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Friburgo premia “Histórias” de brasileira

A jovem roteirista do filme Maria Clara Estobar, submersa em prêmios, flores e alegria. FIFF

“Histórias que só existem quando lembradas”, de Julia Murat, leva metade dos prêmios do Festival Internacional de filmes de Friburgo, na Suíça.

O primeiro longa metragem da brasileira, uma coprodução entre Brasil, Argentina e França, comove vários júris do festival de cinema suíço que procura mostrar a cinematografia dos quatro cantos do mundo.

O filme é uma história que começa simples, mas vai crescendo assustadoramente, sobre uma pequena vila abandonada no vale do Paraíba, no estado do Rio, que parece contar apenas com 12 pessoas, todas velhas, que passam o tempo indo a missa, conversando, almoçando juntas e esperando alguma coisa acontecer, seja a chuva ou a morte.

A rotina dessa pequena comunidade de idosos é abalada com a vinda da jovem Rita (Lisa E. Fávaro) que chega acidentalmente no vilarejo e pede para ficar uns dias na casa da padeira Madalena (Sônia Guedes). Aos poucos a relação entre Rita e Madalena vai ficando mais estreita e o filme caminha então para seus temas principais: O passado e como lidar com ele para construir um futuro, a velhice, as memórias e o conflito de gerações (veja o trailer ao lado).

Com essa temática, a cineasta brasileira parece ter atingindo em cheio o coração de vários jurados do festival suíço. Impossível ficar indiferente diante de uma questão que toca tanto a Suíça, que é o envelhecimento da população, e que é abordada com tanta poesia e uma fotografia comovente.

“É uma história universal que nos leva de forma simples e poética à essência de nossas vidas. Julia Murat está certa: vamos nos lembrar de algumas histórias! Elas podem parecer à primeira vista banais, mas elas nos lembram coisas fundamentais e preciosas”, declarou Danilo Cagnazzo, representante do Júri da Juventude que recompensou o filme com o Prêmio E-Changer, na noite de encerramento do 26° Festival Internacional de Filmes de Friburgo, no sábado 31 de março.

Provido pela ong E-CHANGER de um montante de 5 mil francos, o prêmio tem por objetivo promover a expressão dos jovens no Festival, mas também favorecer um filme que leva em conta os problemas que eles enfrentam no mundo de hoje.

Obra quixotesca

“Histórias que só existem quando lembradas” abriu a premiação recebendo o Prêmio “Don Quijote”, atribuído pelo Júri da Federação Internacional de Cineclubes (FICC), que procura promover nos festivais a descoberta de filmes geralmente ausentes da distribuição e da programação das salas de cinema.

Ao conceder o prêmio Dom Quixote, a FICC promove a descoberta e a divulgação de filmes importantes. “Serenata de imortalidade, poema vertical, travessia da história. Uma ficção plena e íntegra, uma realização hábil e madura que acaricia a perfeição tanto no conteúdo como na forma: um cenário sublime, realizado e dirigido com mestria comovente da fotografia por uma jovem equilibrista da memória”, justificaram os jurados da FICC, anunciando, de forma tão poética quanto o filme, as razões que motivaram tantos outros jurados da noite.

Fundada em 1947 no Festival de Cannes, a FICC reúne federações de clubes e de cinemas sem fins lucrativos dos cinco continentes. A federação inclui em seu catálogo de distribuição os filmes premiados por seus jurados.

O prêmio foi recebido pela jovem roteirista Maria Clara Estobar, que, emocionada, comentou que o filme de Julia Murat também merecia a homenagem por se tratar “de uma obra quixotesca, uma longa batalha que levou seis anos para ser concretizada”, disse.

Prêmio ecumênico

O filme brasileiro também recebeu o Prix du Jury Oecuménique, também de 5 mil francos, oferecido em conjunto pelas duas organizações de ajuda ao desenvolvimento “Action de Carême” (católica) e “Pain pour le Prochain” (protestante).

O prêmio é concedido ao diretor, ou diretora, de cinema cujo filme reflete da melhor forma os valores fundamentais dos dois organismos. O júri é composto por um representante dessas organizações e representantes da SIGNIS (Organização Católica Internacional de Comunicação) e da INTERFILM (Organização Internacional Inter-Igrejas para o Cinema).

