Ajuda helvética para rádios comunitárias no Brasil
Um projeto desenvolvido a partir da parceria entre dois jornalistas suíços possibilitará a formação de profissionais brasileiros para atuar em rádios comunitárias nas cinco regiões do país.
Criado pelos experientes Jean-Jacques Fontaine e Yves Magat, jornalistas ligados à Télévision Suisse Romande (TSR), o projeto Jequitibá teve início no ano passado e espera formar 240 animadores de rádios comunitárias até 2011.
A idéia nasceu quando Fontaine, que vive no Brasil desde sua aposentadoria em 2007, decidiu realizar em parceira com a ONG Viva Rio um trabalho de apoio e capacitação jornalística para rádios comunitárias: “Em 2008, a gente começou de forma experimental. Montamos um primeiro curso com quinze alunos. Ao mesmo tempo, havia um colega e amigo na TSR que fez um trabalho de formação para rádios no Benin e em Honduras. Trocamos experiências mútuas e eu adaptei o método que ele utilizou nesses países para a realidade brasileira, traduzi os exercícios e montei com ele um projeto”, explica o jornalista.
O colega a que se refere Fonatine é Magat, que vive na Suíça e vem sempre ao Brasil durante a realização dos cursos: “Eu fiquei impressionado com aquilo que Jean-Jacques me fez descobrir: no Brasil as rádios comunitárias são o verdadeiro sangue novo da população, próximas da realidade das pessoas e muito populares. Os animadores são em geral extremamente motivados, apesar de, em muitos casos, viverem em condições materiais muito duras”, diz.
Do sucesso da primeira experiência no Rio de Janeiro surgiu a oportunidade de montar um projeto de alcance nacional: “Tivemos a idéia de capacitar 240 pessoas nas cinco principais regiões do Brasil em três anos. O curso terá duração de uma semana, com cinco dias intensivos mais um dia de repetição seis meses depois. A idéia era fazer as regiões Nordeste, Norte, Centro-Oeste, Sul e Sudeste”, explica Fontaine.
O objetivo dos jornalistas suíços é oferecer aos brasileiros “um curso muito prático, com técnicas de entrevista, sem fazer muita teoria e onde você faz o exercício e o critica em seguida”, como define Fontaine. “Não se trata, é claro, de querer impor uma ‘visão suíça’ do jornalismo, mas sim de levar algumas técnicas de base que cada participante do curso poderá interpretar à sua maneira e dentro de seu contexto social e cultural”, acrescenta Magat.
Começo em 2008
No ano passado aconteceram os primeiros cursos de uma semana, um no Rio de Janeiro e outro em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Em abril de 2009 houve um curso na Região Nordeste, realizado em Recife com 40 alunos de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. Foram duas semanas de curso para duas turmas de 20 alunos. Para outubro deste ano estão programados novos cursos na região, um em Aracaju (Sergipe) e outro no interior da Bahia, em uma cidade a ser definida.
No ano que vem, explica Fontaine, o projeto Jequitibá deverá chegar às regiões Norte e Centro-Oeste do Brasil: “A gente pretende fazer uma semana de curso em Belém (Pará), uma em Manaus (Amazonas), uma em Cuiabá (Mato Grosso) e uma em Goiânia (Goiás). Em 2011 cobriremos o Sul e o Sudeste, provavelmente em Curitiba (Paraná), Porto Alegre (Rio Grande do Sul) e São Paulo (SP)”.
A cada curso, o trabalho é feito com parceiros locais: “Em Recife, trabalhamos com a Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço). Em Sergipe, com a Faculdade de Comunicação da Universidade Federal de Sergipe. Na Bahia trabalhamos diretamente com o governo estadual”, exemplifica Fontaine.
Apoios
Atualmente, o projeto tem o apoio da Unesco, da Cidade de Genebra, da Comuna de Cartigny, da Embaixada da Suíça no Brasil e da TSR: “Fiquei na Suíça por três meses em 2008 somente para captar dinheiro para o Jequitibá. O projeto interessou a muita gente, como a Cidade de Genebra e a Comuna de Cartigny, onde eu morava. Depois vieram outros. Eu voltei para o Brasil com promessas de financiamento que já davam para cobrir 50% ou 60% do projeto por três anos”, conta Fontaine.
O valor total do projeto, segundo os jornalistas, é de US$ 200 mil por três anos: “Não é monstruoso, mas é, de qualquer forma, uma quantidade considerável de dinheiro. Isso cobre o custo de transporte dos alunos, de alojamento, comida, material do curso e também a distribuição de um gravador digital para cada rádio, para que possam fazer reportagens de rua. Oitenta por cento do que fazemos é trabalho voluntário”, diz Fontaine.
Mesmo não tendo o lucro como objetivo, o trabalho realizado no Brasil é muito gratificante para os jornalistas: “Eu acredito que o fato de estar no estrangeiro, em contextos em geral muito mais difíceis do que na Suíça, nos ajuda a relativizar as coisas, tanto na vida profissional quanto na nossa visão de mundo. Em termos de jornalismo, estou cada vez mais convencido de que não se pode compreender uma situação nem transmiti-la ao nosso público se não estivermos verdadeiramente no próprio local, mesmo que por um tempo curto”, afirma Magat.
Maurício Thuswohl, swissinfo, Rio de Janeiro
Durante a conversa com a reportagem da swissinfo, dias antes de partir para Moscou em uma nova cobertura internacional para a TSR, Yves Magat contou uma história que, segundo ele, ilustra todo o respeito que sente pelos jornalistas que exercem com dificuldade sua profissão nos países econômica e democraticamente menos desenvolvidos:
“Eu fazia uma reportagem sobre as rádios rurais num vilarejo do Benin, no Oeste da África, e entrevistei um colega jornalista. Ele acabara de percorrer vários quilômetros em uma péssima estrada de terra para chegar a sua redação, onde o vento e a poeira entravam livremente. Eu perguntei a ele qual era, na sua opinião, a principal qualidade de um bom jornalista. Ele refletiu um pouco e me respondeu: a humildade”.
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