“Não” francês deixa Suíça perplexa
Para a imprensa suíça, recusa do eleitor à Constituição Européia demonstra sua insatisfação com uma Europa que provoca mais incertezas do que otimismo.
Os editoriais mostram que o resultado do plebiscito popular coloca a União Européia numa das suas maiores crises.
“Lição para os donos do poder”, “Medo e resistência”, “Golpe contra o poder”, “Fim da grande nação”, “A segunda Revolução Francesa” – essas foram as manchetes dos jornais helvéticos depois da ressaca do “não” francês à Constituição Européia.
“Se a Revolução Francesa de 1789 iluminou o mundo, o resultado do fim de semana o escurece”, comenta o jornal de Genebra Le Temps. Na opinião do seu editorialista, nenhum dos problemas combatidos pelos opositores do novo tratado termina com o plebiscito como o desemprego, a globalização ou o presidente francês Jacques Chirac.
O medo dos turcos
O inimigo dos franceses não está em Bruxelas, mas o projeto europeu acaba de pagar caro pelas décadas de desleixo da classe política francesa.
“O voto desse grande país europeu não está a altura do seu peso”, critica o Berner Zeitung. A publicação da capital suíça vê no resultado a posição claramente contrária da maioria dos eleitores ao neoliberalismo, globalização, expansão da União Européia e à possível adesão da Turquia.
“Os franceses batem a porta”, titula o jornal Der Bund. “O voto negativo é um dos golpes mais duros na história da União Européia. Se um dos países fundadores se afasta do processo de união, a situação fica mais difícil para todos”.
Rebelião dos gauleses
“Os franceses abriram as portas para outros resultados negativos nos próximos plebiscitos”, analisa o Der Bund, que também prevê a recusa próxima dos holandeses à nova Constituição Européia. A União Européia não irá se esfacelar, mas o novo tratado já estaria condenado. “Isso significa que a UE continuará sendo um órgão sem muito poder de decisão e sem dinâmica”.
O Neue Zürcher Zeitung (NZZ) analisa o “não” como “uma rebelião dos gauleses” e um “voto contrário ao presidente Chirac e ao seu governo”.
Outra explicação para o resultado é a insegurança geral da população. “As pessoas têm medo da globalização, da dominação americana, medo do islamismo e da Turquia na União Européia”.
Arrogância
O NZZ, o maior jornal suíço, também não vê muitas razões para o eleitor francês ter escolhido o “sim”. “O que foi apresentado com o nome de Constituição Européia era muito pouca atraente para a população”. Suas 300 páginas, escritas num estilo complicado e cheias de termos jurídicos, não era “ideal para criar uma identidade européia”.
Porém o “não” à Constituição não pode ser visto como a recusa geral. “A França não está interessada em abandonar a União Européia”.
O Basler Zeitung critica o governo francês que “foi arrogante ao forçar o eleitor a tomar uma decisão a seu favor”.
Gol contra
Para muitos editorialistas, os franceses contrários à Constituição Européia poderão se decepcionar ao descobrir que seu voto não tem efeitos contra a burocracia e os efeitos maléficos da globalização.
“Apenas uma União Européia fortalecida é capaz de se contrapor ao capitalismo sem fronteiras e a liderança dos EUA”, conclui o Der Bund.
Lembrando uma das qualidades da política na Suíça, o jornal indica que “o ponto positivo do plebiscito francês é mostrar que o eleitor toma decisões que não podem ser manipuladas”.
swissinfo com agências
54,87% dos franceses rejeitaram no domingo a Constituição Européia, enquanto 45,13% disseram “sim”. A taxa de abstenção ficou em 30,26 %.
Nas grandes cidades os eleitores votaram em grande parte “sim”, com exceção de Marselha. Em Paris, 66% dos eleitores aprovaram a Constituição Européia.
Nove países da União Européia já aceitaram o novo tratado constitucional. Para que possa entrar em vigor, a Constituição Européia deve ser ratificada antes de outubro de 2006 por 25 países da UE.
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