Influente blogueiro da extrema-direita tenta se naturalizar suíço
O escritor norte-americano Vox Day, criador do termo "sigma male", vive há 20 anos na Suíça, onde opera uma editora e divulga teorias conspiratórias e racistas a partir de um vilarejo. Agora, tenta obter cidadania suíça e expandir sua influência a partir da Europa.
O jornal Wall Street Journal já chamou Vox Day de “o homem mais odiado da ficção científica”. Pesquisadores o classificam como “supremacista branco”. Ele rejeita essa definição e se define como um nacionalista cristão.
“Se quiserem me criticar, que seja por eu rejeitar o Iluminismo”, diz Vox Day. Há 200 anos, o Iluminismo soava bem. “Não sabíamos para onde o livre comércio e a democracia nos levariam.” Hoje, o “Ocidente coletivo” estaria à beira do abismo, e é por isso que o restante do mundo rejeita os valores iluministas – porque querem “sobreviver” e “prosperar”.
Perspectiva racista: “Selvagens com QI baixo”
Ele diz isso dentro de uma casa ainda em construção, situada em uma zona industrial na periferia de Cressier, vilarejo no cantão de Friburgo. No imóvel semimobiliado, Vox Day montou uma academia e instalou máquinas para sua pequena manufatura de encadernação em couro.
A razão pela qual a Swissinfo se ocupa de Day é seu alcance: segundo a SimilarwebLink externo (site de análise de tráfego na internet), o blog desse homem tem mais de meio milhão de acessos por mês – principalmente nos Estados Unidos, no Reino Unido, na Austrália e em Hong Kong.
Day usa uma linguagem dura e discriminatória. Recentemente, por exemplo, publicou o título “Ben Shapiro is cancer” (Ben Shapiro é um câncer) sobre o publicista judeu e conservador americano – por causa de sua posição pró-Israel.
Em outra artigo, de 2025, Day levantou a pergunta retórica de se políticas racistas talvez fossem uma “estratégia racional de contenção” para regular a convivência com uma “população visualmente distinta de selvagens com QI baixo”.
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Vox Day quer se tornar suíço
Vox Day atua a partir da Suíça. Ele vive no país desde 2005 – o mesmo ano em que publicou o artigo intitulado “Por que mulheres não conseguem pensarLink externo“.
No cantão onde reside, ele tem direito de voto como estrangeiro, mas ainda não é cidadão suíço, diz ele no seu domicílio gelado. Porém: “Passei nos testes de idioma necessários e tudo mais, e pretendo dar entrada no processo de naturalização.”
Ele valoriza a democracia direta, mas acha que a Suíça deveria se apoiar mais em si mesma – em vez de querer agradar à União Europeia.
O que é “Clown World”?
Um elemento recorrente em seu blog é a resistência ao chamado “Clown World” – uma teoria da conspiração segunda a qual forças satânicas estariam em ação, contra as quais Rússia e China estariam lutando.
Vox Day tem a maior parte de seus seguidores na plataforma Gab.com. Lá, cerca de 35 mil pessoas o seguem e, ali – onde apenas usuários registrados podem ler – ele se expressa de maneira ainda mais crua. Quando, na primavera de 2024, um usuário o acusou de evitar certas palavras em uma publicação sobre “Clown World”, Vox Day respondeu: “Eu não evito palavras, seu retardado. Os judeus pelos quais você é obcecado são instrumentos dos satanistas globais do Clown World, que por sua vez são apenas servos repugnantes do verdadeiro mal inumano.”
Com isso, ele descreve teorias conspiratórias antissemitas. Vox Day permanece sentado calmamente enquanto esse comentário lhe é lido em voz alta. E então responde: “Se você é cristão, acredita no sobrenatural.” Pessoas como “George Soros ou Hillary Clinton” seriam, segundo ele, apenas instrumentos.
O fato de a descrição de “Clown World” remeter aos antissemitas “Protocolos dos Sábios de Sião” é negado por Day: “Isso não tem nada a ver com os Protocolos. Tem a ver com a passagem bíblica em que Satanás oferece a Jesus todos os reinos do mundo.” Como Jesus não contestou que Satanás tivesse esse poder, é Satanás quem governa o mundo.
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Antissemitismo na Suíça
Declarações sobre a evolução darwinista
Com uma lógica semelhante de argumentação e um sentimento de superioridade intelectual, Vox Day responde a muitas perguntas na conversa. Day diz que não pode ser um “supremacista branco” – porque ele próprio, afirma, seria um indígena nativo dos EUA.
Ele não acredita na evolução darwinista. Seu principal argumento na conversa se baseia na ideia de que “biólogos não são particularmente bons em matemática”. Os filósofos do Iluminismo, segundo ele, “mal sabem do que estão falando”.
Embora rejeite simplesmente muitas descobertas científicas, ele, por outro lado, toma como absolutos certos estudos e análises duvidosas quando elas se encaixam em sua visão de mundo. Assim, segundo ele, mulheres “num sistema em que precisam escolher entre dois homens” não deveriam ter direito ao voto: “Elas votam de forma confiável no candidato mais alto e com o cabelo melhor. Há um estudo nos EUA sobre isso.” Day é frequentemente chamado de misógino – ele próprio não se vê nem assim, nem como racista.
