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Como tarifas dos EUA afetam fabricantes de equipamentos médicos

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Um funcionário verifica uma lâmina de serra cirúrgica oscilante em um dos principais fabricantes de produtos para cirurgia óssea, a Gomina, no cantão do Valais. A Suíça possui uma alta densidade de empresas de equipamentos médicos. Keystone / Gaetan Bally

As canetas de insulina e os implantes ortopédicos fabricados na Suíça estão na mira das tensões comerciais globais. Os efeitos das tarifas sobre o setor ainda não estão claros. 

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Elas talvez não desenvolvam medicamentos de grande sucesso ou dominem as manchetes como as gigantes farmacêuticas Novartis e Roche, mas milhares de empresas de dispositivos médicos pouco conhecidas impulsionam discretamente o setor de saúde global a partir da Suíça. De parafusos para implantes ortopédicos a ferramentas de precisão para cirurgia, produzem dezenas de equipamentos médicos que são usados para diagnóstico, prevenção, monitoramento e tratamento.

“A Suíça tem uma estrutura trabalhista muito favorável que permite que as empresas realmente inovem, graças às universidades que sistematicamente se classificam entre as dez melhores do mundo e à presença de grandes entidades corporativas que têm escritórios de trabalho ou sedes no país”, diz Andrea Biasucci, CEO da Confinis, uma empresa de consultoria na área de dispositivos médicos. Em 2023, 1.400 empresas de equipamentos médicos estavam ativas na Suíça, mostrando uma densidade alta deste setor em um país pequeno, de acordo com o especialista.

No entanto, os fabricantes de dispositivos médicos na Suíça estão no escuro: sem clareza sobre quais serão os custos futuros de seus produtos, aguardam notícias sobre o tamanho real do aumento das tarifas sobre as exportações suíças para os EUA. Inicialmente, a Suíça estava sujeita a um imposto de importação de 31%, anunciado entre uma série de tarifas retaliatórias apresentadas pelo presidente dos EUA, Donald Trump, em 2 de abril. Uma semana depois, o presidente americano voltou atrás e suspendeu tarifas recíprocas consequentes para a Suíça e a UE, até 9 de julho.

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“É um momento assustador, porque a Suíça é cara e é um país pequeno, então você não pode escalar sua produção tanto quanto os concorrentes. Uma tarifa de 31% basicamente acabaria com as chances das empresas de vender para os EUA”, diz Biasucci.

Atualmente, as tarifas de 10% são aplicadas a produtos suíços e europeus que entram nos EUA e, embora sejam prejudiciais, ainda não são um grande problema, de acordo com o consultor. Mas com Trump mudando de ideia regularmente, inclusive ameaçando o bloco da UE com tarifas de 50% sobre todos os produtos, o futuro permanece incerto para o setor.

Uma cadeia de suprimentos “altamente complexa”

Embora a UE continue sendo o maior mercado da Suíça, 23% dos 500.000 dispositivos médicos fabricados no país são exportados para a América do Norte – principalmente para os EUA. Em 2024, a Suíça exportou CHF 2,8 bilhões (US$ 3,3 bilhões) em produtos médicos para os EUA. Uma tarifa de 31% custaria aos fabricantes, compradores ou clientes mais de CHF 800 milhões (US$ 950 milhões).

“É muito claro que, se tivermos tarifas, isso será basicamente um obstáculo para o livre comércio, porque alguém tem que pagar essa conta”, diz Daniel Delfosse, vice-diretor da Swiss Medtech, a associação industrial nacional que representa o setor de tecnologia médica da Suíça.

Além disso, os dispositivos médicos têm cadeias de valor altamente complexas e transfronteiriças, de acordo com a associação comercial MedTech Europe, que reflete as preocupações Link externodas associações americanas de dispositivos médicosLink externo em relação às tarifas.

Para uma bomba de infusão médica comum fabricada nos EUA, peças que vão de eletrônicos a resinas podem ser adquiridas de fornecedores em mais de 20 países, incluindo EUA, México, Costa Rica, Alemanha, China, Hungria, Índia e Itália, como aponta Link externoum artigo recente do Financial TimesLink externo. Na Europa, as peças para equipamentos médicos são obtidas de mais de 4.000 fabricantes em mais de 40 países.

“Podemos ser atingidos por tarifas não uma, mas várias vezes”, disse o diretor geral da Medtech Europe, Jesús Rueda Rodríguez, Link externoao Washington PostLink externo, destacando que as tarifas afetariam os fabricantes em todo o mundo.

Gigantes do setor e concorrentes na área de equipamentos de tomografia computadorizada, como a multinacional alemã Link externoSiemens Link externoHealthineersLink externo, a fabricante holandesa Link externoPhilippsLink externo e a gigante americana Link externoGE HealthCareLink externo, reduziram suas previsões para 2025 por causa das tarifas, de acordo com anúncios feitos em maio. 

