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A crise do novo coronavírus, fonte de medo e preocupação

Avenida deserta na cidade francesa de Lyon afp_tickers

Medo do contágio e ansiedade pelo isolamento. A crise do novo coronavírus e o confinamento que está sendo aplicado em países europeus poderão deixar sequelas psicológicas, alertam profissionais, preocupados com os mais vulneráveis.

“Angústia, depressão, insônia, problemas cognitivos… tudo isso teremos”, prevê o psiquiatra Serge Hefez, que, como muitos colegas, fechou seu consultório e agora atende pelo Skype.

A situação inédita criada pela epidemia, que surgiu no fim de 2019, na China, levou a OMS a publicar, no começo de março, uma série de recomendações para a saúde mental da população, seja ela de idade avançada, isolada ou que trabalhe na área da saúde.

Erguer uma barreira contra as informações falsas, consideradas prejudiciais, e animar o diálogo em caso de estresse são alguns dos conselhos sugeridos. Com a propagação do vírus e as medidas de confinamento, “constatamos a chegada de novos pacientes, que já tinham problemas psicológicos. Este período os submete a situações emocionais difíceis de gerir”, assinala a psiquiatra Fatma Bouvet de la Maisonneuve.

Entre as preocupações que aparecem durante as teleconsultas, a especialista destaca: “medo da morte, do contágio, síndrome de abstinência, conflitos familiares dentro de grupos delicados, tédio, sensação de prisão e de não saber o que irá acontecer, medo de que a renda caia e de ter que conviver consigo mesmo”.

– Cenário de desastre –

De todos os cenários de desastre, uma epidemia paralisando parte do planeta era a menos plausível para muitos, após anos marcados por uma crise financeira, atentados e a emergência climática. E a isso, precisamente, deve-se o trauma, considera o psicanalista Roland Gori, que trabalhou nas repercussões dos atentados na França. “O trauma chega quando a pessoa não se preparou para um acontecimento. Se tem conhecimento de que o risco é iminente, prepara-se”, analisa.

Um sentimento que, até há pouco, ainda se traduzia na negação de alguns pacientes, que continuavam estendendo a mão para cumprimentá-lo, ou no pânico de outros. Uma reação clássica a epidemias, particularmente ancoradas em nosso imaginário, pela peste negra da Idade Média ou a gripe espanhola do século XX, assinala Serge Hefez.

“A primeira coisa que surge é a anomia (introduzida pelo sociólogo Durkheim], a preocupação de que os vínculos sociais terminem, a ausência de normas, o pânico do saque”. A isso se soma o medo do contágio, reforçado pelo caráter invisível do vírus, explica Hefez.

– Estruturas fechadas –

Outra preocupação: morrer de fome, “que é a amostra de um reflexo vital, a vontade de viver quando temos medo de morrer, de ficar sozinhos ou da escassez”, assinala Roland Gori.

Mas ante uma situação inédita, vêm reações inéditas: o confinamento em larga escala imposto em países europeus, a exemplo da China, poderia colocar à prova a saúde psicológica de alguns, mais ainda levando em conta que muitas das estruturas dedicadas à mesma estão fechadas.

“Aqueles que estão em família parecem suportar melhor a situação do que aqueles que estão isolados, o que poderia provocar danos que ainda não conhecemos”, assinala o psicanalista. Um acúmulo de situações que poderia levar a um consumo excessivo de álcool, tabaco ou drogas.

Dentro dos grupos ou células familiares, o confinamento também deu lugar a problemas: frustrações, transtornos e, às vezes, violência. “Os conflitos com os adolescentes aumentam, pois eles não têm, necessariamente, consciência da situação e querem continuar saindo com os amigos. Alguns idosos também desejam continuar vivendo como antes, pois sentem que não têm nada a perder”, observa Fatma de la Maisonneuve.

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