Reencontro polêmico da Suíça com o passado
A controvérsia está armada na Suíça com a publicação, nesta sexta-feira, de um estudo realizado por uma comissão internacional de historiadores sobre a atitude do país em relação aos refugiados no período nazista.
Esse estudo – chamado de “Relatório da Comissão Bergier”, do nome do historiador que chefia a investigação – é aguardado com ansiedade e provoca polêmica mesmo antes de ser publicado, até porque certas conclusões vazaram à imprensa. Tudo indicava que o “Relatório Bergier” sobre o tema seria muito crítico em relação às decisões do Governo suíço da época. Um primeiro estudo da Comissão, de maio de 1998, sobre as transações em ouro efetuadas pela Suíça no período nazista (1933-1945) tinha sido sem condescendência, constatando que 79 por cento das transações efetuadas no exterior pelo banco central nazista – Reichsbank – passaram pela Suíça. E realçou que 87 por cento dessas transações foram efetuadas com o banco central suíço. Isso corroborou denúncias de que a Suíça, pela sua criticável atitude, “colaborou com o esforço de guerra nazista e prolongou a guerra”. A tônica do atual estudo sobre a posição adotada pela Suíça em relação aos refugiados judeus não deve ser mais amena. O jornal “Le Temps”, de Genebra adianta que o estudo conclui ter havido “imperdoáveis erros, omissões e compromissos” que mancharam a política suíça naquele período.
Uma das iniciativas mais denunciadas tem sido a de exigir nos passaportes do judeus da Alemanha que houvesse um carimbo com a letra J (foto) indicando a origem hebraica do dono e portanto facilitando a captura deles pelos nazistas. Quanto ao esse “escorregão”, o Governo suíço já se desculpou oficialmente em 1995, mas deve voltar a carga nesta sexta-feira. O Governo ja debateu, em aparente atmosfera de tensão, a reação a ser adotada imediamente após a publicação do estudo. A posição governamental será apresentada pela presidente Ruth Dreifuss. Mas essa tomada de posição ocorre em momento inoportuno, a 5 dias da reeleição dos 7 membros do Governo pelo Parlamento. A direita dura – representada pelo Partido Popular Suíço (SVP), vencedora das eleições parlamentares de outubro – não quer saber de desculpas pelo Governo. E estaria a fim de recuperar as conclusões do “Relatório Bergier” para atacar a presidente suíça que aliás é de origem judaica. Note-se que desde as eleições, o SVP manifesta intenção de reforçar sua posição na coligação governamental, elegendo um segundo membro para o executivo suíço. O SVP estima simplesmente que a Suíça não precisa desculpar-se pela sua atitude antes e durante a Segunda Geurra Mundial, negando qualquer responsabilidade naquele período…
Resta que a Comissão Bergier deve permitir que a Suíça entenda melhor, aceite e enterre seu passado. A comissão é chefiada pelo historiador suíço Jean-François Bergier. Quatro membros vêm dos Estados Unidos, Grã-Bretanha, Israel e Polônia. Quatro são suíços. Ela foi apoiada por uma equipe de 30 pesquisadores que vasculharam bancos, seguradoras, intermediários como advogados e notários, e teve acesso mesmo a documentos submetidos a sigilo bancário.
O mandato da Comissão envolve investigação sobre transações em ouro com os nazistas, artigos roubados, política sobre refugiados, e a questão das contas inativas de judeus. Dessa última questão também a chamada “Comissão Volcker” se ocupou há poucos dias.
Um relatório final da “Comissão Bergier” é esperado dentro de 2 anos.
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