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Hans-Rudolf Merz, um presidente “entre duas frentes”

"Talvez, agora eu esteja até mais em forma, porque o coração funciona bem": Merz durante a entrevista à swissinfo. swissinfo.ch

"Política não é brincadeira", o governo precisa agir com "firmeza, mas de forma civilizada", diz o novo presidente suíço, Hans-Rudolf Merz, em entrevita à swissinfo.

No conflito fiscal com a União Européia, ele se vê entre duas frentes de batalha, mas acredita que a Suíça esteja no caminho certo.

swissinfo: A política interna suíça em 2008 foi marcada pelo tratamento duro dado aos adversários. A cultura política vai melhorar?

Hans-Rudolf Merz: Tivemos uma fase em que o tratamento mútuo realmente não foi muito sensível, o que é uma pena. Por outro lado, é preciso haver certa compreensão, porque política naturalmente não é uma escola de domingo (uma brincadeira).

Política é a discussão de idéias que podem ser contraditórias. É necessário, no processo democrático, realizar esses debates, mas num tom decente. Desejo para o ano de minha presidência que sejamos duros em relação aos interlocutores externos, mas que atuemos de forma civilizada.

Crise bancária, debacle do UBS – o que deu errado?

Os grandes bancos suíços não foram os únicos atingidos pela crise hipotecária – eles estiveram “em boa companhia”. Isso significa que outros países, com seus órgãos de fiscalização, também não perceberam ou notaram tarde demais esses fenômenos.

A globalização e especialmente a internet permitem que sejam feitas, em questão de segundos, grandes transações financeiras de um mercado de capitais para outro, de uma moeda para outra, sem que os órgãos de fiscalização tenham a possibilidade de acompanhar as transações.

Na circulação de bens temos várias possibilidades para acompanhar os fluxos de mercadorias. Temos as declarações de alfândega, os certificados de produção, encomendas e contabilidade. Neste ponto, a globalização ainda não permite fluxos incógnitos de mercadorias.

Precisamos controlar os fluxos financeiros incógnitos. A fiscalização precisa ser internacionalizada.

O Estado suíço teve de intervir como um bombeiro com 66 bilhões de francos: isso não o incomoda como ministro das Finanças?

Sou um liberal e um adepto da economia social de mercado. Nesse sentido, sou da opinião de que a economia tem de se auto-ajudar. Mas a economia também deve respeitar princípios de concorrência e competitividade. Dessa forma, naturalmente me incomoda o que está acontecendo.

No entanto, trata-se de colocar na balança os interesses em jogo, e eu acredito que o interesse do país tem prioridade. O UBS tornou-se tão grande que uma derrocada teria efeitos imprevisíveis e inegáveis para toda a economia – não só para a praça financeira. Nessa situação, fomos forçados a agir.

Na briga fiscal com a União Européia, a Suíça fez concessões, mas a UE quer mais. O senhor espera novos ataques ao sigilo bancário em 2009?

O sigilo bancário encontra-se há muito tempo sob pressão. Isso é uma realidade que temos de aceitar como tal. Estou convencido, porém, de que o sigilo bancário é entendido de forma errada. Ele não é absoluto. Nós nunca acobertamos fraudes fiscais.

O sigilo bancário é a proteção da esfera privada. Não quero que o Estado vasculhe minhas contas bancárias, se pago os impostos em dia. Eu quero ter essa proteção da esfera privada. Essa é uma demanda justa.

Temos instrumentos a oferecer: o principal é o acordo sobre tributação de juros com a UE. Com isso, nós nos comprometemos a cobrar um imposto na fonte sobre a renda de pessoas físicas da UE. Esses 35% são transferidos para o fisco de origem do contribuinte.

Essa é a principal reivindicação dos outros Estados. Não lhes interessa a questão da proteção da esfera privada. O que lhes interessa é que esse dinheiro não seja sonegado e sim tributado. Tenho compreensão para com essa reivindicação.

Também a UE reconhece que a tributação dos juros funciona. Esse caminho nós queremos seguir e comunicar também com Estados não membros da UE.

O senhor acredita que poderá conter os ataques da UE à soberania fiscal dos cantões (estados suíços)?

Sim. Na briga fiscal, estou entre as frentes. Bruxelas disse que esse é o caminho certo, mas ainda não o objetivo. Os cantões e os partidos dizem o mesmo. Cada um objetiva um rumo diferente. São forças centrífugas. Para mim isso significa que estou no caminho certo.

O senhor encontra-se em idade de aposentadoria e poderia viajar pelo mundo em vez de estar onde está. O que o mantém no cargo?

Não tenho grandes planos de viagens porque já viajei muito em minha vida. Tenho uma tarefa ligada a muitos projetos, com os quais em parte tenho um vínculo afetivo e que têm prazos de conclusão.

Tive um grave incidente, uma parada cardíaca. O tratamento médico sempre tem a função de colocar o paciente em condições de trabalhar. E quando isso acontece, como no meu caso, então penso que se deve voltar ao trabalho. É o que eu fiz.

Estou bem de saúde. Eu estava bem antes desse incidente e, talvez, agora esteja ainda em melhor forma porque o coração novamente funciona bem. Conseqüentemente, isso (continuar trabalhando) é uma obviedade para mim.

Além disso, eu sempre disse que renunciaria em 2011. Considero correto continuar por uma segunda legislatura, porque uma legislatura não basta para concluir determinados projetos. Ainda não concluí tudo o que pretendo fazer.

O voto eletrônico para os suíços do estrangeiro ainda será introduzido durante a sua presidência?

Queremos isso e espero que façamos progressos nesse sentido. Mas isso não depende de mim. Há dificuldades relacionadas ao exercício do direito popular e existem problemas técnicos. Mas penso que essa idéia deve ser apoiada.

swissinfo, Andreas Keiser

Hans-Rudolf Merz (Partido Radical, direita) substituiu Kaspar Villiger no Conselho Federal (Executivo suíço) no início de 2004.

Entre 1997 e sua eleição para o governo federal, ele foi senador pelo cantão de Appenzell Rhodes-Exteriores.

Doutor em Ciências Políticas e ex-consultor de empresas, é casado e tem três filhos. Em 10 de novembro de 2008, completou 66 anos.

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