
Lula na ONU, povo na rua: Brasil reforça a defesa de sua democracia

A imprensa suíça, assim como grande parte da mídia internacional, destacou a participação do presidente brasileiro na assembleia geral da ONU em Nova York por sua defesa inconteste da democracia e do multilateralismo, enquanto os brasileiros iam às ruas contra as tentativas do Congresso de anistiar golpistas e blindar os parlamentares da Justiça.
De 20 a 26 de setembro de 2025, vasculhamos a imprensa suíça para dar uma visão geral das notícias mais importantes relacionadas ao Brasil, Portugal ou África lusófona.
“Trump não é o imperador do mundo”
O diário zuriquenho Tages Anzeiger citou a frase de Lula na ONU logo no título do artigo que destacava a postura do chefe de Estado brasileiro em relação aos Estados Unidos. Continua o jornal:
“A relação entre o presidente dos EUA, Donald Trump, e o chefe de Estado brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, sempre foi tensa. A escalada mais recente foi a introdução de tarifas alfandegárias exorbitantes de 50% sobre produtos brasileiros. Trump justificou a medida com uma suposta “caça às bruxas” contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e exigiu que o processo judicial contra seu aliado fosse encerrado. O Brasil não cedeu, aceitou as tarifas punitivas e deu continuação ao processo. Bolsonaro deve cumprir 27 anos de prisão.
Para Lula, isso não deve ser apenas uma vitória na política interna, mas também um golpe contra Trump. A soberania do Brasil não é negociável, disse Lula à BBC: Trump pode ser “presidente dos Estados Unidos, [mas] ele não é o imperador do mundo”. Lula criticou duramente a afirmação de Trump de que Bolsonaro seria vítima de perseguição da esquerda. Com isso, ele divulgou inverdades: “Bolsonaro e seus co-conspiradores prejudicaram o país, tentaram um golpe de Estado e planejaram minha morte”.
Já o jornal Blick incluiu a participação de Lula como um dos 6 principais destaques da assembeia geral da ONU, mas principalmente pela possibilidade de se chegar a um acordo com os EUA. O jornal destaca o “otimismo de Lula”, estimando que o encontro entre os dois líderes poderá “resolver a crise entre os dois países.”
O conservador Neue Zürcher Zeitung, em seu balanço do evento, destacou o presidente brasileiro como uma das principais lideranças lutando pela manutenção da relevância da ONU frente aos desafios presentes. A agência France Presse, resumindo a montanha-russa diplomática, manchetou “Lula e Trump na ONU: duelo, ‘química’ e reunião em vista.”
Por fim, também não passaram desapercebidas pela imprensa suíça as represálias do governo Trump contra a família e a esposa do juiz Alexandre de Moraes por conta da condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro a 27 anos de prisão.
Fontes: Tages Anzeiger Link externo(19.09.25); BlickLink externo (25.09.25); NZZLink externo (23.09.25), em alemão; Le MatinLink externo em 22.09.25 (em francês)
Enquanto isso, nas ruas…
As lentes midiáticas também prestaram particular atenção às manifestações de domingo passado (21.09) que levaram centenas de milhares de pessoas às ruas contra as tentativas do Congresso de avançar a lei de anistia aos golpistas e contra a chamada “PEC da Blindagem” (ou “da Bandidagem”).
Um projeto de lei que pretendia reforçar a imunidade dos parlamentares no Brasil foi arquivado na quarta-feira, após um grande clamor e grandes manifestações no domingo, lideradas pelos cantores Caetano Veloso, Gilberto Gil e Chico Buarque.
Na semana passada, a Câmara dos Deputados, com forte maioria conservadora, aprovou o projeto de lei por ampla maioria.
Mas na quarta-feira, o texto foi “rejeitado e definitivamente arquivado” pelo Senado, anunciou o presidente da Câmara Alta, Davi Alcolumbre, poucas horas depois de uma comissão senatorial ter rejeitado o projeto por unanimidade. Ele parabenizou seus colegas por terem tido a “coragem” de “enfrentar um assunto que naturalmente mobilizou a sociedade”.

