Heidi, esse ícone suíço extremamente alegre e otimista, está de volta onde ela pertence: nos cinemas. Mas depois de dezenas de adaptações, do cinema mudo às versões mangá, será que o mundo realmente precisa de outra?
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Nascido em Londres, Thomas trabalhou para o jornal inglês The Independent antes de se mudar para Berna em 2005. Domina três idiomas suíços oficiais e gosta de viajar pelo país e praticá-los, sobretudo nos seus pubs, restaurantes e sorveterias.
“Bem, a última grande versão cinematográfica que foi sucesso internacional foi na década de 1950 – duas gerações atrás”, diz o diretor do filme, Alain Gsponer, para swissinfo.ch. “E o material é tão universalmente rico que você poderia dizer que cada geração precisa de sua própria Heidi!”
Este não é o primeiro relacionamento de Gsponer com a Heidi, órfã indesejada que é largada com seu avô misantropo em uma montanha do cantão dos Grisões, é então enviada para Frankfurt como dama de companhia da jovem cadeirante milionária Klara, antes de retornar com saudades do avô e do jovem cuidador de cabras, Peter. Klara depois se junta a ela e começa a andar novamente depois de respirar o ar restaurador das montanhas suíças.
Quando estudante, o diretor de 39 anos havia feito um curta de animação sobre a heroína de Johanna Spyri. “Eu estava zombando da imagem da Suíça, que realmente se vendeu usando a Heidi e seu aconchegante mundo ideal. Era uma sátira. Na realidade, os livros (Heidi foi originalmente publicado em duas partes) contavam outra história. Eles são muito mais um drama social que questiona os problemas existenciais da Suíça da época”, conta Gsponer.
“Era importante para nós mostrar com este filme que as pessoas na Suíça passavam fome e pessoas, como o avô, foram condenadas ao ostracismo. As pessoas levavam uma vida muito penosa e taciturna – não era só este mundo acolhedor.”
Estrela natural
Portanto, esta geração está recebendo uma leitura autêntica, relativamente “desromantizada” da história de Spyri. O excelente elenco da coprodução germano-suíça é encabeçado pelo astro suíço Bruno Ganz, adequadamente rabugento (pelo menos no início) como avô, e a estreante de nove anos de idade Anuk Steffen, como Heidi, cujo sorriso cativante ajudou a repelir 500 rivais para o papel.
“A exigência era que ela viesse da região e falasse o dialeto suíço-alemão”, disse Gsponer. “A escolha não foi assim tão grande!”, todos os diálogos em suíço-alemão serão dublados em alemão para o público na Alemanha e na Áustria.
“Mas já na primeira seleção achei a Anuk instigante, com seu olhar vivo e uma interpretação inteligente. Eu estava procurando alguém com energia, mas que ao mesmo tempo fosse frágil e que transmitisse isso através de seus olhos.”
Indiscutivelmente a estrela principal, no entanto, é a paisagem. As cenas foram filmadas no vilarejo de Latsch e nas montanhas dos arredores, onde o filme de 1952 também foi filmado.
As primeiras cenas do filme se perdem nos vales da região, e não é de estranhar que cantão dos Grisões tenha contribuído um pouco no orçamento do filme (150 mil dos 8.5 milhões de francos).
“Heidi contribuiu bastante para o sucesso do turismo na Suíça. A menina e sua história se tornaram um símbolo de como as pessoas de todo o mundo veem a Suíça. Heidi evoca belas montanhas e paisagens alpinas, uma vida livre das preocupações urbanas”, diz Véronique Kanel, da Suíça Turismo, órgão de promoção do turismo no país.
“O impacto mais interessante da história da Heidi no turismo foi o desenho animado japonês de 1974, de Hayao Miyazaki, que atraiu gerações de turistas japoneses à Suíça para conhecer o país real da Heidi. O desenho animado foi mostrado na televisão em todo o mundo e fez muito sucesso em outros países, como na Itália.”
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As várias faces de um clássico suíço
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Não é fácil ser um ator mirim. A pressão de crescer na tela pode ser demais para alguns, enquanto outros gerem a transição para carreiras de sucesso sem problemas. O que aconteceu com algumas jovens atrizes que fizeram o papel da Heidi?
Hans-Jörg Müntener, que dirige o escritório de turismo que representa o Heidi Village em Maienfeld, onde os livros de Spyri foram escritos, diz que mais de 100 mil visitantes por ano geram 5 milhões de francos para a região.
Destes, cerca da metade vem da Ásia, e nos últimos três anos muitos são provenientes dos países do Golfo. “Essas pessoas gastam CHF350-500 por dia, enquanto que os alemães e os suíços gastam apenas CHF50-80”, disse.
Apesar desses benefícios financeiros, há resistência contra o desenvolvimento da infraestrutura, por exemplo a construção de uma “Cabana do Avô”. “A secretaria do ordenamento do território é contra isso”, diz Müntener.
Bode expiatório
Mas as belas paisagens suíças também têm suas desvantagens na hora de filmar.
“Tivemos azar com o tempo”, disse Gsponer. “Filmamos no verão [de 2014] e nevou algumas vezes lá em cima! As crianças tiveram que correr descalças e elas congelaram. Na montagem, tivemos que utilizar frequentemente a correção de cores para remover os lábios azuis!”
Além disso, havia os animais: “As cabras são animais de carga que querem escalar a montanha na parte da manhã atrás de comida e, em seguida, voltar para baixo à noite. Mas, obviamente, não queríamos passar dias inteiros para cima ou para baixo na montanha. Tentamos filmar cenas com as cabras sendo levadas à montanha, mas como começávamos as filmagens só às três da tarde, as cabras não queriam subir. Tivemos realmente que forçá-las!”
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Clássico suíço volta às bilheterias
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O clássico infantil, escrito pela autora suíça Johanna Spyri em 1881, conta como a jovem órfã, Heidi, é mandada para viver com seu avô mal-humorado nos Alpes suíços, onde eles aprendem a se gostar. Heidi faz amizade com um jovem pastor local chamado Peter. A história foi adaptada dezenas de vezes para o cinema e…
Para a roteirista Petra Volpe, o maior desafio foi “manter-se fiel ao material e não ser seduzida em torná-lo mais chamativo e cheio de ação. O filme não pode competir com a Pixar!”
“Quando li os livros, fiquei profundamente comovida. Não tinha lido eles quando criança. Cresci com a série de televisão alemã [de 1978] e o mangá japonês, e encontrei algo nos livros que não tinha visto em outras adaptações da Heidi”, disse para swissinfo.ch.
“Johanna Spyri escreve de uma forma extremamente precisa sobre a pobreza na Suíça, sobre a dureza da vida e também quão difícil a vida era para crianças e órfãos. Eles eram basicamente empurrados para os outros – ninguém queria cuidar deles.”
Um dos desafios foi tentar permanecer fiel à história original e ao mesmo tempo fazer com que o filme fosse interessante para o público moderno.
“Um elemento muito importante nos livros de Johanna Spyri é a religiosidade. No segundo livro, a Heidi fala de Deus o tempo todo e converte todo mundo – o médico encontra Deus, o pai de Klara encontra Deus, todo mundo”, diz Volpe.
“Para mim foi difícil abordar esse aspecto, pois sou ateia, mas há também uma espiritualidade em Johanna Spyri que vai além da religião cristã. Ela e seus personagens são profundamente ligados à natureza – há algo de divino na natureza que vai além das palavras. Deste modo, tentei me concentrar mais na natureza como um lugar espiritual para a Heidi, onde ela descobre de onde ela pertence e onde ela pode ser ela mesma.”
Adaptação: Fernando Hirschy
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