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Pequenos poupadores suíços perdem milhões com crise

Os indíces na bolsa caem, assim como a conta de muitos investidores. Keystone

A crise mundial nos mercados financeiros também atinge pequenos e médios poupadores na Suíça.

Muitos deles perderam todas ou grande parte das economias ao investir em papéis do falido banco americano de investimentos Lehman Brothers, vendidos pelos seus próprios bancos como produtos “à prova” de crise.

A rejeição do pacote econômico de US$ 700 bilhões de ajuda ao sistema financeiro pela Câmara americana provocou um choque mundial. As bolsas caíram em todo o mundo – o índice Dow Jones registrou a maior queda em pontos de todos os tempos – e muitos cidadãos começam a temer que os perdedores da maior crise da história recente não serão apenas os banqueiros de “Wall Street”.

Na verdade “Main Street”, expressão em inglês utilizada nos jornais anglo-saxônicos para designar o americano comum – dono de uma casa hipotecada, endividado nos cartões de crédito e com um fundo de pensão baseado em ações – já teme pelo seu próprio futuro. E com ele, o mundo inteiro.

O pânico que tomou conta dos mercados é cada vez mais difícil de ser compreendido pelas pessoas normais. Por que alguns bancos estão falindo e qual as conseqüências para mim? Por que não apenas os Estados Unidos, mas também outros governos precisam executar planos de salvamento que irão custar bilhões aos cofres públicos? Até especialistas se contradizem na apresentação de soluções.

Perdas na Suíça

Na Suíça a crise também se faz sentir. Porém engana-se quem acha que apenas os operadores e analistas dos bancos helvéticos estão chorando o ano que irá terminar sem a tradicional bonificação. Na realidade, a primeira grande vítima é o poupador suíço.

Alguns analistas acreditam que as perdas de pequenos e médios investidores suíços devido à falência do Lehman Brothers pode chegar a 650 milhões de francos. Desde que o quarto maior banco de investimentos norte-americano fechou as suas portas em 10 de setembro, inúmeros casos de pessoas prejudicadas têm sido noticiados pela imprensa helvética. O seu desespero ecoa em histórias dramáticas.

A cabeleireira Pilar e seu marido, garçom em um restaurante, tinham 70 mil francos na sua conta. Desta soma, investiram e perderam 50 mil francos como conta o jornal “24 Heures”. O leitor A.V enviou um e-mail ao “Basler Zeitung” para reclamar que seu investimento de 25 mil francos havia sido pulverizado do dia para a noite. O “La Liberté” conta a história de Eliane, uma aposentada de 60 anos em Friburgo que perdeu 165 mil francos sem nunca ter se interessado pela bolsa de valores. Outro caso é o de Sava Hagmann, moradora de Rapperswill, vilarejo ao sul de Zurique. Segundo o “Sonntagsblick”, a enfermeira de 63 anos havia economizado toda a vida até chegar a ter na sua conta bancária uma fortuna de 260 mil francos. Poucos dias depois da falência do Lehman Brothers, ela conferiu a sua conta e percebeu que só sobravam oito mil francos.

Investimentos garantidos?

Como trabalhadores, aposentados e donas de casas entraram no cassino do mercado financeiro internacional? A resposta está nos seus próprios bancos suíços, que nos últimos anos resolveram copiar a estratégia lucrativa e arriscada dos grandes bancos americanos de investimentos de aplicar dinheiro dos clientes em produtos sofisticados, saídos em grande parte dos créditos hipotecários de risco nos Estados Unidos, os chamados “subprimes”.

No caso de Sava Hagmann, ela havia sido convencida pelo aconselhador financeiro do seu banco, o Credit Suisse, a aplicar 254 mil dos seus 260 mil francos em produtos estruturados emitidos pelo Lehman Brothers. “Ele havia dito à minha mãe que era impossível perder dinheiro no negócio. No pior dos casos, ela só não teria juros sobre a soma”, conta a filha de Hagmann ao jornal, acrescentando também que sua mãe nem precisou assinar o documento.

Com a falência da instituição americana, o dinheiro de Hagmann e de outros poupadores suíços desapareceu. Bancos como o Credit Suisse argumentaram inicialmente que seus clientes estavam cientes dos riscos e que eles, como intermediadores dos títulos, não podiam assumir as perdas. Já organizações suíças de defesa do direito dos consumidores como a “Fédération romande des consomateurs” (FRC) alegam que as entidades que venderam os produtos omitiram informações relevantes, e que só depois de ter sido formalizado o investimento é que disponibilizaram contratos em que figurava a Lehman Brothers como emissor.

