
ONU pede reativação do ‘motor do desenvolvimento’ diante de ‘caos climático’

O secretário-geral da ONU, António Guterres, instou a comunidade internacional nesta segunda-feira (30) a “reiniciar o motor do desenvolvimento”, na quarta conferência internacional sobre financiamento para o desenvolvimento, realizada na Espanha.
“Vivemos em um mundo onde a confiança está desmoronando e o multilateralismo está sob tensão (…). Um mundo abalado por desigualdades, caos climático e conflitos devastadores”, declarou Guterres no início da reunião de quatro dias na cidade de Sevilha, no sul da Andaluzia, intensamente afetada por uma onda de calor.
Neste contexto, é necessário “reparar e reativar o motor do desenvolvimento”, insistiu o secretário-geral da ONU, que apelou à mobilização de “recursos” e ao investimento em “escolas, atenção médica, proteção social, trabalho decente e energias renováveis”.
Esta reunião ocorre em um contexto particularmente preocupante para a assistência ao desenvolvimento, profundamente afetado pela decisão do presidente americano, Donald Trump, de eliminar 83% dos fundos para programas internacionais da agência de desenvolvimento Usaid.
– Mensagens aos EUA –
Com US$ 63 bilhões (R$ 344 bilhões) em ajuda pública em 2024, os Estados Unidos eram o principal país doador para várias agências e ONGs. Muitas agora enfrentam dificuldades significativas, já que outras capitais, como Paris, Londres e Berlim, também reduziram suas ajudas.
“Em um mundo onde a comunidade de doadores está diminuindo drástica e dramaticamente, é hora de dar um passo à frente e não apenas reafirmar nosso compromisso, mas também redobrá-lo”, disse o primeiro-ministro espanhol, o socialista Pedro Sánchez, que acredita que a reunião em Sevilha é uma “oportunidade” para “corrigir o rumo”.
O presidente francês, Emmanuel Macron, chamou a guerra comercial e as tarifas de “aberração”, sem mencionar os Estados Unidos.
“Reintroduzir a guerra comercial e as tarifas neste momento da vida do planeta é uma aberração”, disse Macron em Sevilha, criticando particularmente as tarifas impostas a “países que estão apenas começando a decolar economicamente”.
O presidente do Quênia, William Ruto, instou os Estados Unidos a reconsiderarem sua posição. “O financiamento público internacional continua indispensável. A África não pede favores. Pedimos justiça, colaboração e investimento”, afirmou.
Pelo menos 50 chefes de Estado e de governo participam até quinta-feira desta conferência, conhecida como FfD4, a quarta do gênero desde 2002, juntamente com líderes das principais instituições financeiras internacionais e 4.000 representantes da sociedade civil.
Presidentes como o colombiano Gustavo Petro, o equatoriano Daniel Noboa, o uruguaio Yamandú Orsi e o francês Emmanuel Macron estarão presentes, mas não haverá representante dos Estados Unidos, que deixaram a mesa de negociações por divergências sobre o texto apresentado às delegações, que, a seu ver, infringe a “soberania” dos países.
O objetivo deste documento de 38 páginas, chamado “Compromisso de Sevilha”, é encontrar “soluções” para as necessidades dos países em desenvolvimento, que “sofrem um déficit financeiro anual estimado em US$ 4 trilhões (R$ 22 trilhões)”, US$ 1,5 trilhão (R$ 8,2 trilhões) a mais do que há dez anos no marco da Agenda 2030.
– Críticas das ONGs –
Reverter o déficit “exigirá recursos em escala e ritmo sem precedentes”, alertou o presidente do Banco Mundial, Ajay Banga, nesta segunda-feira, apelando à mobilização de todas as partes interessadas no desenvolvimento frente ao “aumento da dívida” e aos desafios impostos pela mudança climática.
“Sabemos que não há dinheiro suficiente nos governos, organizações filantrópicas ou instituições de desenvolvimento para cumprir todas as projeções ou promessas. É por isso que precisamos do setor privado”, insistiu.
O “Compromisso de Sevilha”, que será formalmente adotado na quinta-feira, apela a uma revisão da arquitetura financeira internacional, concedendo mais espaço aos países do Sul em grandes instituições e exigindo maior cooperação contra a evasão fiscal.
Este documento, juridicamente não vinculante, será complementado por anúncios unilaterais no âmbito de uma “plataforma de Sevilha para a ação”.
O texto despertou críticas de ONGs, que lamentam a falta de ambição e solidariedade por parte dos países mais ricos.
Centenas de pessoas se manifestaram na noite de domingo em Sevilha para exigir o cancelamento da dívida e um imposto sobre os muito ricos.
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