
Aquecimento global ameaça turismo de esqui nas montanhas suíças

O aumento das temperaturas transforma o turismo nas montanhas suíças, com prejuízos ao esqui, risco estrutural em chalés e trilhas, e adaptação forçada ao verão. Especialistas alertam para o declínio da demanda por esportes de inverno.
Assine AQUI a nossa newsletter sobre o que a imprensa suíça escreve sobre o Brasil, Portugal e a África lusófona.
As mudanças climáticas estão transformando a Suíça, o que é perceptível nas regiões turísticas. “O aumento das temperaturas é fatal para o turismo de esqui”, afirma Monika Bandi, diretora do Centro de Pesquisa em Turismo da Universidade de Berna. “Além disso, há precipitações intensas mais frequentes no verão, invernos com menos chuva e o degelo do permafrost, que pode tornar encostas instáveis.”
Assim, um em cada três chalésLink externo do Clube Alpino Suíço está potencialmente ameaçado, por estar localizado em uma área onde o permafrost está derretendo. Trilhas de caminhada também estão em risco. “Cada vez mais, devemos contar com riscos naturais em regiões e épocas do ano que antes eram poupadas”, informaLink externo a organização Trilhas de Caminhada Suíças.
O degelo do permafrost levará a mais deslizamentos de rochas, além de chuvas intensas e avalanches de neve úmida em altitudes mais baixas.
>> Um deslizamento de terra soterrou quase todo o vilarejo montanhoso de Blatten no final de maio de 2025:

Mostrar mais
O vilarejo alpino que desapareceu sob lama e gelo
Temporada de outono mais longa
“Os impactos das mudanças climáticas são fortemente dependentes do local e da estação do ano. Nas montanhas, a falta de neve ameaça o turismo de esqui; no verão, tempestades dificultam as atividades ao ar livre”, diz Bandi.
No entanto, nem todos os efeitos são negativos. “No verão, as regiões alpinas podem se tornar mais atraentes por causa das temperaturas mais amenas”. E ela acrescenta: a temporada de outono agora pode ser estendida até outubro ou até novembro, mesmo em altitudes elevadas.
O Empresa de Turismo da Suíça recentemente passou a promover o outono de forma direcionada. Astros como Roger Federer e Mads Mikkelsen foram convidados para um vídeo publicitárioLink externo, com o objetivo de atrair mais turistas para o outono suíço.
O maior problema com o aumento das temperaturas afeta as estações de esportes de inverno. “A garantia de 100 dias de neve com 30 a 50 cm está se tornando cada vez menos realista”, afirma Bandi. A linha de zero grau deve subir mais 300 metros até 2050, segundo preveem cientistas em um boletim técnicoLink externo encomendado pela organização Seilbahnen Schweiz.
As estações de esquiLink externo em altitudes médias de até 1.500 metros são especialmente afetadas – no futuro, deverá chover mais do que nevar, principalmente no início e no final do inverno. Isso encurtará a temporada de esqui e não pode ser compensado por canhões de neve, já que estes só produzem neve em dias de gelo com temperaturas abaixo de 0 °C.
Neste vídeo, o operador de um teleférico de esqui explica por que ainda faz neve artificial em sua pista:
Ainda vale a pena manter um teleférico a 900 metros de altitude? O proprietário explica por que continuá-lo operando.
É difícil estimar o quão drásticas serão essas mudanças para o destino turístico de esportes de inverno na Suíça. “Hoje em dia, menos crianças estão aprendendo a esquiar”, diz Monika Bandi. E questiona: “Será que daqui a 10 ou 20 anos ainda haverá demanda para gastar de 80 a 100 francos por um dia de esqui?”
Até os teleféricos suíços afirmam em sua estratégiaLink externo de adaptação que a demanda irá diminuir. Já hoje, mais de 60 teleféricos abandonados estão espalhados pela paisagem suíça – e, com o aumento das temperaturas, esse número deve crescer.
Para compensar as perdas da temporada de inverno, destinos típicos de esportes de inverno como Lenzerheide, Arosa e Saas Fee se modernizaramLink externo para também atrair turistas no verão que procuram mais do que apenas caminhadas.
Os destinos montanhosos alpinos estão investindo em infraestrutura de verão, construindo trilhas para mountain bikeLink externo e corrida, parques de escalada e trilhas temáticas. Além disso, oferecem retiros de yoga e caminhadas gastronômicas.
A Empresa de Turismo Suíça mencionou à Swissinfo novas atrações como a trilha Experiência na GeleiraLink externo, um percurso temático no Engadin, o Arosa BärenlandLink externo ou a expansão do turismo de verão com foco em bicicleta, como em Disentis SedrunLink externo.
Turismo é produtor de CO₂
O turismo na Suíça não é apenas afetado pelas mudanças climáticas, mas também é uma causa destas. O consumo de CO₂ é fácil de calcular, mas não tão fácil de eliminar: “A pegada de carbono de uma viagem é causada em dois terços pelo transporte de ida e volta”, explica Monika Bandi. “Especialmente em viagens de longa distância.”
Uma maneira de reduzir essa pegada seria receber hóspedes de regiões próximas que permanecem mais tempo no destino. “Hóspedes regulares, como os de Scuol ou Adelboden”, diz Bandi.
Outros destinos, como Interlaken ou o Jungfraujoch, apostam em novos visitantes de todo o mundo. Combustível de aviação sustentável ainda não é uma opção realista, e as compensações também não são uma solução efetiva.
O último terço da pegada de CO₂ vem da alimentação, das construções e da infraestrutura para atividades. “Os teleféricos consomem principalmente energia hidrelétrica, e isso não é um grande fator”, afirma Bandi. Estabelecimentos de hospedagens buscam diferentes formas de economizar CO₂ e se tornarem autossuficientes em energia, como com painéis solares nos telhados, e cada vez mais hotéis oferecem alimentação vegetariana ou vegana.
>> Como o turismo pode se tornar mais sustentável? Um especialista do WEF responde

