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Quando pais viram raptores

Stefano Bianchi mostra a foto do Ruben, o seu filho raptado pela ex-esposa suíça. Keystone

Na Suíça ocorrem em média cinqüenta casos anuais de rapto de crianças pelos próprios pais, que desaparecem depois no exterior.

As autoridades judiciais explicam que na maioria dos casos são as mães que raptam seus filhos

De acordo com as autoridades helvéticas responsáveis pelo dossiê internacional de crianças raptadas pelos pais, em 2004 foram registrados 49 casos.

Muitos deles envolvem menores de idade que estão no meio de conflitos entre casais em separação, onde homens e mulheres vêm de diferentes países e culturas. Em 57% dos casos, a mãe foi a responsável pelo rapto.

– Quando um casamento está em crise, é geralmente a mulher que decide retornar ao seu país de origem. A razão está no fato dela temer as conseqüências de um processo de divórcio em outro país”, afirma Nicolette Rusca-Clerc, funcionária desse departamento especial no ministério da Justiça.

Baseada em Berna, essa instituição foi criada depois que a Suíça ratificou em 1994 a Convenção de Haia sobre os aspectos do rapto internacional de crianças, cujo principal objetivo é trazer esses menores de idade de volta aos seus países de origem. As autoridades em Berna não apenas aplicam a Convenção, assinada por 72 países, mas também atuam como intermediários com seus parceiros internacionais, oferecendo também mediação para as famílias afetadas.

Dois casos na Suíça

O desespero de mães em batalhas internacionais pela custódia dos filhos é exemplificado em dois recentes casos de rapto.

O primeiro ocorreu em 2001: Melissa, uma menina de nove anos e Jamie, seu irmão de sete, que foram raptados na Austrália pela mãe de nacionalidade suíça. As crianças foram levadas de volta para o país de origem em meados de janeiro. No momento elas estão sob os cuidados de uma família provisória até que a sentença judicial seja declarada. Maya Wood, a mãe, tem medo de ser presa por rapto se retornar ao país do ex-marido.

Outro caso famoso foi o de Ruben Bianchi, um garoto de cinco anos de idade. Ele foi raptado em 2002 na Itália pela sua mãe suíça, Lucille Hunkeler, uma ex-campeã de ciclismo.

No verão de 2004, ela desapareceu com Ruben e atualmente está sendo procurada pela polícia. O caso foi noticiado nas manchetes dos jornais em setembro do ano passado, desde que seu pai, o médico italiano Stefano Bianchi, que tem por lei a custódia sob Ruben, iniciou uma greve de fome em frente a embaixada da Suíça em Roma.

Protesto

Graças à atenção da mídia, o caso foi parar nas mãos do ministro da Justiça Christoph Blocher, que o discutiu com seu homólogo italiano Roberto Castelli durante o último encontro das duas autoridades. Blocher prometeu que iria tomar as providências necessárias para devolver o pequeno Ruben ao seu pai.

O ministro também anunciou que uma comissão de especialistas foi formada para averiguar como os direitos das crianças podem ser melhor protegidos, dentro do contexto da Convenção de Haia. Um relatório será publicado em novembro de 2005.

Porém, casos de crianças raptadas para a Suíça são muito mais raros do que o de meninos e meninas que são levados para fora do país, como explicam as autoridades.

Em 2004, foram registrado 37 casos de crianças raptadas para fora da Suíça, mas apenas 12 que foram trazidas para o país.

O destino mais freqüente pelos pais fugitivos é a Espanha, França e a Alemanha. Por outro lado, a maior parte dos pedidos de cooperação judicial com a Suíça vêm da Itália, Portugal e Alemanha.

Mais radical

No geral, o número total de raptos por ano continuou estável nos últimos anos, como explicam as autoridades em Berna. “Porém, as batalhas de custódia estão se tornado cada vez mais violentas e menos abertas ao compromisso”, ressalta David Urwyler, chefe do departamento responsável pelo tema.

Na maioria dos casos em 2004, as autoridades helvéticas utilizaram a Convenção de Haia para tentar resolver a situação. O único problema é que ela tem pouco poder quando as crianças são raptadas para países que não assinaram o tratado, como a Rússia e várias outras nações no Oriente Médio e na África.

Além das questões de rapto, as autoridades helvéticas também tratam da violação dos direitos internacionais de visitas entre casais separados. Em 2004, quinze deles foram registrados.

– Impedir que o ex-marido ou esposa vejam seus próprios filhos pode ser considerado uma espécie de rapto”, afirma Rusca-Clerc.

Tanto nos casos de rapto como conflitos no direito de visita, as autoridades tentam intermediar um trato amigável entre as duas partes.

Se isso não funciona, advogados são levados ao país e os responsáveis afetados recebem apoio jurídico das autoridades locais.

– Cortar a criança pela metade, como no julgamento bíblico de Salomão, não é possível”, lembra Rusca-Clerc.

swissinfo, Isobel Leybold-Johnson
traduzido por Alexander Thoele

Casos de rapto ocorridos em 2004:
64 casos – 49 de rapto de crianças e 15 de violação dos direitos de visita.
37 casos de rapto para fora da Suíça; 12 de rapto para a Suíça.

A Convenção de Haia, assinada em 1980, tem o objetivo de garantir o retorno imediato das crianças aos seus países de origem, quando elas são removidas ou mantidas num local indevidamente. As regras são aplicadas nos países signatários.

O tratado assegura que os direitos de custódia e acesso de um país signatário seja reconhecido nos outros países que fazem parte do acordo.

No total, o acordo tem 72 países signatários: a grande maioria dos europeus, da América do Norte e do Sul, Austrália e alguns países africanos.

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