Suíça aguarda com cautela mudanças na Bolívia
A vitória do candidato indígena Evo Morales Aima nas eleições de domingo passado na Bolívia cria expectativas e interrogações dentro e fora do país.
A Bolívia é um dos países de concentração da Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação (COSUDE) e essa condição será mantida, disse a swissinfo a coordenadora da agência na Bolívia, Ruth Huber.
Muitos analistas qualificam de histórico o triunfo do chefe do partido Movimento para o Socialismo (MAS) porque se trata do primeiro presidente de cultura aimara que chega ao poder através das urnas.
Dos quase nove milhões de habitantes, 65% são indígenas quíchuas, aimaras e guaranis. Com esse respaldo e com o de outros segmentos de população urbana na Bolívia, deixa de ser inconcebível que Evo Morales assuma em janeiro a presidência do país catalogado como o mais pobre da América do Sul.
Em entrevista a swissinfo, a coordenadora residente da Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação (COSUDE ou DDC) concorda que se trata de um fato histórico sem precedentes nesta nação do Altiplano marcada por 70% de pobreza na área urbana e 95% na zona rural.
Pela primeira vez em 185 de regime republicano, a Bolívia terá, portanto, seu primeiro presidente indígena.
swissinfo: Qual é sua opinião a respeito da eleição de Evo Morales?
Ruth Huber: Vemos esse resultado como uma decisão histórica que significa uma mudança importante para o país. É difícil para nós, como estrangeiros, interpretar esas decisões políticas mas parece que grande parte da população queria uma mudança.
Vemos essa mudança como busca de uma maior eqüidade no país porque a grande maioria da população, que é de origem indígena, estará melhor representada. Considero que é um sinal em busca de maior igualdade.
swissinfo: A sra. acha que a cooperação internacional, especialmente suíça, vai mudar de política?
R.H: A cooperação suíça vai continuar. Já existe uma tradição de cooperação e esperamos um bom entendimento com o novo governo. Teremos nossos primeiros contatos no final de janeiro para saber quais serão as políticas do novo governo.
Certamente haverá aval para que se continue com as políticas estratégicas elaboradas com apoio da cooperação suíça, em acordo com as novas autoridades.
swissinfo: Com o novo governo pode haver mudanças de comportamento?
R.H: Há novas expectativas sempre que há novo governo, ainda mais quando o presidente é de origem indígena. Poderá haver políticas orientadas para os desfavorecidos, para a população indígena que é a mais pobre.
Acho que aí poderiam se agrupar várias cooperações, apoiando a implementação dessas novas políticas para lutar contra a pobreza.
swissinfo: O que acha da liberalização da folha de coca anunciada pelo futuro presidente ?
R.H: É um assunto muito delicado. Toda a cooperação internacional aguarda com muito interesse quais serão as novas medidas que o novo governo tomará a respeito do cultivo da folha de coca.
Creio que haja possibilidades legais de transforma a folha de coca em diferentes produtos medicinais, cosméticos e alimentícios. Aí haveria possibilidade de apoiar iniciativas do governo.
No entanto, a comunidade internacional estará observando se haverá realmente combate ao narcotráfico e se haverá limites na produção de folhas de coca. Os sinais do governo nesse setor serão importantes.
swissinfo:. Uma coisa é a cocaína e outra é produção legal de coca…
R.H: Tem de haver distinção entre as duas coisas. A produção da folha de coca não deve ser um problema; depende do uso que se faz. Todos sabemos que há um hábito tradicional de mascar as folhas e pode existir um potencial de industrialização como assinala o novo governo. Isso deverá ser analisado.
swissinfo:.Existe um risco em Evo Morales?
R.H: Não vemos seu governo como de risco. Poderá haver risco dependendo das políticas que adotará no futuro; serão observadas suas decisões em relação à coca, à propriedade privada e às empresas internacionais.
Esses são os setores que a comunidade internacional vai observar com mais atenção. Dependerá das políticas que implementar e esperamos que seja uma oportunidade para o desenvolvimento do país.
Entrevista swissinfo, Félix Espinoza, La Paz.
Evo Morales, aimara, obteve 54% do votos na eleições de 18 de dezembro.
Seu partido, o Movimento para o Socialismo (MAS) governará com maioria absoluta no Parlamento de 130 deputados e 27 senadores.
Defende uma política de esquerda em um país com 70% de pobreza nas cidades e 95% na zona rural.
Evo Morales Aima, 46 anos, nasceu em Isllave, Oruro. Foi pastor de lhamas, dirigente cocalero em El Chapare e deputado. Eleito para um mandato de 4 anos, ele será o primeiro presidente indígena na Bolívia.
COSUDE aplica 20 milhões de francos por ano em projetos de desenvolvimento na Bolívia.
– A Bolívia está entre os 19 países mais pobres em que o FMI acaba de anular a dívida.
– O país andino tem 1.098.581 km2, quase 9 milhões de habitantes, 65% indígenas.
– Mais de 2,6 milhões de eleitores votaram em Evo Morales para presidente. Seu partido, o MAS, (com 93% dos votos apurados), obteve 54% dos votos. O candidato conservador Jorge “Tuto” Quiroga obteve 28,6% dos votos.
– Nacionalizar as jazidas de gás; reduzir a pobreza, estabilizar o país, legalizar o plantio das folhas de coca e lutar contra o narcotráfico, erradicar a corrupção são alguns de seus difíceis objetivos.
– Por enquanto, Morales começou a adotar um tom mais conciliador. A Bolivia é um dos grandes receptores de ajuda internacional.
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