Perspectivas suíças em 10 idiomas

Disputa no STF por desoneração pode atrapalhar esforços do governo sobre Perse e antecipação de gastos

Por Ricardo Brito e Lisandra Paraguassu e Bernardo Caram

BRASÍLIA (Reuters) -A decisão do governo de ingressar no Supremo Tribunal Federal (STF) com ação para suspender a prorrogação da desoneração de 17 setores da economia e municípios deve prejudicar as negociações com o Congresso para as aprovações da reformulação do Perse e do projeto que permite a liberação antecipada de 15 bilhões de reais em gastos extras, disseram à Reuters fontes do Congresso e do próprio governo.

A avaliação das fontes é que o clima para o avanço dessas matérias azedou, principalmente no Senado, após a investida do governo no STF para barrar a desoneração — matéria que já tinha sido alvo de um veto presidencial, posteriormente derrubado em sessão do Congresso Nacional, e que depois o próprio governo enviou uma proposta de manutenção da medida, mas com uma reoneração escalonada.

“Haverá retaliação”, disse uma fonte do PT no Senado, mencionando que parlamentares devem aumentar o impacto fiscal do programa de benefícios fiscais ao setor de eventos, o Perse.

Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao STF, o ministro Cristiano Zanin concedeu na semana passada liminar atendendo ao pedido do governo de suspender as desonerações, o que levou o presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), forte entusiasta da desoneração, a anunciar no dia seguinte um recurso contra a decisão após falar em “erro” na investida judicial do governo.

Até o momento há cinco votos no STF para se manter a decisão de Zanin — um a menos para se formar maioria –, a despeito do pedido de vista do ministro Luiz Fux para avaliar o processo com mais tempo.

Uma fonte do Palácio do Planalto reconheceu que, ainda que o governo já tivesse aventado publicamente a possibilidade de ida ao STF, o momento para a apresentação do recurso ao Supremo não foi o melhor, logo após o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, entregar em mãos a Pacheco a proposta de regulamentação da reforma tributária — a prioridade legislativa do governo no ano.

Três fontes do Senado disseram que o impasse sobre a desoneração deve trazer consequências para a aprovação do projeto que reformula a concessão de benefícios fiscais do Perse. Na semana passada, a Câmara aprovou a proposta do governo que estabelece um limite de 15 bilhões de reais para o montante de incentivos entre abril de 2024 e fevereiro de 2027.

Contudo, a senadora Daniella Ribeiro (PSD-PB), relatora do Perse no Senado, já adiantou que vai propor alterações que devem ampliar o impacto da proposta, como a correção pela inflação. O texto deve ser votado no Senado na terça e, se aprovado, terá de voltar à Câmara.

Outra proposta importante para o governo que pode enfrentar dificuldades é a que reformula e retoma a cobrança anual obrigatória de proprietários de veículos conhecida como DPVAT. Nesse texto, que também já passou pela Câmara, foi aprovado um artigo que altera o arcabouço fiscal para antecipar de maio para agora uma liberação de gasto extra de cerca de 15 bilhões de reais para este ano.

A fonte da Fazenda reconheceu a piora da situação para o governo no Senado, mas disse que o ministério ainda está avaliando o cenário para se ter uma melhor avaliação. A fonte disse que, no caso do DPVAT, não deve haver votação contra porque já há acordo para que parte dos 15 bilhões que serão abertos para gastos extras pelo projeto sejam convertidos em emendas parlamentares.

A intenção é casar essa abertura orçamentária com a derrubada do veto de Lula às emendas de comissão, no valor de 5,6 bilhões de reais. Ainda assim, a proposta teve sua votação adiada na Comissão de Constituição e Justiça do Senado para a próxima semana após um pedido de vista coletivo anunciado pelo presidente do colegiado, Davi Alcolumbre (União-AP), aliado de Pacheco. Ele chegou a falar que a iniciativa era para não criar “mais um transtorno” após sucessivas mudanças no rito de tramitação da matéria.

Outra fonte no Senado aliada ao Palácio do Planalto disse que o governo teve sorte de esta semana os trabalhos legislativos estarem esvaziados em razão do feriado de quarta-feira, Dia do Trabalho. Se não fosse, acrescentou, o Executivo corria sério risco de ser derrotado em votações no Senado.

Em entrevista após participar de audiência pública no Senado, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, minimizou o adiamento da votação do DPVAT, dizendo ser natural e não representar um sobressalto. “Semana que vem teremos a votação”, disse.

NEGOCIAÇÃO

Ao mesmo tempo, o governo quer usar a iminente vitória no STF sobre a desoneração como trunfo para costurar uma saída negociada para o caso, segundo a fonte palaciana. O próprio Lula pediu no final de semana para se buscar uma proposta que seja um meio termo para a desoneração.

Sem alterações, a desoneração dos 17 setores e prefeituras custará aos cofres públicos este ano 15,8 bilhões de reais, segundo dados da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda.

O ministro da Casa Civil disse que o único caminho é “conversar, conversar, conversar” para se chegar a um acordo.

“Precisamos conversar para encontrar uma solução. Alguns dizem que não podem pagar, no caso dos municípios, aquele valor da Previdência. Outros, as empresas, dizem eu não quero ou não posso pagar esse valor. Alguém vai ter que pagar a diferença, o dinheiro vai ter que vir de algum lugar. Estamos dialogando e encontrando as soluções”, afirmou Costa.

Na segunda-feira, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, conversou com líderes governistas e ficou decidido que ele e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se reuniriam com Pacheco nesta terça-feira para tentar começar uma negociação.

Contudo, uma fonte ligada a Pacheco disse que não está previsto qualquer encontro dele com ministros e líderes governistas nesta terça. Na véspera, o presidente do Senado encontrou-se apenas com o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), que é o relator do projeto de recriação do DPVAT.

Segundo uma fonte, a busca de um acordo em torno da desoneração dos prefeitos será mais fácil. Segundo ela, há um grupo de trabalho debatendo com entidades para apresentar uma proposta aos prefeitos até o dia 20 de maio, na tradicional Marcha dos Prefeitos, e que as tratativas estão bem encaminhadas.

A dificuldade está em buscar um acerto com os 17 setores, que tem feito muita pressão, inclusive com representantes ligando para senadores.

(Edição de Pedro Fonseca)

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR