Parlamento venezuelano rejeita que Constituinte tenha assumido suas funções
O Parlamento da Venezuela, de maioria opositora, aprovou neste sábado um acordo no qual “rejeita e desconhece” a decisão – condenada internacionalmente – da Assembleia Constituinte do presidente Nicolás Maduro de assumir suas competências.
“A Assembleia Nacional acorda rejeitar e desconhecer a pretensão da ilegítima Assembleia Constituinte de usurpar as funções legislativas que correspondem a este corpo parlamentar”, destaca o texto.
Os deputados acordaram, ainda, “denunciar à comunidade internacional a violação dos direitos políticos dos venezuelanos”.
Minutos depois, a presidente da poderosa Assembleia Constituinte, a ex-chanceler Delcy Rodríguez, negou em coletiva de imprensa que o Parlamento tenha sido dissolvido.
“É mentira que estão dissolvidos, hoje estavam em sessão. A Assembleia Nacional Constituinte disse ao velho Parlamento que tem que trabalhar respeitando a Constituição, conviver e coexistir respeitando o poder constituinte originário”, expressou.
Em um novo capítulo do conflito de poderes na Venezuela, nesta sexta-feira a Constituinte acordou assumir as competências do Parlamento para legislar sobre segurança, soberania, economia, finanças, bens do Estado e outros aspectos.
O Legislativo continua celebrando sessões, mas tem funções limitadas. Além disso, todas as suas decisões são anuladas pelo máximo tribunal – acusado de servir a Maduro -, que o declarou em desacato em janeiro de 2016, quando a oposição tomou as rédeas do Congresso.
Durante a sessão, o deputado Freddy Guevara rasgou o documento com a decisão da Constituinte, que rege a Venezuela com poderes absolutos.
“O que não vamos fazer é nos retirar. Que nos tirem com fogo, que nos tirem a bala, que nos tirem com violência, mas enquanto nós tivermos a capacidade e a vontade de defender este espaço, vamos fazê-lo”, disse.
O plenário explodiu em aplausos.
– “Ilegítima e inconstitucional” –
Compareceram à sessão deste sábado representantes do corpo diplomático, a convite dos deputados opositores.
Estavam presentes representantes de Brasil, União Europeia, Guatemala, Japão, Holanda, Alemanha, Itália, Polônia, Áustria, Argentina, França, Espanha, Reino Unido, Portugal, Canadá, Estados Unidos, México e Peru.
O líder opositor, Henrique Capriles, pediu à Organização dos Estados Americanos e “demais instâncias internacionais (…) assumir que na Venezuela há um autogolpe continuado”.
A decisão da Constituinte gerou um forte repúdio internacional. O secretário-geral da OEA, Luis Almagro, a considerou “ilegítima e inconstitucional” e pediu com urgência uma reunião especial do organismo.
O chamado grupo de Lima – Brasil, Argentina, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Guatemala, Honduras, México, Panamá, Paraguai e Peru – expressou em nota sua “enérgica condenação” à decisão da Constituinte de “usurpar as competências” do Parlamento.
Novos chefes parlamentares destes países qualificaram a decisão de uma “ruptura da democracia”. O Mercosul, os Estados Unidos, a Espanha e o Reino Unido também se uniram a este repúdio.
A chancelaria venezuelana rejeitou neste sábado, em um comunicado, a condenação internacional à decisão da Constituinte, especialmente por parte dos Estados Unidos, país ao qual acusou de propiciar uma “agressão militar e intervenção” contra o país caribenho.
– Um “fechamento técnico” –
Enquanto a Constituinte tomava sua polêmica decisão, a rebelde ex-procuradora-geral, Luisa Ortega, chegava a Bogotá, burlando a proibição de deixar a Venezuela, acompanhada do marido, o deputado Germán Ferrer, ambos chavistas dissidentes.
O novo procurador nomeado pela Constituinte, Tarek William Saab, abriu uma investigação contra Ferrer, a quem o governo acusa de fazer parte de uma “rede de extorsão”.
A Constituinte, cuja primeira decisão ao se instalar há duas semanas foi destituir Ortega, retirou a imunidade parlamentar do deputado e o TSJ, máxima corte do país, ordenou sua captura.
Antes de confirmada sua chegada a Bogotá, Ortega participou de uma cúpula de procuradores em Puebla, no México, e através de um áudio vinculou o presidente Maduro ao escândalo de corrupção da empreiteira brasileira Odebrecht.
A ex-procuradora afastou-se de Maduro no fim de março, depois de qualificar de “ruptura da ordem constitucional” decisões com as quais o TSJ destituiu de competências o Parlamento. Após uma dura condenação internacional, estas decisões foram revertidas.
O cientista político Luis Salamanca afirmou que era de se esperar que Constituinte assumisse as competências do Parlamento, embora a situação não se atreva a declarar seu “fechamento definitivo”.
“Seria um ato ditatorial nu e cru. O que ocorreu é um fechamento técnico da Assembleia. O governo usurpou a soberania popular, liquida a democracia”, disse à AFP.