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Marcha na Maré reivindica lutas de Marielle Franco

Manifestantes participam de marcha na comunidade da Maré em memória à vereadora assassinada Marielle Franco, no Rio de Janeiro, 18 de março de 2018 afp_tickers

Uma marcha com cerca de 2.500 pessoas no complexo de favelas da Maré, um dos mais violentos do Rio, reivindicou neste domingo (18) a memória e as lutas da vereadora Marielle Franco, nascida e criada nesta comunidade da zona norte da cidade e assassinada na noite de quarta na região central.

“A voz da Marielle não foi calada”, gritou um dos organizadores da passeata, usando um megafone.

Mulher negra que denunciava o racismo na sociedade brasileira e mãe solteira, Marielle Franco surpreendeu muitos ao ser eleita vereadora em 2016. Ela ganhou fama como ativista dos direitos humanos, particularmente por denunciar a violência policial nas comunidades.

“A voz da Marielle não se cala. O que vocês estão vendo aqui vai acontecer todos os dias. Hoje, todas as mulheres se chamam Marielle Franco”, afirmou, durante a marcha, Mônica Cunha, fundadora de uma associação de mães de vítimas de abusos da Polícia.

Marielle, de 38 anos, foi morta no bairro do Estácio, na região central da cidade, com quatro tiros na cabeça, após sair de um encontro de mulheres negras na Lapa (centro). No ataque também morreu o motorista do carro que a conduzia, Anderson Gomes.

“Eles tentaram transformar a Marielle em medo. Querem que a gente tenha medo. Mas o que vai acontecer é o contrário”, disse o deputado federal do PSOL do Rio de Janeiro Glauber Braga, durante a manifestação. “Vai ser uma multiplicação de coragem em todo o Brasil”.

A marcha avançou por cerca de um quilômetro debaixo de sol forte pela avenida Brasil, uma das principais vias de acesso à cidade e que delimita as comunidades do complexo da Maré, onde 140 mil pessoas se amontoam em uma área de 5 km², com forte presença de grupos de narcotraficantes.

Os organizadores tentavam direcionar a marcha, pedindo nervosamente aos jornalistas que evitassem filmar na direção da favela.

Outro protesto foi celebrado em São Paulo.

– Notícias falsas e novas pistas –

A morte da vereadora chocou o País. Na quinta-feira, dia seguinte à sua execução, 50.000 pessoas se manifestaram no centro do Rio e cerca de 30.000 em São Paulo.

Desde então, a guerra de conjecturas e notícias falsas em torno de sua morte se intensifica na internet.

Uma das hipóteses mais mencionadas é que suas atividades como vereadora teriam incomodado os milicianos, que impõem a lei em várias comunidades da cidade.

O PSOL, partido a que Marielle pertencia, anunciou que entrará com uma ação contra uma desembargadora que afirmou que a vereadora foi executada por ter “descumprido compromissos” com o Comando Vermelho, principal facção criminosa do Rio, embora logo depois tenha admitido que se baseou apenas na mensagem de uma amiga.

Alguns analistas afirmaram que a vereadora tem potencial para se tornar uma mártir simbólica do porte de Chico Mendes, líder seringueiro que, após seu assassinato, em 1988, virou símbolo da luta pela preservação da Amazônia.

“Quem trabalha com direitos humanos no Brasil trabalha com homicídios, trabalha com morte”, afirmou o deputado estadual e companheiro de partido Marcelo Freixo, que impulsionou a carreira da vereadora.

Segundo o site de notícias Opera Mundi, alojado no portal de UOL, 24 líderes comunitários foram assassinados nos últimos quatro anos no Brasil.

Quanto às investigações, informações publicadas pela imprensa deram conta de que um carro semelhante ao usado pelos assassinos foi encontrado neste domingo em Ubá, cidade da Zona da Mata de Minas Gerais, vizinho ao Rio.

– A intervenção federal, questionada –

Desde o fim dos Jogos Olímpicos do Rio-2016, as tensões são crescentes no Rio, um estado à beira da falência, castigado por tiroteios constantes entre a Polícia e bandos de narcotraficantes.

O mais recente episódio de violência ocorreu na noite de sexta-feira, quando um bebê e outras duas pessoas morreram atingidas por balas perdidas durante um confronto no Complexo do Alemão, zona norte da cidade.

Há um mês, o presidente Michel Temer determinou a intervenção federal na segurança pública do estado do Rio de Janeiro, mas apesar do barulho feito por esta medida, inédita desde a restauração da democracia, em 1985, não há evidências de que a situação tenha melhorado.

“A intervenção do Rio é uma fantasia, não existe (…) É uma invenção do publicitário do Temer, não foi ninguém da área de segurança pública. Não tem nenhum plano e já completou um mês. Eles não sabem o que estão fazendo”, disse Marcelo Freixo.

Na noite deste domingo, o governo anunciou que desbloquearia cerca de um bilhão de reais para o Ministério da Segurança Pública, criado paralelamente ao decreto de intervenção no Rio.

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