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A bicicleta prestes a entrar na Constituição suíça

Funcionário faz a marca de uma bicicleta sobre a ciclovia em uma rua da Suíça.
Funcionário da municipalidade faz a marca de uma bicicleta sobre a ciclovia em uma rua da Suíça. Keystone

Promover o ciclismo com infraestruturas adequadas: com o objetivo de ancorar as ciclovias na constituição, a proposta será votada no dia 23 de setembro. Este é um passo necessário, de acordo com o governo e o Parlamento. O Partido do Povo Suíço (SVP), no entanto, se rebela contra porque considera a emenda constitucional desnecessária e ilusória.

A proposta de complementar o artigo constitucional sobre os caminhos e trilhas de caminhadas com ciclovias será tão bem-sucedida nas urnas quanto a introdução do mesmo artigo constitucional há quase 40 anos? Para obter uma resposta terá que se esperar pelos resultados da votação.

Mas uma coisa já é certa: as condições da época são muito parecidas com as de hoje. Desta vez, da mesma forma que antes, tudo começou com uma iniciativa popular, que mais tarde foi retirada em favor de uma contraproposta direta, que encontrou amplo apoio no Parlamento.

Motivos nobres

Tanto na iniciativa popular nacional para a “Promoção dos caminhos e trilhas para caminhadas” (Iniciativa da bicicletaLink externo) como atualmente com a iniciativa popular nacional para “Promover as ciclovias, caminhos e trilhas para caminhadasLink externo” o governo e o Parlamento consideram que as preocupações sejam justificadas, mas não os meios para alcançar o objetivo.

“Ninguém da comissão questiona a necessidade de promover um tráfego mais lento, especialmente o ciclismo”, disse a porta-voz da comissão Raphael Comte, ante ao Conselho dos Estados (pequena câmara do Parlamento).

O senador do Partido Liberal (FDP, na sigla em alemão) de Neuchâtel recordou que já naquela época, nos debates parlamentares sobre a contraproposta para a iniciativa de promover caminhos e trilhas de caminhadas, em 1977, o Conselho Nacional (Câmara dos Deputados) também teria saudado o artigo constitucional sobre a inclusão de ciclovias. Na ocasião, porém, o Conselho dos Estados (Senado) a recusou.

A bicicleta foi, portanto, excluída da Constituição federal. Uma lacuna que não só é inaceitável para os proponentes da iniciativa Velo, como também quer ser fechada pelo governo e pelo Parlamento o mais rapidamente possível.

O governo federal e vários parlamentares enfatizaram os benefícios do aumento do uso de bicicletas na vida cotidiana. Uma das principais vantagens seria a diminuição do transito individual motorizado e o alívio das multidões no transporte público, que por sua vez levaria a uma redução do consumo de energia, emissões e ruído. Por último, mas não menos importante, também contribuiria para a promoção da saúde, porque a pessoa se movimenta fisicamente enquanto anda de bicicleta.

Explorar os potenciais com uma infraestrutura segura

As bicicletas são amplamente utilizadas como meio de transporte em toda a população suíça. Segundo estimativas, quase 4 milhões de bicicletas circulam na Suíça, e os números de vendas dos últimos anos mantiveram-se em um patamar elevado. Em 2017 cerca de 330 mil bicicletas foram vendidas, 4,2% a mais que no ano anterior. Quase 90 mil dessas eram e-bikes (bicicletas parcialmente movidas a bateria), uma categoria em pleno crescimento, que bateu um novo recorde com crescimento de 16,3%.

Mas o potencial no uso diário está longe de estar esgotado. Estima-se que quase 80% das viagens de ônibus e bonde, e 50% das viagens de carro estejam num raio de cinco quilômetros, uma distância que poderia ser facilmente coberta com o uso da bicicleta.

Para promover o uso da bicicleta é essencial fornecer ciclovias seguras e de alta qualidade, isto é, separadas do tráfego motorizado, bem como de calçadas e caminhos. Isto não é apenas necessário tendo em vista de forte crescimento do tráfego esperado nos próximos anos, mas também dadas as muitas vítimas de acidentes de bicicleta na Suíça, como o governo e a maioria parlamentar reconheceram.

“O tráfego de bicicletas é o único segmento em que o número de feridos e pessoas mortas em acidentes aumentou desde 2000”, disse a ministra dos transportes Doris Leuthard, quando lançou a campanha do referendo. Um aumento que também tem a ver com o aumento de e-bikes.

O governo federal não precisa, ele pode

Com a emenda constitucional, que será votada em 23 de setembro, o governo federal seria responsável também por estabelecer princípios para ciclovias, como tem sido até então para caminhos e trilhas de caminhada. Este pedido dos iniciadores foi assumido pelo governo na contraproposta.

Aos olhos do governo, no entanto, foi um exagero a obrigação para o governo federal, prevista na iniciativa, de que este deve ser responsável por coordenar e promover medidas dos cantões e de terceiros para construir e manter redes atraentes e seguras, e comunicar sobre isso, em conformidade com as “responsabilidades dos cantões.”

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Este conteúdo foi publicado em Os eleitores suíços provavelmente irão decidir sobre uma iniciativa popular que pretende impulsionar o uso de bicicletas. A iniciativa, com as assinaturas necessárias, foi entregue às autoridades federais no início de março. Não existe informação disponível sobre quantos quilômetros de ciclovia existem na Suíça. Existem apenas informações específicas para turistas sobre algumas rotas ciclísticas e…

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Por causa do federalismo e da autonomia cantonal, o governo suíço preferiu uma formulação de poder, mas não de dever: o governo federal pode promover e coordenar.

Em relação a este último, a competência de suporte e coordenação do governo federal então iria se estender também às medidas a terceiros – especialmente as organizações que trabalham nesta área – e as informações sobre essas diferentes redes, como exigido pela iniciativa.

“Tarefa adicional desnecessária”

Com esta solução de compromisso, a contraproposta passou com sucesso no teste parlamentar: foi aceita por todas as partes, exceto o pelo SVP. Representantes do partido conservador de direita rejeitaram a emenda constitucional, porque ela era desnecessária e interferia na divisão de responsabilidades entre o governo federal, cantões e municípios.

“Nós atacamos desta forma a soberania dos cantões e municípios, e nós intervimos aqui em um pouco de uma coisa que já funciona hoje”, disse Thomas Hurter em nome da fracção SVP, e salientou que os cantões e municípios sabiam exatamente onde eles deveriam ser atuantes.

“Neste sentido, o governo federal não pode assumir tarefas ainda mais desnecessárias, que com certeza não se enquadram no âmbito da sua jurisdição”, disse seu colega de partido Erich Hess.

De acordo com os representantes SVP também é utópico acreditar que a construção de uma rede de ciclovias em todo o país incrementaria automaticamente o uso regular da bicicleta. As condições meteorológicas muitas vezes adversas – muito frio ou muito quente, chuva, neve, vento – pesariam contrárias a isso, disse Hurter. Além disso, no dia-a-dia, especialmente os caminhos planos são adequados para a bicicleta. Ou seja, nas cidades, e aí não há grandes opções de expansão, acrescentou.

A decisão final será tomada pela população votante, que só pode se decidir sobre a contraproposta direta. O compromisso formulado pelo governo também tem convencido os iniciadores, juntamente com a maioria dos parlamentares, que posteriormente retirou a sua iniciativa em favor da contraproposta. Este último deve ganhar a maioria dupla nas urnas: a maioria do povo e a dos cantões (estados).

Adaptação: Flávia C. Nepomuceno dos Santos

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