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Berna tem delegado pela igualdade do deficiente

Brian McGowan no seu escritório em Berna swissinfo.ch

A cidade de Berna é a primeira no país a ter criado um posto de delegado para igualdade de portadores de deficiência.

Quando Brian McGowan assumiu esse desafio, suas aspirações eram elevadas: garantir a igualdade através da eliminação de barreiras. E elas ainda são enormes. Entrevista swissinfo.ch

A deficiência nunca foi uma barreira para Brian McGowan, pelo menos aos seus sonhos. Preso em uma cadeira de rodas desde o início da infância, o suíço-irlandês sempre frequentou escolas com crianças normais. Ele até mesmo fazia férias de esqui nas montanhas. “Minha mãe era uma pessoa muito forte, que sempre me acompanhou e fortaleceu nessas ocasiões”, conta.

Sua paixão por viagens pelo mundo – já fez várias a países como Índia, EUA, Indonésia e Japão – é tão grande que aspirava, após os estudos em história e ciências da religião na Universidade de Zurique, a trabalhar como cooperante internacional. Se isso não se concretizou, ele pelo menos pode ser considerar realizado profissionalmente: há um ano McGowan é delegado para igualdade de portadores de deficiência na cidade de Berna, a primeira a abrir um posto dedicado a esse grupo especial da população.

Em seu escritório, o suíço recebe swissinfo.ch e, na entrevista a seguir, explica o que já conseguiu alcançar em doze meses.

swissinfo.ch: Você se sentia limitado pela deficiência física quando era criança? 

Brian McGowan: Quando criança a gente vê as coisas com outros olhos. Obviamente logo percebi que eu não podia fazer muita coisa. Porém nunca frequentei escolas especiais, mas sim as normais. Na hora do recreio observava meus colegas jogando futebol. Porém não considerava isso uma deficiência. Outras crianças precisavam de óculos e eu simplesmente não podia jogar futebol.

swissinfo.ch: Mas como criança ou adolescente você já pensava na questão da igualdade de direitos para os deficientes? 

B.M.: Essa discussão já existia e veio principalmente dos Estados Unidos, um país que já era mais avançado no tema. Mas na época pensava pouco sobre isso. Eu tinha pais, sobretudo a minha mãe, uma pessoa com forte personalidade, que se engajavam muito por mim. Ela me levava a todos os lugares para que eu pudesse também participar das coisas.

swissinfo.ch: Após o estudo qual foi o primeiro emprego que você conseguiu? 

B.M.: Foi um estágio na Secretaria Federal de Igualdade para Pessoas com Deficiências, em Berna, de 2009 a 2010. Lá aprendi como se escreve procedimentos de consulta e audição no Parlamento federal ou como coordenar projetos. Foi esse tipo de coisa. 

swissinfo.ch: E então você chegou ao posto de delegado para igualdade de portadores de deficiência da cidade de Berna? 

B.M.: Eu vi o edital para esse emprego no verão de 2010, fui selecionado e estou há pouco mais de um ano. Nem percebi que já comemoramos aniversário (risos).

swissinfo.ch: Qual era a intenção da cidade de Berna ao criar esse posto, algo inédito na Suíça? 

B.M.: Precisamos relativizar: talvez esse posto seja inédito na Suíça, mas na Europa já é um instrumento conhecido. Na Alemanha, por exemplo, quase todas as grandes cidades dispõem de um delegado para questões ligadas à igualdade de direitos para deficientes. Em minha opinião já estava na hora de existir algo assim na Suíça. Em Berna a iniciativa não veio dos políticos, mas sim das organizações de deficientes. Ao final, o parlamento municipal decidiu criar o posto de delegado.

swissinfo.ch: O que você já conseguiu alcançar nesses doze meses desde que assumiu o posto de delegado para igualdade de portadores de deficiência? 

B.M.: Já que outros departamentos não esperavam a criação, no início era necessário me apresentar e explicar as funções do posto. Depois uma das minhas principais tarefas era fornecer às diferentes unidades do governo as informações necessárias para sensibilizar as pessoas em relação às necessidades dos deficientes. Nossa mais-valia é permitir ao serviço público reconhecer preventivamente as necessidades desse grupo ainda na fase de planificação de projetos.

swissinfo.ch: Todos esses órgãos que você visitou desde então eram acessíveis a pessoas em cadeiras de rodas? 

