Denúncias internas e sucessão abalam o WEF

O Fórum Econômico Mundial (WEF) enfrenta a maior crise institucional desde sua fundação, em 1971. Denúncias de assédio, má conduta financeira e a saída repentina de Klaus Schwab, 87, fundador da entidade, amplia as incertezas sobre o futuro da organização, que tem sede na Suíça e status legal equivalente ao da ONU.
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Há mais de meio século, empresários, políticos e representantes da sociedade civil peregrinam anualmente ao resort suíço de Davos em janeiro. Criado em 1971 como o Fórum Europeu de Administração, o WEF evoluiu e se tornou um dos pontos de encontro mais importantes para a elite mundial.
Isso aumentou o status da Suíça como um centro de diplomacia e negócios. O país concedeu ao WEF o título de “outro órgão internacional”, o que lhe confere o mesmo status legal de entidades influentes sediadas em solo suíço, como a ONU e a Cruz Vermelha.

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Alegações
Mas o WEF foi recentemente abalado por um escândalo. Ex-funcionários alegaram assédio sexual e racial em uma carta aberta publicadaLink externo no jornal americano Wall Street Journal (WSJ). Isso ocorreu após um acordo extrajudicial em um processo movido por uma ex-funcionária do WEF, que afirmou ter tido a carreira prejudicada por estar grávida.
Pior ainda: o fundador do WEF, Klaus Schwab, e sua esposa foram acusados de se apropriar indevidamente de fundos da organização em benefício próprio. O professor alemão nega veementemente as acusações e ameaçou entrar com uma ação judicial. As denúncias abalam a imagem da instituição.
“Nossa reputação está intimamente ligada ao nosso sucesso; as ações de um indivíduo podem ter um impacto significativo em nossa marca geral”, escreveu Schwab no documento do Código de Conduta do Fórum Porém muito antes da atual turbulência. “Portanto, é imperativo que cada um de nós adote uma cultura que seja uniforme em todo o Fórum e cumpra o que defendemos”.
Aparentemente, as alegações também colocaram o professor de 87 anos, em rota de colisão com o conselho de administração do WEF, que “atua como guardião de sua missão e valores”, segundo o próprio site da fundação.
Semelhança com a FIFA
O jornal americano e outros meios de comunicação informam que a decisão do conselho de investigar Schwab levou a figura central do WEF a renunciar abruptamente ao cargo de presidente no mês passado. Também foi relatado que o filho, a filha e sua esposa estão deixando suas funções ativas na organização. Os representantes atuais da organização declinaram comentar sobre o caso.
Para o jurista suíço Mark Pieth, os problemas no WEF têm algumas semelhanças com os da FIFA, que se viu envolvida em outro tipo de escândalo há alguns anos.

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O que ambos os órgãos sem fins lucrativos sediados na Suíça têm em comum é uma figura dominante que exerce grande poder – no caso da FIFA, o ex-diretor Sepp Blatter. “Em ambos os casos, podemos ver um indivíduo que se agarra ao poder o máximo que pode”, afirma Pieth. “Ambos os líderes eram considerados essenciais para suas organizações e exibiam um estilo autocrático.”
“O WEF é uma empresa familiar”, acrescentou Pieth, referindo-se aos artigos de associação do Fórum, que estipulam que Schwab, “ou pelo menos um membro de sua família imediata”, deve fazer parte do conselho de administração. “O próprio fundador designa seu sucessor”, dizem os estatutos do WEF.
Empresa familiar
Schwab e os curadores agora precisam resolver suas diferenças para definir uma sucessão emergencial. Mas a situação está longe de ser desesperadora, disse o ex-diretor do WEF, Stéphane Garelli, ao canal de televisão RTS. “É sempre complicado quando empresas e organizações perdem um fundador”, afirmou. “Mas veja o que aconteceu com a Apple. Steve Jobs (n.r.: o fundador da empresa) foi embora, mas a Apple ainda está lá. O mesmo vale para a Microsoft. Não é impossível. É difícil e exigirá muito tato e inteligência.”
Garelli indicou o ex-chefe do Banco Nacional Suíço, Philipp Hildebrand, como possível novo presidente do WEF. A mídia também especulou que o cargo poderia ser ocupado pela atual presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde. “Como regra, as instituições são maiores do que os indivíduos”, disse Alois Zwinggi, atual diretor do WEF, ao jornal da editora Tamedia.
O anúncio de uma investigação sobre as alegações contra Schwab era necessário, mas foi “pesado” e “um pouco teatral demais”, segundo Pieth. O circo midiático resultante pode afastar alguns candidatos, disse ele. “Quem quer que venha terá que reorganizar o WEF… Ele precisa ter uma aparência diferente se quiser seguir em frente sem problemas.”

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Efeito de “soft power”
Isso será de suma importância para o governo suíço, que concede ao WEF isenções fiscais, a capacidade de administrar suas próprias operações e finanças sem interferência do Estado, e a liberdade de empregar quantos estrangeiros quiser.
O WEF tem o mesmo status internacional que o CERN, a Cruz Vermelha, o Comitê Olímpico Internacional (COI) e muitas instituições sediadas na Genebra Internacional. Elas exercem “soft power” para a Suíça no cenário global, segundo Garelli.
Representantes do governo suíço não fizeram nenhum comentário sobre o caso do WEF, mas, sem dúvida, esperam que a organização consiga superar a atual turbulência, assim como ocorreu nos casos anteriores da FIFA e do COI.
Edição: Balz Rigendinger/ts
Adaptação: Alexander Thoele

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