Canetas de injeção

Um dispositivo médico que chamou bastante atenção no último ano foram as canetas de injeção, usadas todos os dias por milhões de pacientes para perda de peso, injeções de insulina e tratamentos de fertilidade. 

A Suíça se posicionou como líder na produção desses equipamentos, com 177 dos 612 fabricantes globais sediados no país. A Ypsomed, localizada no cantão (estado) de Solothurn e uma das líderes no campo de canetas de injeção, afirma que “não está sendo diretamente afetada pelas atuais movimentações tarifárias de importação dos EUA” porque vende suas canetas para empresas na Europa e na Ásia diretamente de suas fábricas na Suíça e na Alemanha. Apenas 10% dos produtos da empresa são exportados diretamente para clientes nos EUA.

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Os clientes da Ypsomed – que incluem empresas como a NovoNordisk, fabricante dos medicamentos para perda de peso e diabetes Ozempic e Wegovy – são responsáveis pelo controle da cadeia de suprimentos, incluindo o enchimento das canetas com o medicamento, de acordo com um porta-voz.

Em uma coletiva de imprensa sobre os resultados do primeiro trimestre da empresa, o vice-presidente executivo e diretor financeiro, Karsten Munk Knudsen, disse que as tarifas anunciadas recentemente não alteraram substancialmente suas perspectivas financeiras para 2025, mas uma “possível expansão” poderia ter um impacto negativo sobre a empresa e o setor. Ele não disse como a cadeia de suprimentos da empresa seria afetada.

Produção e isenções tarifárias

Especialistas consideram que a melhor maneira de evitar tarifas erráticas é transferir a produção para os EUA, mas a mudança precisa ser antecipada, como fizeram Link externoa SHL Medical, concorrente da YpsomedLink externo, e a Straumann, fabricante de implantes dentários. Com quatro unidades de produção na América do Norte, a empresa divulgou que está já se beneficiando de sua rede de produção global. “Uma grande parte de nossas soluções vendidas nos EUA já é produzida nos EUA”, disse um porta-voz da Straumann. Em 2005, a empresa inaugurou sua sede na América do Norte, abrindo o primeiro local de produção fora da Suíça, em Massachusetts.

Mas transferir a produção para os EUA não é viável para microempresas ou empresas menores de dispositivos médicos, que representam mais de 90% do setor suíço. “Se você não quiser mais produzir na Suíça, mas mudar para os Estados Unidos, não poderá mudar tão rapidamente”, diz Delfosse, referindo-se às aprovações da Food and Drug Administration (FDA) dos EUA necessárias para colocar um dispositivo no mercado. A liberação leva de quatro a seis meses, dependendo da complexidade do dispositivo.

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Embora a Straumann não tenha detalhado quanto tempo levou para abrir suas fábricas nos EUA, outras empresas europeias ativas em tecnologias médicas levaram de um ano a três anos para mudar ou abrir instalações de produção no país.

“Se você já tiver instalações de fabricação nos EUA, será mais rápido, mas a maioria das pequenas e médias empresas não têm essa possibilidade, então não é tão fácil dizer ‘OK, vamos transferir a produção para os EUA’.”

Outras empresas estão apostando no Protocolo de Nairóbi de 1976 para contornar as tarifas. Link externoEsse é o caso da SonovaLink externo, uma das mais importantes fabricantes de soluções para aparelhos auditivos, que produz seus dispositivos na China, no Vietnã e na Suíça. O acordo internacional concede tratamento isento de impostos para dispositivos para pessoas com deficiência, incluindo aparelhos audiovisuais, equipamentos de braile e dispositivos médicos especializados usados em ambientes educacionais. De acordo com o Link externoRegistro Federal dos EUALink externo e a Link externoagência de Alfândega e Proteção de FronteirasLink externo, esses equipamentos médicos continuam isentos de tarifas.

Uma mudança complicada de implementar

“Essas tarifas têm como objetivo criar empregos nos EUA e desestimular a produção em outros lugares, mas para um mercado altamente qualificado, como o mercado de dispositivos médicos de precisão da Suíça, pode ser complexo implementar isso”, diz Biasucci. Mesmo que sejam uma parte essencial da cadeia de suprimentos, os fabricantes que não conseguirem limitar o impacto das tarifas inevitavelmente terão que reduzir suas margens para manter os preços dos dispositivos inalterados, ou correrão o risco de repassar o aumento para os compradores ou pacientes.

Em uma tentativa de suavizar a postura dos EUA, a Suíça pretende abrir seu mercado interno para dispositivos médicos com aprovação da FDA. Atualmente, somente equipamentos em conformidade com as regulamentações europeias são vendidos no país alpino, o que significa que os dispositivos desenvolvidos e fabricados no país para serem exportados para os EUA não podem ser vendidos na Suíça. A mudança abriria um mercado doméstico para os produtos, frente às tarifas.

“Mas nossa meta número um no momento é que as tarifas sejam as mais baixas possíveis”, conclui Delfosse, da Medtech.

Edição:Virginie Mangin/fh

Adaptação: Clarissa Levy

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