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2011 teve número recorde de iniciativas populares

A coleta de assinaturas é obrigatória para levar uma iniciativa ao voto popular. Keystone

O sistema de democracia direta está mais atrativo do que nunca na Suíça. Só em 2011 foram 23 iniciativas populares, um número recorde.

A iniciativa popular é um componente central no sistema político helvético. É uma maneira de permitir que qualquer cidadão possa propor novas leis, embora na prática seja um instrumento utilizado por partidos políticos e grupos de interesses.

De acordo com a Constituição, o soberano na Suíça não é o governo nem o Parlamento, mas o povo. Qualquer alteração constitucional tem de ser votada pelo povo.

Para que uma iniciativa popular seja levada ao plebiscito em nível federal, seus apoiadores precisam recolher pelo menos 100 mil assinaturas de cidadãos com direito de voto no espaço de tempo de 18 meses.

Seis delas lançadas em 2010 ainda estão ativas, pois os grupos que as lançaram ainda estão tentando recolher o número necessário de assinaturas antes que o prazo legal se expire.

Em teoria, uma iniciativa só pode tratar de questões constitucionais. Mas na prática, elas estão sendo utilizadas cada vez mais para marcar a agenda política – e se tornando também cada vez mais frequentes.

Andreas Auer, diretor do Centro para Democracia Direta, com sede na cidade de Aarau (centro) explicou à swissinfo.ch no início do ano que uma razão para o interesse crescente do instrumento era “a radicalização do discurso político”, particularmente entre os dois extremos do espectro político, à direita e à esquerda.

Aline Trede, do Partido Verde, explicou que o simples fato de apresentar uma iniciativa leva as pessoas a discutir questões políticas e que, ao final, pode levar o governo ou o Parlamento a dar respostas concretas, mesmo se a própria iniciativa falhar.

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O número recorde de iniciativas em 2011 pode ser explicado, em parte, pelo fato do ano ser marcado por eleições: afinal, as iniciativas marcam o perfil dos partidos e permitem que eles divulguem suas plataformas políticas. 

Muitas delas estavam focadas em uma de três diferentes áreas: política social, energética e de imigração.

E vários eventos forçaram algumas questões à consciência pública, especialmente o desastre nuclear com a usina de Fukushima, no Japão, que aumentou a preocupação geral em relação à política energética na Suíça, sem falar também da atual crise econômica.

Duas iniciativas populares bastante semelhantes e pedindo o banimento da energia nuclear saíram das raias do Partido Verde e de um comitê intitulado “Centrais nucleares precisam ser desligadas”.

Das outras iniciativas ambientais, destacaram-se uma originada do Partido Socialista intitulada “Iniciativa pelas Tecnologias Limpas”, que prevê a criação de mais empregos graças ao uso de energias renováveis, e uma dos Verdes Liberais, que propõe criar uma taxa sobre o consumo de energia para substituir o imposto sobre circulação de mercadorias.

Situação econômica 

A situação econômica incentivou o lançamento de iniciativas durante  o ano.

O Partido Socialista se uniu aos sindicatos para defender introduzir um salário mínimo que poderia garantir que qualquer pessoa com um emprego a tempo integral ganhe o suficiente para viver. Não existe salário mínimo na Suíça. Os salários são determinados em convenções coletivas setorias.

Com ajuda dos Verdes e de várias organizações, o PS já conseguiu coletar um número suficiente de assinaturas para colocar em plebiscito uma grande reforma do sistema de seguro de saúde.

O Partido Democrata Cristão lançou duas iniciativas. Uma propõe redução fiscal para as famílias. Outra foi apoiada pelos partidos de centro-esquerda, cristãos e outros grupos,  e pede alta de impostos para grandes heranças a fim de aumentar o caixa da previdência social.