“Obra sobre a passagem do tempo, a memória, a morte, este belo filme, banhado de símbolos, mostra como a irrupção da juventude e o uso da fotografia revela as lembranças. Assim se dá sentido à vida que flui e à morte”, disse Théo Buss, presidente do júri ecumênico.

Júri internacional

principal distinção conferida pelo FIFF, o prêmio Regard d’Or, de um montante de 30 mil francos suíços, foi para o filme israelense “Never to Late”, de Ido Fluk.

Também primeiro longa-metragem do jovem diretor israelense, o filme soube convencer o Júri Internacional presidido pela diretora iraniana Sepideh Farsi, que justificou a escolha dizendo que “o filme abordou brilhantemente o dilema do ser humano contemporâneo diante dos desafios de seu contexto geográfico e cultural, porque acreditamos que nunca é tarde demais … It’s never too late”.

Ao receber o “Regard d’Or”, Ido Fluk lançou uma mensagem de paz aplaudida com entusiasmo, dizendo que eles eram mais numerosos do que se acredita, em Israel, “as pessoas como nós, que querem o fim do conflito e a retirada dos territórios palestinos ocupados”, disse.

O júri internacional também concedeu o prêmio “Talent Tape Award” ao filme de Julia Murat. Oferecido pela Fujifilm SA e Egli Film AG, esse prêmio, no valor de 19 mil francos suíços, recompensa um produtor, ou produtora, pela qualidade do filme. O prêmio também vai converter o formato vídeo em filme Fujifilm de padrão cinema nos laboratórios da Egli Film AG, em Zurique.

A presidente do júri disse que a escolha do filme se deu pela “sua reflexão poética sobre a passagem do tempo, a essência da imagem fotográfica e pela qualidade da abordagem visual”, acrescentando que “depois de ter recebido tantos prêmios, esperamos que Julia esteja aqui conosco no ano que vem”.

Subindo no palco pela quarta vez para receber o prêmio em nome da cineasta brasileira, Maria Clara explica que Julia Murat não pôde comparecer por motivo de gravidez, mas que estaria tão alegre quanto ela ao receber tantos prêmios e tantas flores: “Se alguém vir uma menina distribuindo flores do lado de fora, podem ter certeza que sou eu”, declarou à plateia.

FESTIVAL DE ROTTERDÃ
2012
Ganhou
Melhor Filme do Público na cidade de Groningen

FESTIVAL DE SANTA BARBARA
2012
Ganhou
Melhor Filme Latino

FESTIVAL DE REYKJAVIK

Ganhou
Prêmio Ecumênico

FESTIVAL DE ABU DHABI

Ganhou
Melhor Filme
Melhor Atriz – Sônia Guedes

FESTIVAL DE LJUBJANA

Ganhou
Prêmio FIPRESCI

FESTIVAL DE WARSAW

Ganhou
Melhor Filme – Júri Popular

FESTIVAL DE SANTA MARIA DA FEIRA
Ganhou
Melhor Filme
Melhor Filme – Júri Popular
Melhor Filme – Júri Cineclubista
Melhor Atriz – Sônia Guedes

Júlia Murat teve a ideia do filme em 1999, quando trabalhava como assistente de direção de Brava Gente Brasileira, de Lúcia Murat. Durante as filmagens ela encontrou um cemitério fechado na pequena vila do Forte Coimbra, o que obrigava que os moradores fossem enterrados na cidade vizinha, a sete horas de barco.

O roteiro de Histórias que Só Existem Quando Lembradas foi inspirado no realismo fantástico latino-americano, em especial a obra de Gabriel Garcia Márquez e Juan Rulfo.

A diretora Júlia Murat percorreu cidades do Vale do Paraíba por dois meses, fazendo entrevistas com moradores locais. Foram 100 horas de material gravado e mais de 100 páginas de diálogos transcritos, que serviram de inspiração para os diálogos na cidade fictícia de Jotuomba.

(Fonte: site adorocinema.com)

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