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Esquerda uruguaia e o desafio de reconquistar eleitores para enfrentar oposição

O candidato à presidência do Uruguai pela Frente Ampla, Daniel Martínez, num discurso a simpatizantes em Montevidéu após a divulgação dos resultados do primeiro turno 27 de outubro de 2019 afp_tickers

A Frente Ampla, a força de esquerda que governa o Uruguai desde 2005, precisa reconquistar eleitores desencantados se pretende lutar pelo governo contra uma coalizão de oposição no segundo turno de 24 de novembro, segundo analistas.

“A força (política) mais importante do Uruguai se chama Frente Ampla”, afirmou o candidato governista Daniel Martínez na noite de domingo, que concorrerá com o ex-senador Luis Lacalle Pou pela presidência em novembro, para simpatizantes após a divulgação dos resultados da votação de domingo.

Com 39,2% dos votos, a Frente Ampla deverá enfrentar uma coalizão que Lacalle Pou, que obteve 28,6% dos votos, negocia com o Partido Colorado (liberal, 12,3%) e o Cabildo Abierto (direita, 10,9%).

Com o apoio de partidos menores, Lacalle Pou trabalha para estruturar seu projeto de coalizão para promover a alternância de poder após 15 anos de governos da Frente Ampla, que representa uma coalizão de grupos de esquerda que funciona como um partido político que se define como “maioria isolada” no Parlamento após as eleições que acabaram com a maioria absoluta no Congresso.

“Estava latente uma alternância”, disse Lacalle Pou em um discurso que encerrou a noite das eleições. “Aquele que chega a destruir, o que chega a desunir, não será capaz de construir”, declarou, referindo-se à falta de parceiros visíveis para o governo em uma potencial busca de alianças com partidos da oposição.

– Pelos votos perdidos –

Para o cientista político Eduardo Bottinelli, não há duas leituras possíveis: o “primeiro desafio (do governo) é atrair o eleitor que já votou na Frente Ampla e que não votou agora”.

Deve “recapturar aqueles ou qualquer outro eleitor da oposição”, seja dos grandes partidos ou dos partidos menores, destaca Bottinelli numa referência à queda de oito pontos percentuais na quantidade de votos obtidos pela Frente Ampla nestas eleições em relação a 2014.

Para atingir esse objetivo, Martínez “tem que mudar já, tem que buscar um discurso propositivo claro e também buscar uma identificação das pessoas com os avanços da Frente Ampla”, além de dar “argumentos” aos eleitores que talvez não estejam inclinados a apoiar Lacalle Pou.

Hoje “a população não sente que perde o que já tem caso a oposição vença”, como aponta o discurso de campanha da Frente Ampla, destacou Bottinelli.

O cientista político da Universidade da República Diego Luján crê que para Martínez o desafio é “incorporar eleitores que claramente não o apoiaram no primeiro turno” e que podem se movimentar para o centro.

Luján ressalta que essa opção tornaria a Frente Ampla “mais competitiva” para o segundo turno”, mas teria um custo a longo prazo de desfocar ideológica e programaticamente um partido que manteve consistência e coerência ideológica ao longo de 40 anos de vida. “

Luján destacou o “desgaste” dos 15 anos de governo da Frente Ampla, que chega a essa disputa uma economia estagnada, desemprego de 9% e uma taxa recorde de homicídios.

Além disso, em 2017, a Frente Ampla foi afetada pela renúncia de seu vice-presidente Raul Sendic em meio a um escândalo no qual acabou sendo processado por suborno e abuso de poder. A posição do governo de proximidade com o regime de Nicolás Maduro na Venezuela também merece críticas internas do partido e de outras pessoas do sistema político e gera desencanto na população.

– Uma coalizão heterogênea –

Lacalle Pou, que tenta pela segunda vez chegar à presidência, comemorou os resultados das urnas e propôs formar com os partidos adversários “um governo multicolor liderado pelo Partido Nacional”.

Seus adversários derrotados no domingo, o economista Ernesto Talvi (partido Colorado) e o ex-comandante-em-chefe do Exército Guido Manini Ríos (Cabildo Abierto), anunciaram imediatamente seu apoio ao advogado de 46 anos, assim como o Partido do Povo e Partido Independente.

Para Bottinelli resta conhecer se através das negociações que estão em curso surgirá uma coalizão com atores que participariam diretamente do governo ou numa aliança com objetivos eleitorais, algo que o cientista político destacou como “importante para a unidade dessa coalizão”.

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