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“Novas formas de protecionismo estão aparecendo”

O fracasso em Genebra aumenta os riscos de recessão, prevê Luzius Wasescha.

O chefe dos negociadores suíços na Organização Mundial do Comércio ressalta as dificuldades de uma retomada das negociações da Rodada de Doha, também ressaltando o perigo do protecionismo, caso os países aceitem o fracasso do encontro de Genebra como fato consumado. Entrevista com o embaixador Luzius Wasescha.

Após o fracasso da reunião ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC) em Genebra, no final de julho, vários ministros manifestam o desejo de que o diálogo seja retomado o mais rápido possível.

Esse ponto de vista é reforçado pelo diretor da OMC. Pascal Lamy acredita que não se deve dar um passo atrás e que seria necessário “conservar as conquistas obtidas durante as semanas de negociações sobre a liberalização e harmonização do comércio mundial”.

O embaixador Luzius Wasescha, que chefiou a delegação suíça junto com a ministra da Economia, Doris Leuthard, fala sobre as dificuldades de uma possível retomada das negociações.

swissinfo: É realista esperar uma retomada das negociações dentro do Ciclo de Doha?

Luzius Wasescha: Alguns países deram a impressão que tudo acabou definitivamente, enquanto outros gostariam de retomar as negociações o mais rápido possível. A questão ainda está aberta.

Primeiro, é necessário ver o que é realizável no plano interno de cada país. Depois deve-se examinar o que pode ser feito no plano técnico, quais os contatos a favorecer para ter uma chance de relançar as negociações. Essa é, sem dúvida, a agenda para este ano.

swissinfo: Porém quanto mais o tempo passa, mais a retomada das discussões se torna difícil e as exigências de uns e de outros aumentam, não?

L.W: Isso é evidente.

swissinfo: Para sair do impasse, os Estados Unidos propuseram a idéia de acordos limitados, enquanto as regras da OMC impõem um consenso sobre todos os tópicos para a conclusão de um acordo. Essa seria uma boa idéia?

L.W: Essa é uma das opções que devem ser discutidas em setembro. Nós estamos abertos à discussão, mesmo que essa proposição nos pareça extremamente problemática, já que tal abordagem tem o risco de não obter o aval dos países em desenvolvimento, cujo maior temor continua sendo o de serem excluídos.

swissinfo: A reunião em Genebra não mostrou que os países e os diferentes grupos estão mais divididos do que nunca?

L.W: De fato. Por exemplo, no interior da União Européia, alguns países têm a impressão que eles deram tudo e não obtiveram nada, enquanto outros pensam que era importante entrar a fundo nas negociações finais do Ciclo de Doha e, nesse sentido, fazer concessões em Genebra.

swissinfo: Para explicar o fracasso da reunião ministerial de Genebra, muitos analistas evocaram a crise atual da economia, o medo de uma concorrência crescente dos países emergentes ou a crise alimentar. Isso é pertinente?

L.W: Esse é um aspecto da explicação. Porém o elemento essencial estava na falta de flexibilidade, tanto da representante comercial dos Estados Unidos, Susan Schwab, como do ministro do Comércio da Índia, Kamal Nath. Além disso, um grande número de países não dispõe internamente de uma maioria sólida (opinião pública, parlamentos, etc) favorável às negociações. Os Estados Unidos, a Índia, o Japão e a União Européia são confrontados com esse tipo de problema.

swissinfo: A cada fracasso das negociações na OMC, o fantasma do protecionismo é evocado. Esse seria um medo legítimo?

L.W: Nós chegamos mesmo a ter novas formas de protecionismo. E isso nos países em desenvolvimento. Ao tentar se proteger contra a concorrência chinesa, esses países batem por ricochete nos interesses europeus e americanos. Essas restrições à importação têm, de fato, um campo de aplicação geral e não bilateral. Por isso, existe um temor de que esse tipo de medida se torne cada vez mais comum no futuro.

O fracasso foi realmente um sinal muito negativo e mostra a incapacidade de compreensão mútua sobre questões relativamente modestas. Isso pode encorajar os meios protecionistas a serem muito mais ofensivos na defesa dos seus interesses.

swissinfo: O comércio mundial continua então a ser regulamentado pelas regras fixadas durante a Rodada do Uruguai. Isso não traz problemas cada vez maiores?

L.W: Uma série dessas medidas pode se tornar obsoleta. Mas o que é mais perigoso é que os atuais projetos de solução para o Ciclo de Doha correm o risco de desabar, pois eles se baseiam sobre períodos de referência cada vez mais distantes da realidade econômica do momento.

swissinfo: E para a Suíça, qual o impacto que teria o fracasso das negociações?

L.W: Na Suíça temos uma situação ainda favorável, pois nós exportamos essencialmente especialidades. Porém, se nossos principais clientes começam a tossir, a economia suíça pode pegar um resfriado. O fracasso em Genebra reforça os riscos de uma recessão.

swissinfo: Os agricultores suíços estão salvos de novas reformas?

L.W: O processo de reforma interna vai continuar. É indispensável. Quanto mais nós avançamos, mais a conta agrícola (no contexto de acordos futuros) aumenta.

swissinfo: No passado, a Suíça oferecia seus serviços para facilitar as negociações. Ela o fará mais uma vez?

L.W: Nós faremos esse exercício ao nosso nível, o de representantes permanentes na Organização Mundial do Comércio. Além disso, a ministra Doris Leuthard já sinalizou sua disposição para organizar uma reunião ministerial durante o Fórum Mundial de Davos em 2009, como a Suíça já o fez nos anos anteriores.

swissinfo, Frédéric Burnand

A Rodada de Doha das negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) visa a diminuir as barreiras comerciais em todo o mundo, com foco no livre comércio para os países em desenvolvimento. As conversações centram-se na separação entre os países ricos, desenvolvidos, e os maiores países em desenvolvimento (representados pelo G20). Os subsídios agrícolas são o principal tema de controvérsia nas negociações.

A rodada de Doha começou em 2001 em Doha (Catar), e negociações subseqüentes tiveram lugar em Cancún (México), Genebra (Suíça), Paris (França), Hong Kong (China) e Potsdam (Alemanha).

Quase sete anos depois, os países envolvidos nas discussões ainda não conseguiram chegar a um acordo. As negociações foram paralisadas em julho de 2006. O prazo inicial para finalização das negociações era janeiro de 2005.

Até agora, as discussões têm girado principalmente em torno do tamanho dos cortes nos subsídios à agricultura por parte dos países desenvolvidos e do grau de liberalização do setor de serviços.

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