Uma viagem ao povoado mais elevado da Europa
Ainda faltam algumas semanas para o inverno, mas a estação mais fria do ano já começou no lugar habitado ininterruptamente mais elevado da Europa. swissinfo esteve no local, um pequeno vilarejo chamado Juf.
O caminho é montanha acima, através de uma estreita estrada, passando pelo cenário perfeito de povoado e até chegar no topo: Juf, 2.126 metros acima do nível do mar.
A estrada e os cabos elétricos, que correm lado a lado, são o sistema de sobrevivência para aquilo que eu acredito seja um grupo de agricultores reclusos que, pouco depois da Suíça começar a prosperar nos anos do pós-guerra, decidiu esquivar-se da civilização.
E ao longo do dia, quanto mais a minha imaginação ultrapassava fronteiras, mais eu imaginava esse pequeno lugar sitiado por tropas inimigas. Em um determinado momento nós cruzamos com um grupo de homens agachados na lateral da estrada. Vestidos com roupas no estilo militar verde-caqui, eles estavam apontando os rifles na direção de Juf.
Barulhos ensurdecedores de tiros podiam ser escutados ocasionadamente. Quando o ônibus parou no acostamento, fui testemunha de uma grande marmota morta que estava sendo carregada no bagageiro de um carro parado no estacionamento.
Os invasores armados eram caçadores que haviam viajado dos mais distantes rincões da Suíça para exercer o seu hobby preferido. Juf, eu havia descoberto rapidamente, pode ser distante de tudo, mas seguramente está no mapa dos caçadores helvéticos.
Esse lugar escassamente habitado – contando apenas com algumas dezenas de almas – teve o azar de ter sido cercada nesse período do ano por uma gigantesca colônia de marmotas. Os campos dos fazendeiros estavam cobertos de buracos feitos por elas, alguns apenas alguns metros distantes das residências.
Minha anfitriã, Dorli Menn, se arriscou de sair da sua casa para me saudar. Rapidamente ele me assegurou que Juf é normalmente um lugar tranqüilo, onde duas clãs familiares, a sua e a dos Luzi, vivem em co-existência pacífica há séculos.
Negócios
O gado, cabras e carneiros geram apenas uma modesta renda suplementar para os habitantes. Na verdade eles vivem dos quartos e apartamentos que são alugados aos esquiadores ou alpinistas, além de gerir alguns pequenos hotéis e um restaurante.
Quando ela me levou para o passeio obrigatório através do vilarejo, eu achei que tinha pouca coisa para se ver, mas bastante para se falar. Dorli contou-me que foi seu pai que, em 1948, acabou com a tradição centenária da vida nômade, algo comum para as pessoas que vivem nos Alpes.
Antes disso, as famílias do Juf se mudavam para comunidades na parte baixa do vale, onde eles passavam a maior parte do longo inverno.
“Meu pai casou-se e decidiu ficar aqui mesmo nessa época fria do ano, pois deslocar-se não era algo que lhe alegrava. Você sempre precisa carregar todas as suas posses, incluindo até mesmo os animais”
Nômades
Dorli é um dos últimos “nômades” de Juf. Ela trabalha três dias por semana num escritório na cidade de St. Gallen, duas horas distantes de carro de Juf.
Ela atua na política, tendo o cargo mais importante de representação dessa pequena, mas crescente comunidade na parte superior do vale. Dentre as suas tarefas, ela também acompanha jornalistas que ocasionalmente aparecem e que desejam escrever sobre a vontade de Juf de se tornar mais conhecida.
Depois encontramos um dos irmãos de Dorli, que nos mostrou como o esterco de carneiro é utilizado como lenha para esquentar as casas durante o inverno. Outro irmão e sua esposa cuidam da única lojinha do vilarejo e que funciona ao mesmo tempo como correio.
Nos divertimos bastante com um rebanho de carneiros que corria através das casas e de ver duas galinhas cruzando a estrada. Eles pareciam estar confiantes de que nenhum veículo iria atropelá-las, tão raros são aqueles que circulam no local.
Fertilidade
Dorli ficou vexada quando eu perguntei-lhe sobre a vida nesse lugar que, até mesmo para padrões suíços, é tão isolado. Eu também disse que gostaria de saber o segredo da vitalidade do local, enquanto que vários vilarejos dos Alpes suíços não integrados na forte indústria do turismo parecem estar morrendo.
“Esse é um bonito vale, pois é tão alto e não tão fechado pelas montanhas”, ela disse. Além disso, também é fértil. Apesar de a altura limitar os períodos de plantação em dois ou três meses, Dorli e seus vizinhos plantam espinafre, alface, cenouras, rabanete e beterraba.
O gado aprovisiona os habitantes com carne e produtos frescos diários. Dessa forma as viagens até os vilarejos na parte inferior do vale acabam sendo pouco freqüentes.
Nossa conversa foi interrompida por uma chamada telefônica. Um caçador havia atirado numa marmota que estava próxima da casa de um dos irmãos de Dorli. O animal morto espantou sua família e, sobretudo, as crianças pequenas. O mais chocante é que o caçador desapareceu sem remover a carcaça do animal.
Um fiscal foi chamado para registrar o ato. E Dorli teve de comparecer para resolver mediar o conflito com os caçadores. A vida em Juf é raramente tão agitada como foi nesse dia.
swissinfo, Dale Bechtel
Aproximadamente 200 pessoas vivem nos oito pequenos povoados, incluindo Juf. Eles constituem a comuna de Avers, no sudeste da Suíça.
Juf, localizada a 2.126 metros acima do nível do mar, é considerada o lugar habitado durante o ano inteiro mais elevado da Europa.
Juf pode ser visitada em duas horas de viagem de carro, saindo de Zurique. Outra alternativa é trem e ônibus: três horas de viagem.
A maior parte dos vilarejos da comuna dispõem de pequenos hotéis e apartamentos de férias.
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