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A angústia de mulheres com câncer de mama, ‘esquecidas’ pelo sistema de saúde na Andaluzia

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Anabel Cano é uma das centenas de mulheres que desenvolveram câncer de mama durante meses sem saber, devido à falta de acompanhamento de uma mamografia realizada na região espanhola da Andaluzia, onde as autoridades estão sendo criticadas. 

“Eu fui operada quase um ano depois, se tivessem feito isso um ano antes (…) talvez não estivesse como agora”, afirma esta ex-empregada doméstica de 52 anos, que teve que se submeter a uma mastectomia e agora tem apenas um seio. 

Em novembro de 2023, ela fez uma mamografia de rastreamento e lhe disseram que, se não fosse chamada em 15 dias, estaria tudo em ordem. 

Todas as mulheres entrevistadas pela AFP nesta reportagem afirmam que ouviram esta frase. 

Os meses se passaram sem notícias. Um ano depois, chamaram Anabel para um novo controle que detectou o câncer. 

Ela foi a primeira vítima das falhas a apresentar uma denúncia contra o Sistema de Saúde da Andaluzia (SAS), já que na Espanha, país muito descentralizado, a saúde é uma competência das regiões.

– 230 casos de câncer –

O escândalo foi revelado em setembro pela ‘Amama Andaluzia’, uma associação de mulheres com câncer de mama, após meses coletando alertas de suas assistidas. 

Sua presidente, Ángela Claverol, conta que até agora receberam notificações de cerca de 4.000 mulheres preocupadas por não terem sido contatadas após realizarem mamografias. 

Alguns exames revelaram anomalias que exigiam acompanhamento nas semanas seguintes. Entre os casos, pelo menos 230 mulheres desenvolveram câncer, e três morreram, segundo o último levantamento, ainda provisório, do advogado da associação, Manuel Jiménez. 

Apesar de inicialmente referir-se a três ou quatro casos, o governo regional andaluz de direita, alvo de protestos em frente ao Parlamento regional e diante de hospitais, calcula agora que pode haver 2.317 mulheres afetadas pela falta de acompanhamento. 

As autoridades locais asseguram à AFP, no entanto, que não estão cientes de nenhum caso de câncer ou morte. 

O primeiro-ministro, o socialista Pedro Sánchez, criticou o Executivo regional, acusando-o de ser responsável por um “processo de privatização” da saúde que levou à precariedade dos serviços. 

“Antes bastava uma ligação, uma ligação breve, rotineira para evitar um sofrimento imenso a muitas pessoas. Mas essa ligação nunca chegou, e o mais grave é que ainda se desconhece o motivo”, indicou Sánchez recentemente no Congresso dos Deputados. 

Se a doença “tivesse sido diagnosticada a tempo, tudo o que eu teria evitado (…) Nesta doença, o tempo conta”, afirma Amparo Pérez, uma ex-cabeleireira de 56 anos. 

Após realizar os exames em junho de 2023, meses se passaram até ela saber que deveria fazer exames complementares. Ela precisou se submeter a uma dupla mastectomia em fevereiro de 2024. 

– Sistema “muito burocratizado” –

Na sede da Amama, em Sevilha, um mural incentiva o autoexame e folhetos oferecem aulas de flamenco para amenizar os efeitos colaterais da quimioterapia. 

Sua presidente, Ángela Claverol, lamenta a “omissão, o descaso e a incompetência” para explicar as falhas. Consequências de um sistema “muito burocratizado”, sugere Rafael Ojeda, presidente do sindicato de médicos SMA. 

O Ministério Público da Andaluzia investiga possíveis “deficiências na prestação” de serviços de saúde. 

O governo regional anunciou um plano de emergência de 12 milhões de euros (cerca de 74,69 milhões de reais), prometendo contratações adicionais, e vários responsáveis foram obrigados a renunciar. 

A indignação, no entanto, está longe de se dissipar e pode custar caro aos dirigentes locais, a poucos meses de eleições regionais cruciais na Espanha.

mig/mdm/rs/du/pc/jc/fp

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