B.M.: Não. Existem prédios em que você quase não consegue entrar ou que não entra de forma nenhuma. Mas nos últimos tempos a situação melhorou. É preciso reconhecer que Berna tem uma parte antiga, onde vários órgãos estão sediados. Nesses prédios as adaptações são mais complicadas. Mas à longo prazo isso deve ser remediado.

swissinfo.ch: Na prática o que mudou para deficientes na cidade de Berna? Quanto, por exemplo, são empregados pelo governo comunal (municipal)? 

B.M.: Não tenho números ainda. Talvez isso seja um objetivo: descobrir quantos deficientes trabalham para o governo e como fazer para aumentar o seu número. Eu já encontrei um ou outro.

swissinfo.ch: Mas pessoas como você, com formação universitária, poderiam executar sem problemas tarefas de escritório? Por que então o governo comunal de Berna não contrata mais deficientes? 

B.M.: A cidade poderia, sim, contratar mais, porém esse é um processo de seleção que ocorre publicamente. Se no passado as chefias tinham reservas em contratar deficientes por não conhecer os riscos, por exemplo, a nossa função é sensibilizá-las a saber que muitas dessas pessoas poderiam trabalhar. Talvez existam hoje muitas pessoas abertas a essa opção, mas que não sabem como encontrar os deficientes com as qualificações desejadas.

swissinfo.ch: E como você considera o sistema de quotas? Países como Brasil já selecionam funcionários públicos dessa forma… 

B.M.: Eu sou dividido em relação ao tema. Não temos quotas nem em nível federal, cantonal ou municipal. Em princípio não defendo esse sistema, mas considero positivo quando empregadores se comprometem a contratar mais deficientes.

swissinfo.ch: Na sua posição quais são alguns dos projetos concretos realizados em Berna? 

B.M.: Existem vários projetos individuais e simbólicos nessa questão de combater os obstáculos para deficientes. No setor de habitação, por exemplo, existem muito poucas moradias que são acessíveis a pessoas em cadeiras de rodas e, sobretudo, cujos aluguéis são acessíveis também ao bolso do deficiente. Novos apartamentos são construídos muitas vezes com facilidades para deficientes, mas estão voltados a um público de elevado nível de renda. Aposentados por invalidez ou pessoas que recebem ajuda social não têm chances.

swissinfo.ch: E o que o Estado pode fazer para diminuir o problema? 

B.M.: Existem várias possibilidades. Uma delas é na construção de moradias públicas (n.r.: a cidade de Berna é proprietária de centenas de moradias voltadas às populações mais desfavorecidas). Outra é a cessão de direitos de construção, que poderia obrigar o atendimento de determinados parâmetros.

swissinfo.ch: E no seu caso em particular, como foi possível encontrar um apartamento em Zurique, onde você vive? 

B.M.: Foi muito complicado. No meu caso precisei de um ano até encontrar uma residência. É um apartamento de térreo em um prédio que se encontra atualmente em reforma.

swissinfo.ch: Para atender as suas necessidades específicas? 

B.M.: Sim. As reformas já estavam planejadas, mas quando consegui o apartamento, os proprietários decidiram modificá-las para mim. Agora estamos negociando a amortização de uma parte dos custos através do governo. É que na Suíça, se uma pessoa em cadeira de rodas quiser alugar sua própria moradia e dispor de recursos ou salário suficientes para pagar seu aluguel, o Seguro Invalidez ajuda a pagar os custos das reformas.

Brian McGowan nasceu em 1979 em Zurique, de pai irlandês e mãe suíça.

Desde o nascimento sofre de uma doença neuromuscular, que o colocou em uma cadeira de rodas.

Estudou história e ciências da religião na Universidade de Zurique.

Seu primeiro trabalho foi o estágio de um ano na Secretaria Federal de Igualdade para Pessoas com Deficiências, Berna.

Há um ano é o delegado para igualdade de portadores de deficiência da cidade de Berna, um posto criado pelo parlamento comunal (municipal).

Brian McGowan vive em Zurique com sua parceira em um apartamento alugado.

Seu hobby preferido: viajar. Já esteve em países como EUA, Índia, Japão, Indonésie e quase toda a Europa.

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