os brasileiros jamais aceitaram um acordo de proteção dos investimentos. Agora, as coisas começam a mudar, ainda mais depois que a Bolívia nacionalizou uma indústria importante do Brasil (risos). Acordos desse tipo são importantes e, quem sabe, dentro de algum tempo nós poderemos renegociar esse acordo de proteção dos investimentos.

Um terceiro elemento é que todos sabem que a Suíça não possui produtos de base, é um país pobre desse ponto de vista. Um dos predicados que nós temos é a matéria cinzenta, ou seja, a tecnologia, a pesquisa, o desenvolvimento. E, para que essa matéria cinzenta possa ser frutuosa, é preciso ter também uma certa proteção da propriedade intelectual, como a questão dos brevês, por exemplo.

O Brasil é um país que sempre se posicionou contra a proteção da propriedade intelectual. Agora, o Brasil se torna um país onde existe igualmente alta tecnologia, notadamente no domínio da aviação. Esse é um sujeito de discussão que nós igualmente travamos com as autoridades brasileiras.

swissinfo.ch: Até que não são muitos problemas…

J-DG: Eu posso falar mais (risos). A Suíça trabalha segundo as normas internacionais, particularmente no domínio do maquinário, dos instrumentos médicos. Instrumentos como aparelhos de radiografia, aparelhos que examinam o corpo, elementos utilizados em cirurgias, etc. Essas máquinas são normalmente construídas segundo normas estabelecidas internacionalmente, como, por exemplo, o selo ISO.

O Brasil, numa certa medida, não reconhece essas normas. Isso traz algumas dificuldades, pois é preciso construir as máquinas segundo a legislação brasileira ou obter uma autorização especial para importar essas máquinas ao Brasil. Isso é o que nós chamamos de um obstáculo técnico para o comércio.

Posso falar também da relojoaria suíça, onde existe um problema bastante espantoso em relação ao Brasil, que são as tarifas muito elevadas. Os brasileiros alegam que, para relógios muito caros, eles podem exigir impostos e barreiras alfandegárias também elevados, pois se trata de artigos de luxo.

O problema é que fazem com os relógios caros o mesmo tipo de imposição que é feita aos relógios que custam muito barato, relógios de um dólar ou dois dólares. Há uma importação muito grande de relógios muito baratos a taxas praticamente nulas. Agora, esta mesma taxa aplicada a um relógio muito caro é muito mais importante em termos relativos. Isso acarreta que numerosos brasileiros não compram relógios caros aqui no Brasil, mas o fazem no estrangeiro.

Conclusão: a receita brasileira não recolhe os impostos necessários, já que os relógios são comprados no estrangeiro. Seria interessante que o Brasil adotasse um outro procedimento para os relógios caros.

swissinfo.ch: O senhor acredita que Brasil e Suíça podem ser citados como dois países que sobreviveram à última grande crise econômica global?

J-DG: A taxa de crescimento prevista para a Suíça este ano gira em torno de 5% e a do Brasil em torno de 7,5%. Sob este ponto de vista, o Brasil está bem melhor que a Suíça. Mas, as bases de partida são diferentes, afinal o nível de vida na Suíça é consideravelmente mais elevado.

Nós não podemos nos comparar ao Brasil, nós nos comparamos a países como os nórdicos, que vão muito bem, a Holanda, a Bélgica, a França e a Alemanha. Quando consideramos esse gênero de países, aí sim, podemos dizer que a Suíça vai bastante bem. É verdade que, sob o ponto de vista conjuntural, a Suíça sofreu muito menos no ano passado do que diversos países.

Maurício Thuswohl, Rio de Janeiro, swissinfo.ch

Na segunda parte da entrevista, Gerber fala da crise na União Europeia e das rusgas recentes da Suíça com os Estados Unidos (clique sobre o mesmo assunto).

Jean-Daniel Gerber defende que a economia suíça se adapte às novas realidades exigidas pelo processo de aquecimento global. Ele afirma que alguns projetos já estão em curso: “Lamento muito que Copenhague não tenha sido um sucesso. Os acordos que nós concluímos no domínio do comércio, das finanças, etc, têm pouca influência sobre o clima. A Suíça tem um certo número de acordos com organizações como o Banco Mundial, o PNUD e o PNUMA, onde nós tentamos financiar projetos de adaptação às mudanças climáticas”.

Em relação ao Brasil, a idéia é reforçar as importações de biocombustíveis para a Suíça: “Com o Brasil, nós temos igualmente um certo número de projetos na Amazônia. É claro, também, que a Suíça deveria ser mais ofensiva para importar biocombustíveis. Infelizmente, nós temos uma legislação nesse domínio que praticamente torna impossível ao Brasil exportar seus biocombustíveis para a Suíça”, lamenta Gerber

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