Fortunas volatizadas

Segundo um analista entrevistado pelo jornal “Sonntag” no último domingo (28.09), o Lehman Brothers tinha algo entre 2 e 3 bilhões de francos em circulação nos bancos helvéticos. Destes, apenas entre 100 e 150 milhões de francos estavam cotados na bolsa de valores.

Com o protesto crescente de clientes lesados, a Comissão Federal de Bancos da Suíça (EBK, na sigla em alemão) resolveu se pronunciar. “Estamos analisando seriamente esta temática e já enviamos a diversos bancos pedidos de esclarecimentos. Depois de analisarmos as respostas, iremos decidir os próximos passos”, declarou o porta-voz da instituição, Alain Bichsel.

Muitos dos pequenos poupadores também apelam para o Ombusdman dos Bancos Suíços, instituição criada pelas próprias instituições financeiras do país. O número de reclamações tem sido tanto, que seu diretor Hanspeter Häni foi obrigado a colocar no site instruções especiais voltadas para aqueles que perderam integralmente ou parte da poupança através dos produtos emitidos pelo Lehman Brothers.

Nas instruções, Häni recomenda, em primeiro lugar, que os clientes entrem em contato com seus bancos e tentem fazer um acordo. Em caso de recusa, eles podem acionar mais uma vez o ombudsman para intermediar a questão. Já a FRC recomenda a participação em “plataformas” de interesse, nas quais os custos de advogados e dos processos podem ser compartilhados entre os lesados. Na falta de instrumentos legais na Suíça como as ações coletivas dos EUA, a organização acredita que esta é a melhor forma de recuperar o dinheiro perdido.

Bancos reagem

Frente aos protestos, o Credit Suisse, banco que aparece massivamente na comercialização dos títulos do Lehman Brothers, resolveu fazer concessões, sobretudo depois da imprensa ter revelado que o início da ofensiva de venda dos papéis nas filiais do banco coincidiu com a chegada do executivo Robert Shafir, responsável pelo setor de “asset management” no CS. Antes ele havia trabalhado dezessete anos no Lehman Brothers depois de ter sido membro do comitê executivo e responsável pela área de títulos.

O Credit Suisse propôs recomprar uma parte dos produtos estruturados da Lehman Brothers adquiridos pelos seus clientes, porém com condições: apenas aqueles que dispunham de uma fortuna inferior a 500 mil francos até o final de agosto e que tinham investido pelo menos 50% da sua poupança nos títulos emitidos pelo banco. “As condições precisam ainda ser definidas”, declarou Robert Martin, responsável no banco pela clientela privada para a região da Suíça francesa em entrevista ao jornal “Le Temps”. Com a ação, o banco se recusa, porém, a assumir qualquer culpa no problema. “Com produtos estruturados, o risco de insolvência do emissor é assumido pelo investidor”.

Já instituições regionais têm uma política diferente. O Banco Cantonal de Lucerna também vendeu produtos estruturados do banco americano e decidiu cobrir as perdas dos clientes em até 100 mil francos, ressaltando que não é obrigado do ponto de vista legal fazê-lo. “Percebemos que nossos clientes estavam impacientes e, em parte, insatisfeitos com a reação do banco. Então chegamos à conclusão que era preciso agir de forma não burocrática para resolver o problema”, ressaltou o presidente Bernard Kobler no comunicado à imprensa.

Clientes que investiram mais de 100 mil francos também poderão ser indenizados caso mais de 20% da sua poupança tenha sido investida nos produtos. “Cada caso será analisado de forma individual”, lembra Kobler.

swissinfo, Alexander Thoele

Associações de consumidores como a “Fédération romande des consomateurs” (FRC) sugerem três passos para os clientes lesados de bancos suíços:

– entrar em contato com o banco e pedir um acordo.
– se o banco recusar, entrar em contato com o Ombudsman dos bancos.
– se este for incapaz de ajudar, os clientes devem se unir para dividir custos de advogados em processos contra as instituições bancárias.

Na Suíça não existe a instituição das ações coletivas como nos EUA.

O banco, cuja sede está em Zurique, foi fundado em 1856.

Ele atua na área de gestão geral, investimentos e gestão de fortunas.

Seu lucro líquido em 2007 foi de 7,76 bilhões de francos, 31,49% abaixo do ano retrasado.

As ações do CS são comercializadas na Bolsa de Valores da Suíça e na Bolsa de Nova Iorque. Tem 49 mil funcionários.

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