
Suíça assume OSCE em meio a crise e incerteza na Europa
A Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) é hoje uma sombra do que já foi. A Suíça assumirá a presidência no próximo ano – e precisará se preparar para cenários muito diversos, escreve o ex-secretário-geral Thomas Greminger.
A OSCE está há anos completamente polarizada. As missões de campo nos Bálcãs Ocidentais, no Leste Europeu e na Ásia Central continuam realizando um trabalho valioso. O mesmo pode ser dito sobre as atividades consultivas do secretariado nas áreas de ameaças transnacionais – tráfico de pessoas, extremismo violento e terrorismo, segurança cibernética – e do trabalho de seus centros de competência em direitos humanos, Estado de Direito e democracia (ODIHR, na sigla em inglês), para minorias nacionais (HCNM, na sigla em inglês) e liberdade de imprensa (RFOM, na sigla em ingles).
No entanto, do ponto de vista político, as plataformas de diálogo da organização estão bloqueadas. Ela não desempenha nenhum papel na gestão de conflitos na Ucrânia, e desapareceu do radar político dos principais atores da segurança euro-atlântica.
É bem possível que essa seja a característica dominante da organização, da qual a Suíça assumirá a responsabilidade política no próximo ano. Isso significaria que os espaços de atuação política seriam bastante limitados, e o foco principal seria garantir a sobrevivência da organização até tempos melhores.

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Conquistas diplomáticas relevantes na política externa não seriam esperadas em uma situação como essa. No entanto, mesmo nesse cenário, com boa preparação e diplomacia inteligente, reformas institucionais modestas e alguns destaques temáticos seriam possíveis, quais sejam: o combate à desinformação, a segurança no espaço cibernético ou a interseção entre novas tecnologias (inteligência artificial, computação quântica, biotecnologia) e segurança.
OSCE com um papel central?
O que torna tão desafiadora a preparação para a terceira presidência suíça da OSCE – após 1996 e 2014 – é a incerteza quanto à evolução do ambiente político. Caso a guerra na Ucrânia chegue ao fim nos próximos meses, a OSCE – talvez em uma iniciativa conjunta com as Nações Unidas – teria a oportunidade de assumir um papel na supervisão de um cessar-fogo. Se isso for bem-sucedido, a OSCE voltaria a ter um papel central na segurança europeia.
Um cessar-fogo combinado com um acordo sobre princípios para a resolução de conflitos criaria as condições iniciais para complementar a dissuasão militar na ordem de segurança europeia, com certos elementos de segurança cooperativa. Seriam rapidamente necessários mecanismos de redução de riscos militares e medidas de construção de confiança e segurança, a fim de estabilizar a longa linha de separação entre a Rússia e o Ocidente. Em uma Europa fortemente armada, também seria preciso retomar em breve as negociações sobre o controle de armamentos convencionais.
No campo não militar, haveria eleições a serem observadas, direitos de minorias a serem garantidos e a liberdade de imprensa a ser restabelecida em um contexto pós-conflito. Em todas essas áreas, a OSCE – como a mais inclusiva organização de segurança europeia – possui ampla experiência e instrumentos adequados.
O desafio para a presidência suíça será posicionar politicamente as ferramentas da OSCE no momento adequado, e garantir que a organização esteja em condições de disponibilizá-las quando houver demanda. Ambas as tarefas são tudo menos triviais, considerando a marginalização política e os recursos extremamente escassos da organização.
Uma possível solução seria buscar novas coalizões entre países que não estão dispostos a se alinhar a nenhum dos polos. Isso já foi um modelo de sucesso no processo da CSCE (Conferência sobre Segurança e Cooperação na Europa): os chamados países N+N – neutros e não aliados – conseguiram, repetidamente, mediar entre as grandes potências.

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Antecipar diferentes cenários
A política externa suíça, portanto, deve se preparar para realidades muito diversas. São necessárias previsão estratégica e antecipação: opções políticas precisam ser pensadas para diferentes cenários. Um futuro incerto exige uma preparação ainda melhor para todos os aspectos planejáveis.
Nossas experiências no ano da presidência em 2014 confirmaram isso, quando tivemos que lidar – de forma inesperada, mas no final bem-sucedida – com a crise na Ucrânia e ao seu redor. Ficou claro quão importante é tomar decisões rápidas, por meio de canais curtos entre Berna e Viena, para reagir de forma flexível a eventos e mobilizar reservas quando necessário.
Portanto, é bastante possível que a presidência suíça da OSCE em 2026 seja uma tarefa trabalhosa e com pouco brilho. Mesmo assim, espera-se da Suíça um compromisso com a continuidade da OSCE e dos elementos remanescentes da segurança cooperativa na Europa.
No entanto, ela também pode ser diferente: desenvolvimentos na Ucrânia podem abrir novas possibilidades para a reconstrução da segurança europeia – e a Suíça, como presidente da OSCE, terá alavancas importantes para ajudar a moldar esse processo: uma oportunidade que deve ser aproveitada.
Adaptação: Flávia C. Nepomuceno dos Santos

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