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África: nova fronteira da globalização

Ex-embaixador Imboden vê com bons olhos o interesse do G-8 na África. Keystone

Para Nicolas Imboden, antigo negociador suíço na OMC, a atenção dada pelos líderes dos países do G-8 à África pode ser levada a sério. O continente é o último mercado virgem do planeta.

Em entrevista à swissinfo, o ex-embaixador fala sobre ajuda ao desenvolvimento, desafios para a África e atuação suíça no continente.

Na sexta-feira, durante o último dia do encontro de Gleneagles, Escócia, os dirigentes do G-8 (Reino Unido, França, Estados Unidos, Japão, Alemanha, Itália, Canadá e Rússia) têm uma reunião com os presidentes da África do Sul, Nigéria, Etiópia, Tanzânia, Gana, Senegal e da Argélia.

O tema principal da discussão será a anulação das dívidas externas dos países africanos e a duplicação da ajuda ao continente negro.

Nicolas Imboden considera muito positivo o interesse atual pela África, uma região que ele conheceu bem como diplomata e, atualmente, como diretor-executivo da “Ideas Centre”. Essa organização não-governamental sediada em Genebra, aconselha governos africanos para que seus países tenham mais sucesso dentro das atuais negociações na OMC.

O que os países africanos podem esperar do encontro do G-8?

Muitos dizem que as promessas feitas atualmente não terão conseqüência prática. Mas a vontade do primeiro-ministro britânico Tony Blair, de inscrever na agenda do encontro o problema da pobreza na África, já é algo de muito importante.

Além disso, o cancelamento da dívida de 18 países – a maior parte deles africanos – já foi decidido pelos ministros de Finanças do G-8. A aplicação dessa medida é algo que será posto em prática.

Por outro lado, a duplicação da ajuda ao desenvolvimento ainda não tem uma apoio unânime. Isso graças aos déficits orçamentários vividos por muitos países doadores. Alguns deles também se perguntam se essa forma de cooperação foi realmente eficaz no passado.

Como você explica o interesse atual pela África? Trata-se de uma conscientização da miséria existente ou apenas de considerações geo-estratégicas ligadas ao petróleo? Afinal, África não seria o último mercado virgem do planeta?

Existe um reconhecimento geral de que a África está indo numa direção negativa. Ao mesmo tempo, no processo da globalização também não é possível tolerar que um continente não se desenvolva. Como já dizia John Kennedy, uma sociedade livre que é incapaz de se ocupar dos seus pobres, não poderá também salvar os mais ricos.

A África é efetivamente o último mercado virgem do planeta. Ela é dotada de recursos consideráveis como o petróleo, um dos mais importantes deles.

Além disso, a África está nas portas da Europa. Se as catástrofes continuam a se suceder eternamente, isso terá conseqüências graves sobre a migração.

Para tirar o continente dessa situação, o que seria mais importante: dobrar a ajuda ao desenvolvimento ou favorizar o comércio e respeitar os princípios da livre-troca para os produtos africanos?

Essas duas abordagens são importantes.

Para que um país possa sobreviver na economia globalizada, é necessário que ele tenha acesso aos mercados mundiais. Os africanos reclamam uma revisão dos acordos negociados na OMC, para que estes sejam mais favoráveis aos seus interesses.

Porém isso não é suficiente. Se os países em questão não têm capacidade suficiente de produção ou infra-estruturas adequadas, então eles precisam de ajuda.

A curto prazo, a cooperação dos países do norte é necessária. A África não tem, efetivamente, meios próprios para desenvolver seus recursos.

A ajuda sem comércio só pode levar ao fracasso. Para que serve ajudar países africanos a produzir algodão, se eles continuam sofrendo a concorrência do algodão subvencionado nos países ricos?

Falamos sempre de um continente devastado pela guerra, pobreza e doenças. Porém não existiria uma África que não seja perdedora?

Não podemos nos enganar. Os problemas vividos pela grande parte dos países africanos são gigantescos. Porém já existem alguns sinais que trazem a esperança.

No ano passado, os países africanos tiveram um crescimento médio de 5%, o que corresponde as maiores taxas dos últimos dez anos. Além disso, dois terços dos governos africanos foram eleitos democraticamente, o que constitui um progresso em relação ao passado.

Várias guerras prementes foram também solucionadas, como em Angola, Moçambique, Sierra Leone e na Libéria. Mas é verdade que outros conflitos acabaram de explodir, como na Costa do Marfim. Porém o seu impacto não é tão devastador. No ano passado esse país chegou a ter um crescimento de 5%.

Resumindo, vários países tiveram taxas de crescimento comparáveis a de muitos outros emergentes na Ásia. Dou um exemplo: Moçambique, que teve nos últimos anos um crescimento médio de 10%.

Após um longo período de marasmo, a Nigéria está lutando contra a corrupção e reorganizando sua economia. Não podemos também esquecer a África do Sul, que está assumindo um papel crescente de estabilidade para toda a região.

Com sua ajuda não ligada (à compra de produtos helvéticos) e suas parcerias na sociedade civil, a cooperação suíça teria um papel positivo na África?

A Suíça goza efetivamente de algumas vantagens na África. Ela não foi um país colonizador, o que reforça sua credibilidade no continente negro. Ela também não é uma grande potência, cujo objetivo é forçar seu ponto de vista aos governos com quais ela colabora. Nesse sentido, a Suíça conseguiu estabelecer uma parceria autêntica com os países africanos.

Ao mesmo tempo, como país meio avarento, ela não pode se lançar em grandes projetos de cooperação que se mostram, muitas vezes, desproporcionais à realidade africana. Alguns dirigentes africanos chegaram a me dizer que, mesmo se a Suíça não realiza muitos projetos de cooperação, os que são feitos, são bem-sucedidos.

swissinfo, Frédéric Burnand
traduzido por Alexander Thoele

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