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Revolta dos Indignados chega à Suíça

Jovens espanhóis ocuparam durante semanas a Praça Puerta del Sol em Madri exigindo uma democracia de verdade. Keystone

Neste sábado, 15 de outubro, milhares de pessoas em todo o mundo - inclusive na Suíça - sairão às ruas para protestar contra o poder das elites.

swissinfo.ch falou com o antropólogo Fabrizio Sabelli, um fervoroso defensor do Movimento dos Indignados, para descobrir porque tantas pessoas estão se manifestando e se isto pode mudar alguma coisa.

Já houve protestos populares na Espanha, Grécia e Israel. Nos Estados Unidos, o movimento “Occupy Wall Street” se espalhou de Nova Iorque a todo o país.

No sábado, haverá manifestações contra o poder corporativo em mais de 400 cidades do mundo, incluindo Genebra, Basileia e Zurique, na Suíça.

Sabelli, um italiano que lecionou por muitos anos nas universidades de Neuchâtel e Lugano, assim como no Instituto de Pós-Graduação de Estudos Internacionais e Desenvolvimento de Genebra, estará participando em Roma.

swissinfo.ch: Centenas de milhares de jovens estão manifestando no mundo inteiro. Por quê?

Fabrizio Sabelli: Olhando além das questões locais, o que está realmente impulsionando os jovens é o simples desejo de maior justiça social. Um desejo de mudança paira no ar há vários anos, mas foi só nos últimos meses que houve realmente um despertar coletivo e que a indignação tem sido verbalizada.

Em 2008, durante a primeira crise financeira, as pessoas pensavam que a ordem econômica mundial podia estar mudando. Mas no final, pouco ou nada mudou, as injustiças e a exploração social só aumentaram. A indignação aumentou quando as pessoas redescobriram a necessidade de uma economia real e alguns problemas específicos, tais como desemprego ou falta de habitação, tornaram-se mais graves.

Na Europa e nos EUA, a raiva transbordou quando os jovens perceberam que os bilhões de euros usados para socorrer os bancos com problemas vinham de orçamentos estatais e, portanto, dos bolsos dos próprios cidadãos. Enquanto isso, a ajuda social foi sendo cortada até o osso.

swissinfo.ch: Os jovens querem mais poder para o povo e menos para a economia. Estamos testemunhando uma forma moderna da guerra de classes?

FS: Neste caso, eu não chamaria isso de uma guerra de classes, mas de contradições internas do capitalismo, para usar uma terminologia marxista. O capitalismo está morrendo por causa de suas inconsistências próprias, porque não pode resolver os problemas que ele própria criou.

Esses protestos podem realmente acelerar o declínio do capitalismo, mas eles não têm poder suficiente para pôr em causa o atual sistema econômico inteiro. O sistema é autodestrutivo, porque se tornou um enorme cassino, onde as pessoas apostam em vez de produzir.

swissinfo.ch: O sistema político também está na mira, com manifestações contra a corrupção, o clientelismo e a incapacidade de responder às necessidades reais das pessoas. Existe algo de podre nas atuais democracias?

FS: O aparelho político não está mais respondendo ao mandato que lhe foi dado pelo voto democrático, ao contrário, tornou-se autônomo, cuidando de seus próprios interesses e de grupos poderosos. Veja o que acontece nos EUA com os lobbies políticos no Congresso, ou na Itália, onde o controle da mídia e da publicidade permitiu que o Berlusconi chegasse ao poder com apenas 25-26 por cento de aprovação. Isso é um absurdo para um país democrático.

As decisões já não são tomadas em função do programa político, elas dependem em vez disso, de mecanismos de poder bastante semelhante aos da máfia. Grupos de pressão, ao invés de pessoas, determinam as decisões, protegendo assim os interesses das partes mais fortes. É a sujeição política à economia e aos lobbies dos poderosos que está realmente decepcionando os jovens.

swissinfo.ch: Os Indignados não têm um líder ou cores políticas. Será que eles podem transformar suas emoções em uma ação política concreta? De que forma?

FS: A maioria dos analistas vê a falta de liderança e identificação com um partido político tradicional como um ponto fraco nesses movimentos de protesto. Mas eu estou convencido de que isto representa a sua força e originalidade. No momento, você tem que denunciar o sistema e suas contradições. Você tem que empurrar as pessoas para um despertar coletivo e as instituições políticas para a renovação. O tempo para programas, burocracia e chefes virá mais tarde.

O movimento ainda está desarticulado, mas também é coerente. É mais uma pressão popular do que uma organização popular. Não é uma guerra entre velhos partidos e movimentos novos, mesmo se, no futuro, terá que ter um líder para orientar esses jovens. Mas ainda há tempo para isso.

swissinfo.ch: Os Indignados estarão em breve na Suíça. Que papel o movimento pode desempenhar aqui?

FS: A Suíça ainda é uma pequena ilha feliz em relação a outros países. Mas isso também pode significar que os movimentos protestativos podem ter um impacto forte e sacudir essa aparência de calma. No entanto, as razões para o protesto não são tão fortes porque há mais riqueza e justiça social na Suíça.

No entanto, tem havido um crescente descontentamento nos últimos anos no país por causa da pressão que o setor financeiro continua exercendo sobre a política. É assim que a Suíça pode se juntar ao movimento Indignados, especialmente o dos EUA. Mesmo na Suíça, a política está nas mãos do setor financeiro, que decide como a riqueza é movida de um lugar para outro e, portanto, indiretamente, do bem-estar das pessoas ou de seu sofrimento.

15 de maio de 2011: Cerca de 20 mil pessoas manifestaram em várias cidades espanholas. Isso deu origem ao movimento 15-M ou “Indignados”.

As manifestações se espalharam até Berlim, Bruxelas, Londres, Paris, Atenas e Tel-Aviv, onde centenas e milhares de jovens saíram às ruas pedindo mais democracia e um futuro melhor.

No final de setembro, os protestos chegaram aos EUA. Um grupo de jovens ocuparam o Parque Zuccotti perto de Wall Street. O slogan deles: “nós somos os 99%”. As manifestações se espalharam para todas as principais cidades do país.

Os jovens Indignados não fazem parte de nenhum movimento político tradicional. Mas as reivindicações deles são apoiadas por vários partidos de esquerda, intelectuais, políticos e economistas – incluindo o ex-Nobel de Economia e o ex-economista do Banco Mundial, Joseph Stiglitz e Paul Krugman.

15 de outubro de 2011: os protestos se tornam mundiais, incluindo cidades como Zurique, Basileia e Genebra, na Suíça. Os organizadores suíços dos protestos dizem que estão reivindicando um sistema financeiro transparente e que os bancos interfiram menos na sociedade.

Fabrizio Sabelli nasceu em Roma, é advogado, antropólogo, escritor e promotor de atividades culturais.

Lecionou por muitos anos na Suíça, no atual Instituto de Pós-Graduação em Estudos Internacionais e Desenvolvimento de Genebra, e nas universidades de Lugano e de Neuchâtel.

É um especialista em desenvolvimento social e econômico, antropologia da comunicação e sociologia do trabalho. Morou vários anos em Genebra.

Sabelli já publicou vários livros durante sua carreira, incluindo “Faith And Credit: The World Bank’s Secular Empire” (1994, com Susan George), traduzido em oito idiomas.

Adaptação: Fernando Hirschy

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