Leituras no castelo de Vox Day
Ele diz sentir-se mais à vontade na “cultura negra” do que “praticamente qualquer pessoa na Suíça”. Seus “companheiros africanos” do time de futebol “não poderiam se importar menos” com o que ele escreve.
Há alguns anos, Day comprou o castelo no centro de Cressier. O jornal sensacionalista Blick estampou à época: “Americano transforma castelo suíço em bastião neonazista.” Alegadamente, ele pretendia usar o castelo “exclusivamente para seus seguidores”. Até agora, isso não aconteceu.
A prefeitura de Cressier parece pouco se importar com o que o dono do castelo escreve: mais recentemente, em meados de novembro de 2025, a biblioteca municipal organizou para o público local uma Noite de Histórias BilínguesLink externo no castelo de Vox Day.
Patrocinador de clube de futebol
A partir do imóvel ainda inacabado, ele administra sua editora Castalia e o selo de quadrinhos “Arkhaven Comics”. Durante a conversa, um funcionário seu trabalha no porão encadernando em couro blocos de livros impressos externamente e queimando os desenhos a laser.
O couro, ele importa. Em um dos cômodos, há caixas cheias de couro com a inscrição “Made in Korea”. Segundo Day, eles encadernam em couro 1.500 livros por mês ali. No próximo ano, precisarão multiplicar essa produção por dez, devido à grande demanda.
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Antissemitismo: cada vez mais judeus pensam em emigrar
Na “Castalia Library” saem clássicos da literatura mundial, mas também novas publicações. Não é possível verificar de forma independente quantos livros são vendidos. A pessoa por trás do pseudônimo Vox Day, no entanto, ao que tudo indica, tem muito dinheiro. Sua editora também patrocina o clube de futebolLink externo britânico Dorking Wanderers F.C.
De família abastada, Day celebrou-seLink externo com música eletrônica no início dos anos 1990, depois desenvolveu jogos. Durante um período, foi principalmente escritor.
Mas os cientistas dos EUA que estudam Vox Day não o fazem por seu valor cultural, e sim pelas controvérsias das quais ele participou.
Participação em campanhas reacionárias
O estudioso em comunicação Max Dosser, da Universidade Vanderbilt, chama Day de “supremacista branco”. Entre outros motivos, porque Vox Day publicou em 2016 uma “filosofia central da Alternative Right”, na qual, como 14º ponto do programa, ele lista que a “Alt Right acredita que precisamos assegurar a existência dos povos brancos e um futuro para crianças brancas”. Trata-se de uma variação leve do código extremista conhecido como Fourteen WordsLink externo.
Em sua tese de doutorado “Nostalgic Futures” (Futuros Nostálgicos), Dosser analisou como ódio e indignação impulsionam dinâmicas de fãs reacionários na internet. Um dos exemplos foi o chamado “Puppygate” – uma campanha online na qual Vox Day desempenhou um papel central.
Fãs reacionários tentaram, em meados dos anos 2010, tomar conta dos Hugo Awards de ficção científica com uma lista própria, politicamente alinhada a eles. “Superficialmente, tratava-se de premiar literatura mais ‘popular’ ou preservar uma ideia nostálgica do que o gênero um dia fora”, diz Dosser.
À primeira vista, isso parece inofensivo. Mas as visões de mundo por trás disso muitas vezes não são. Controvérsias online desse tipo envenenariam o debate público.
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Visto de hoje, campanhas como o “Puppygate” foram o início de uma indignação politizada na internet. Dosser observa que tais controvérsias agora acontecem o tempo todo e não mais apenas à margem da sociedade. E, “como personalidades como Donald Trump, Elon Musk e incontáveis outras, com alcance internacional, difundem essas opiniões e ideologias, há cada vez menos motivo para escondê-las.”
O estudioso de literatura Jordan S. Carroll também analisou Vox Day em “Speculative WhitenessLink externo: Science Fiction & the Alt-Right” (Branquitude Especulativa: Ficção Científica e a Direita Alternativa) Carroll disse à Swissinfo que a participação de Day no “Puppygate” foi um ato de vingança: “Aquilo foi uma tentativa de Vox de se vingar da comunidade de ficção científica, que o havia excluído depois de uma série de declarações racistas.” No fim, a comunidade de ficção científica mainstream se distanciou claramente dele.
Criador do “Sigma Male”
Na avaliação de Carroll, um dia Vox Day não será lembrado como editor ou artista, mas “se tanto”, como blogueiro e como o responsável pelo termo masculinista “Sigma”.
O termo “Sigma Male” foi criado e cunhado por Vox Day em 2010. Esse conceito de masculinidade se espalhou nas redes sociais, como o TikTok, “entre meninos de 12 anos da Geração Z que nunca tinham ouvido falar de Vox Day”, escreve Carroll.
Uma das raízes do culto global à masculinidade – em torno de figuras como Andrew Tate e Joe Rogan – provavelmente está num computador na Suíça Ocidental, quinze anos atrás.
Edição: Giannis Mavris
Adaptação: Karleno Bocarro
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