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Crise favorece negócios da máfia

As atividades da máfia na Suíça podem aumentar devido à crise financeira.

A máfia mostra uma impressionante saúde financeira na crise econômica. O procurador antimáfia da Itália, Agostino Abate, vê essa organização global como um perigo para a Suíça.

“Quando a obtenção de créditos por meios legais se torna difícil, aumenta a periculosidade da máfia”, disse Abate, em entrevista à swissinfo. Segundo ele, combater a máfia significa defender a democracia.

As quatro grandes organizações mafiosas italianas – Camorra, Cosa Nostra, a N’drangheta e Sacra Corona Unita – estão há muito tempo no foco da polícia helvética por envolvimento com tráfico de drogas, prostituição, lavagem de dinheiro e roubos.

Até agora as autoridades vão vêem riscos de que elas possam se infiltrar na política e na economia. Mas isso pode mudar. Na opinião do procurador italiano Agostino Abate, a máfia pode aproveitar a crise financeira para ampliar seus negócios na Suíça.

swissinfo: Por que a Suíça é interessante para a máfia?

Agostino Abate: A Suíça sempre desempenhou um papel importante. Primeiro, porque ela permite ao crime organizado estabelecer contatos mundiais – protegida contra as autoridades italianas. Segundo, porque aqui ele pode lavar seus capitais e escondê-los novamente.

Lamentavelmente, a atratividade da Suíça aumentou nos últimos anos. Alguns clãs autônomos a usam hoje para fundar e desenvolver suas atividades.

A máfia tem de estar presente aqui para criar condições favoráveis à sua atividade, para que ela possa se adaptar no meio social e infiltrar a economia.

Isso começa com investimentos em firmas legais de terceiros. Com isso, dinheiro do tráfico de drogas e da prostituição é legalizado. Isso não são suposições. Em relação à Suíça eu falo de fatos.

O senhor se referiu à lavagem de dinheiro. Mas também em outros países é possível investir dinheiro ganho criminosamente, sem falar das possibilidades oferecidas pela internet.

É preciso admitir que a Suíça perdeu um pouco da sua atratividade desde que entraram em vigor as regras de combate à lavagem de dinheiro e as novas estruturas das autoridades federais de Justiça.

A Suíça não é mais apenas o pequeno paraíso bancário e uma garantia de impunidade, como ela foi durante muito tempo aos olhos das organizações mafiosas.

Os paraísos e países offshore, como Luxemburgo e Grã-Bretanha, hoje atraem a maior parte do capital do crime organizado, e isso em proporções que nem quero mencionar aqui. A internet serve principalmente à transferência do dinheiro.

Apesar de tudo, muito freqüentemente, o dinheiro da máfia ainda tem de atravessar a fronteira fisicamente. Isso pode acontecer numa mala ou no fundo duplo de um porta-malas. Porque a Suíça continua sendo o principal destino para esse tipo de transferências.

O senhor quer dizer com isso que a Suíça não está suficientemente alerta?

Não, estou satisfeito com o trabalho dos colegas da Procuradoria Geral da República em Berna. Mas não se deve ter a ilusão e acreditar que a presença da máfia se restrinja ao dinheiro que ela movimenta de forma encoberta na praça financeira do Ticino e, sobetrudo, de Zurique.

É preciso observar com muita atenção os sinais dessa presença e movimentação. Penso na fase decisiva em que a organização estabelece contatos com pessoas e organizações até agora íntegras, que ela escolhe para a sua atividade. Repito: há sinais de que isso está ocorrendo e isso preciso ser descoberto.

O senhor pode dar um exemplo disso?

Após o assassinato a tiros (de seis homens) em Duisburg, na Alemanha, pôde-se ler e ouvir em todo lugar: “Isso foi um acerto de contas entre clãs italianos no exterior”.

Isso é totalmente falso. Esse episódio violento mostrou que a organizações realmente se aninhou lá e se desenvolve onde não se espera.

Essa é a realidade. Quem não quiser ver isso, enfia a cabeça na areia. Não estamos em Hollywood. Não se pode comparar os mafiosos com cidadãos normais, como é mostrado no filme Borsalino. Repito: precisa-se aprender a ler determinados sinais.

A ONG italiana SOS Impresa criticou recentemente os enormes “faturamentos” das diferentes ramificações da máfia. Isso pode ser mais um perigo para a Suíça?

É preciso ter atenção dobrada nessa época de crise econômica. Quando pessoas em situação difícil têm dificuldades para obter um financiamento, porque devido à crise dos mercados financeiros faltam recursos, esse perigo realmente é maior.

Quem pode exercer poder econômico sobre alguém, pode induzir essa pessoa a atos ilegais. E, depois que isso ocorreu, praticamente não há volta. Mas a existência dessas pessoas ou desse grupos é um fator extremamente desestabilizador.

A Suíça ainda pode reagir a esse perigo. Mas é preciso fazer isso antes que seja tarde. Porque a luta contra o crime organizado é uma proteção à democracia.

swissinfo, Nicole della Pietra

Nasceu em 1957.

Desde 1992, vice-procurador-geral da República, em Varese, Lombardia.

Abate é especialista no combate à corrupção e à máfia.

Ele atuou junto com a Procuradoria Geral da República da Suíça em várias investigações, entre elas, contra a lavagem de dinheiro do tráfico de drogas.

Muitos de seus processos atingem a Suíça, por exemplo, o chamado Ticinogate e o escândalo envolvendo o advogado Francesco Moretti, de Lugano, que teria lavado dinheiro para o chefe da N’drangheta no Ticino.

Também é chamado de “Antonio Di Pietro von Varese”, numa referência ao ex-procurador e hoje senador Antonio Di Pietro, que se tornou famosos por sua luta contra a corrupção e a máfia.

De acordo com dados publicados no início de novembro pela entidade empresarial Confesercenti, o crime organizado fatura 130 bilhões de euros por ano na Itália (7% do PIB do país), com um lucro anual de 70 bilhões de euros.

Somente com chantagens e agiotagens, a organização arrecadaria 250 milhões de euros por ano. Cento e oitenta mil comerciantes já teriam caído na teia da máfia.

A máfia também estaria ganhando cada vez mais dinheiro com produtos pirateados, loterias e construções ilegais.

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