Imigração 

Frear a imigração é o tema de uma série de iniciativas. A mais conhecida – especialmente pelo fato da campanha exibir um cartaz onipresente em todo o país, com um par de pés marchando firmes sobre a bandeira suíça – é uma proposta do Partido do Povo Suíço (SVP, na sigla em alemão – partido majoritário de tendência nacional conservadora) sob o título “Contra a imigração em massa”.

Outra iniciativa, lançada por um comitê especialmente formado com esse intuito e intitulada “Pela estabilização da população em geral”, pede que o governo assegure que o número de estrangeiros se estabelecendo na Suíça não exceda o número daqueles que abandonam o país.

Fora a imigração, houve também iniciativas lançadas por comitês e organizações distintas, que abrangeram temas diversos como a abolição das taxas de rádio e TV até incentivos fiscais para os eleitores que votam ou a proteção de animais grandes predadores.

Barreiras para plebiscito 

Nem todas as iniciativas populares que são lançadas chegam finalmente às urnas. Muitas delas não conseguem recolher o número exigido de assinaturas e outras são refutadas por várias razões.

Daquelas que chegam a ser votadas em plebiscito, a grande maioria é rejeitada pelo eleitor: em geral, a taxa de sucesso é de pouco mais de dez por cento.

No entanto, os números mostram o aumento da popularidade do instrumento da iniciativa nas duas últimas décadas. No primeiro século de existência – de 1891 a 1990 – nove foram aprovadas nas urnas, o que corresponde ao mesmo número apenas no período entre 1991 a 2010.

Algumas das iniciativas mais recentes levantaram problemas jurídicos que ainda não foram resolvidos. O que ocorre se elas não são compatíveis com acordos internacionais que a Suíça assinou no passado?

Atualmente, a única justificativa para a anulação de uma iniciativa antes do plebiscito é se ela viola “normas imperativas”, ou seja, normas que são obrigatórias perante as leis internacionais. Elas incluem temas como a crime contra a humanidade, genocídio, escravidão e tortura. Mas outros aspectos das leis internacionais como os tratados internacionais não são cobertas por essa regra.

A iniciativa para combater a imigração em massa, por exemplo, ainda tem mais de um ano para recolher assinaturas. Se aprovada, ela violaria acordos bilaterais entre a Suíça e a União Europeia, além de poder provocar a rescisão por esta do pacote de acordos bilaterais, que incluem uma série de outros itens.

As dificuldades legais já afetam a implementação da iniciativa para expulsão automática dos estrangeiros criminosos, aprovada nas urnas em novembro de 2010. O fracasso de uma comissão de especialistas criada pelo Ministério da Justiça em encontrar uma solução ao problema de sua implementação levou o SVP a anunciar que pretende lançar uma segunda iniciativa sobre a mesma questão em janeiro de 2012.

Qualquer cidadão ou organização suíça pode lançar uma iniciativa popular (proposta de mudança constitucional), mas é necessário um longo período até que esta se transforme em plebiscito.

A condição: seus organizadores e apoiadores devem entregar na Chancelaria Federal pelo menos 100 mil assinaturas, coletadas em 18 meses. Então a proposta pode ser colocada em plebiscito a nível federal.

O Conselho Federal (corpo de sete ministros que governa a Suíça) deve então discutir a iniciativa no prazo de um ano  para apresentar um texto ao Parlamento.

O Parlamento discute a proposta da iniciativa e recomenda aos eleitores e cantões se a ela deve ser aceita ou refutada.

Para se tornar emenda constitucional, uma iniciativa popular precisa obter dupla maioria: dos votos, assim como a aprovação na maioria dos 26 cantões.

  

O sistema suíço de democracia direta faz uma distinção entre iniciativa e referendo.

Os referendos são utilizados para colocar em questão as leis que já foram aprovadas no Parlamento.

Qualquer cidadão que deseje lançar um referendo precisa coletar pelo menos 50 mil assinaturas no prazo de 100 dias depois da aprovação da lei no Parlamento.

Ao contrário das iniciativas populares, um referendo necessita apenas a maioria dos votos dos eleitores.

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