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Com Dom Torche, a Suíça estará na final

Dom Torche masterizou 64 CDs para a Copa. Aldo Ellena

A Fifa confiou ao compositor e produtor Dom Torche e a seu estúdio em Lossy a missão de remasterizar os hinos nacionais das seleções classificadas para a próxima Copa do Mundo de Futebol.

É um trabalho que não admite o menor erro. Lossy é um vilarejo vizinho da cidade de Friburgo, no oeste da Suíça.

Dom Torche não é um torcedor de futebol comum. O coração dele só dispara na hora em que os hinos nacionais são executados. E ele só se acalma quando o juiz apita o início da partida. Ele não está nem aí para o ensurdecedor barulho das insuportáveis vuvuzelas (cornetas) que “animarão” a Copa na África do Sul. Nem mesmo se interessa pelos resultados das partidas. Para Dom Torche, o que importa é a satisfação do dever cumprido, um trabalho que não pode desafinar…

O friburguense de 55 anos, que fundou com seu amigo Bertrand Siffert o Studio de gravação Relief, em Lossy, foi escolhido pela Federação Internacional de Futebol Associação (Fifa) para cuidar de uma missão muito especial: a de remasterizar todos os hinos nacionais das 32 nações participantes na Copa do Mundo. É um grande trabalho, tendo em conta que eles serão executados 64 vezes, entre 11 de junho a 11 de julho.

Então, está perfeito

Ele realizou tarefa idêntica na última edição da Copa do Mundo de 2006, na Alemanha. “Na realidade, tenho mandato para todos os torneios organizados pela Fifa, sejam os campeonatos do mundo sub-20, das seleções femininas, de futebol de areia…”

Dom Torche conta: “Há cinco anos, recebi um telefonema de Zurique (sede da Fifa). O interlocutor nem mesmo se identificou e me disse, simplesmente, que ouvira falar de meu estúdio de gravação e, em tom sério, me perguntou se eu também fazia remasterização. Respondi que sim e ele me disse: ‘Então, está perfeito!'”

Remasterização, explica Dom Torche, “é como uma compilação. É preciso que todos os trechos musicais sejam equalizados, de modo que, no conjunto, tudo soe harmonicamente”. Explicado assim parece simples. “Mas a Fifa envia-me os hinos das federações de futebol e eu os recebo em vários tipos de gravações: CD, MP3, Windows Media Player…”

Informática e ouvido

Outra preocupação é com a qualidade da gravação, que varia muito de país para país. “É claro que o hino que recebo de um país como a França ou a Inglaterra, por exemplo, não pode ser comparado com os de certos países africanos ou sul-americanos. Para ser franco, não são terríveis. Mas essas nações simplesmente não dispõem dos mesmos recursos. Basta dizer que um desses países me enviou um hino tocado no sintetizador. Acho que os responsáveis se enganaram…”

A Fifa não permite o uso de versões cantadas. “A Coréia do Sul enviou-me três versões de seu hino, em três diferentes tonalidades: uma em dó para ser cantada por homens; uma em ré para crianças e uma em mi para mulheres. Escolhi a versão em dó.”

Dom Torche dispõe de uma bateria de recursos computadorizados para equalizar todas as diferenças de sons e de gravações. “Mas, no final, é com o ouvido que eu trabalho. Nada o substitui.”

O friburguense grava o resultado final em CDs (um para cada jogo), os remete à Fifa que, por sua vez, os envia aos países de origem para aprovação.

Um pouquinho de política

“Isto evita qualquer possibilidade de erro. Por trás de tudo há uma forte sensibilidade política. Algumas execuções duram, por exemplo, três minutos, e não podem durar mais de um minuto e meio. Quando corto, preciso ter certeza de haver cortado no lugar certo, sem que isso prejudique o país em questão.”

Um erro cometido com um hino pode realmente causar um tremendo mal-estar. Lembremos o que ocorreu na Eurocopa de 2008, antes da partida Alemanha-Áustria: a televisão pública suíça executou, por engano, o hino tradicional alemão com a legenda das três estrofes originais. Mas apenas a terceira representa, hoje, oficialmente o hino…

A primeira das três estrofes começa com a ária adotada em 1922, “Deutschland, Deutschland über alles” (‘Alemanha, Alemanha acima de tudo’), verso que ficou associado ao nazismo. Devido a essa conotação, o hino ficou limitado à sua terceira estrofe. Um engano imperdoável pelo qual o canal suíço se desculpou e assumiu a responsabilidade.

Mais um exemplo? Em novembro de 2009, por ocasião de uma partida de rúgbi entre o XV da França e os Springboks, a África do Sul ficou chocada com a interpretação de seu hino por um cantor que, na verdade, cantava muito mal… Isto ganhou proporções de incidente diplomático, tendo as autoridades sul-africanas qualificado a interpretação como “uma ofensa feita a um de seus símbolos nacionais”.

Em todo o caso, temos certeza de uma coisa: graças a Dom Torche e a seu estúdio em Lossy, a Suíça estará presente na final da Copa do Mundo. Durante três minutinhos.

Kessava Packiry/La Liberté, swissinfo.ch
(Tradução de J.Gabriel Barbosa)

Young Gods. Dom Torche abriu – com Bertrand Siffert, o grande arquiteto de som do grupo Young Gods – seu primeiro estúdio de gravação no porão de sua casa, em Belfaux (nos arredores da cidade de Fribourg).

Mudança. Mas um estúdio comercial em um bairro residencial não dá certo. Há treze anos, mudou-se para o novo endereço a alguns quilômetros dali, abrindo um segundo estúdio onde antes funcionara o moinho de Lossy.

Astros e Estrelas. Grandes artistas desfilaram por aquele lugar perdido da zona rural friburguense: Luther Allison, Barbara Tucker, Noir Désir, Stress… O francês Kamini voltou recentemente ao estúdio, repetindo sua passagem de um ano atrás. Atualmente são os Young Gods que ocupam suas dependências.

Na primeira fase da Copa do Mundo (48 partidas), pela tabela, vai ser fácil saber quem joga contra quem. Mas, e depois? “Claro, só saberei os nomes das seleções classificadas pouco antes de cada jogo. Vou ter, portanto, que enviar os CDs de cada jogo pelo sedex”.

É uma boa ocasião para Dom Torche mostrar que o CD é a opção mais apropriada em tais circunstâncias. “Poderia enviar tudo pelo computador. Mas é preciso que os programas correspondam, conversem entre si. É mais complicado e menos confiável. E o som de áudio de um computador não é tão bom quanto ao de um aparelho de CD.”

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