Mostrar mais
“Equilíbrio entre crescimento e sustentabilidade é o desafio do turismo”
Segundo Bandi, um bom exemplo são os albergues da juventude suíços que, apesar do crescimento nos últimos 20 anos, reduziram suas emissões de CO₂ pela metade, adotando construções ecológicas e diminuindo a oferta de carne. Isso também se deve ao fato de que os albergues tradicionalmente atraem grupos de hóspedes que não vêm de lugares distantes.
Projetos regionais para mais sustentabilidade
Regiões turísticas inteiras também iniciaram projetos para reduzir sua pegada de carbono, como o Fundo Climático MyclimateLink externo, de Davos. Este é baseado em contribuições voluntárias dos hóspedes – que são dobradas pelos estabelecimentos – para financiar projetos locais de proteção climática, como reformas de edifícios ou instalações solares.
O objetivo é reduzir as emissões de CO₂ na região, sem a necessidade de exigências legais. Arosa também quer, segundo suas próprias palavras, se tornar um dos destinos mais sustentáveis dos Alpes. Para isso, iniciou a estratégia Arosa 2030Link externo, com a qual pretende equilibrar crescimento e sustentabilidade.
Mas, para Bandi, aí é que está a dificuldade. “É possível criar boas ofertas individuais para reduzir a pegada ecológica. Mas se a oferta for expandida ao mesmo tempo, o efeito do crescimento anula as economias.”
A meta de neutralidade de carbono para 2050 estabelecida pelo governo federal também se aplica ao turismo. Ela vê os maiores problemas especialmente nas áreas de esqui. “Os teleféricos podem ser operados de forma neutra em carbono”, afirma. Mas o balanço energético dos veículos de pista (pistenbullys) é problemático. Eles podem, talvez, ser usados eletricamente em trilhas de esqui cross-country, mas não em encostas íngremes. “No fim das contas, o turismo tem uma relação ambígua com a sustentabilidade.”
– As temporadas estão sendo estendidas ou até mesmo combinadas: em Arosa e Lenzerheide, é possível esquiar, pedalar e caminhar ao mesmo tempo em novembroLink externo.
– As áreas de esqui estão se expandindo para altitudes mais elevadas: enquanto muitas descidas para o vale estão praticamente intransitáveis, os destinos de esportes de inverno concentram-se nas altitudes mais altas. Zermatt planeja expandir a produção de neve no glaciar Theodul e no Klein Matterhorn, além da construção de um novo restaurante no Klein Matterhorn, a 3.800 m de altitude. Espera-se por neve no inverno e frescor no verão.
– Andermatt, Sedrun e Disentis uniram-se para formar uma única estação de esqui, a fim de oferecer maior altitude e segurança de neve – além disso, Andermatt aposta no turismo o ano todoLink externo, com golfe, uma sala de concertos e restaurantes exclusivos.
– A estação de esqui Sörenberg reintroduziu o preço fixo para os passes devido à falta de neve nos últimos anos. A pré-venda com sistema de preços flexíveis não funcionou, devido à incerteza sobre as condições de neve. Em 2024, um novo restaurante foi inaugurado no Brienzer Rothorn, e é comercializado como o “Topo da Biosfera”.
Edição: Balz Rigendinger
Adaptação: Flávia C. Nepomuceno dos Santos

Certificação JTI para a SWI swissinfo.ch
Mostrar mais: Certificação JTI para a SWI swissinfo.ch