À margem da Assembleia Geral da ONU em Nova Iorque, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva congratulou-se com este desfecho. Segundo ele, este projeto de lei teve “o destino que merecia, pois era uma vergonha nacional”. Colocá-lo na agenda do Parlamento foi um “erro histórico”, afirmou. Durante a votação dos deputados, alguns membros do partido de Lula juntaram-se aos conservadores para aprovar o texto.
No domingo, dezenas de milhares de pessoas participaram em manifestações em várias cidades brasileiras, empunhando cartazes com os dizeres “Parlamento, vergonha nacional”. A esquerda nunca havia reunido tantas pessoas nas ruas desde a vitória de Lula na eleição presidencial de 2022.
Os manifestantes também tinham como lema a rejeição de qualquer projeto de anistia no Parlamento que pudesse beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022), condenado em 11 de setembro a 27 anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal por tentativa de golpe contra Lula. Esse projeto também enfrenta ventos contrários no Parlamento e vários deputados prevêem que ele seja revisto para baixo.
Em vez de um perdão, ele poderia registrar uma redução das penas para os simpatizantes bolsonaristas condenados pelos distúrbios de 8 de janeiro de 2023 contra os locais de poder em Brasília, poucos dias após a posse de Lula.
Fonte: Le MatinLink externo em 25.09.25 (em francês)
Liberdade para massacrar
A Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro aprovou uma lei que prevê um bônus para alguns policiais que matarem “criminosos”, provocando protestos entre os defensores dos direitos humanos.
Uma medida semelhante, apelidada de “bônus do Velho Oeste”, esteve em vigor de 1995 a 1998, antes de ser cancelada devido ao aumento do número de mortes durante intervenções policiais. Esse prêmio “estimula a violência e transforma a morte em política pública”, criticou na quarta-feira na rede social X o deputado federal de esquerda Henrique Vieira, eleito pelo Rio de Janeiro.
No Rio, as intervenções policiais violentas são frequentes, especialmente nas favelas, bairros pobres e densamente povoados que muitas vezes vivem sob o jugo dos narcotraficantes. O prêmio foi incluído em um projeto de lei de reforma da polícia civil, responsável principalmente pelas investigações, ao contrário da polícia militar, cujo papel é mais repressivo.
Nos anos 90, os agentes da polícia militar, herdada da época da ditadura (1964-1985), também tinham direito a esse bônus. Para entrar em vigor, o texto aprovado na terça-feira à noite por ampla maioria ainda precisa ser promulgado — em até 15 dias — pelo governador Claudio Castro, aliado do ex-presidente de extrema direita Jair Bolsonaro.
Ele estipula que os agentes podem ganhar um bônus de 10% a 150% de seu salário “ao apreender armas de grande calibre ou em situações que levem à neutralização de criminosos”.
“Corremos o risco de ver um massacre generalizado, perpetrado por policiais que farão de tudo para ganhar mais dinheiro”, disse à AFP Djeff Amadeus, advogado do Instituto de Defesa da População Negra, uma ONG. Segundo ele, essa lei poderia “abrir as portas para que o bônus seja estendido à polícia militar e a outros membros das forças da ordem”.
Em 2024, 703 pessoas morreram durante intervenções policiais no estado do Rio, ou seja, quase duas por dia, de acordo com números oficiais. No entanto, esse total representa uma queda de 19% em relação a 2023 (871).
Fonte: Le MatinLink externo em 24.09.25 (em francês)
A morte trágica de Kongjian Yu, referência mundial do “urbanismo sustentável”

O arquiteto chinês Kongjian Yu, mundialmente conhecido por ter desenvolvido o conceito de “cidades esponjas”, morreu em um acidente aéreo no Brasil junto com os outros três ocupantes do avião, anunciou a polícia local na quarta-feira.
Kongjian Yu, 62 anos, era uma referência em urbanismo sustentável. O conceito de “cidades esponjas” consiste, nomeadamente, em substituir os revestimentos urbanos clássicos por materiais porosos e espaços verdes, a fim de melhor absorver a água no solo e enfrentar melhor os riscos de inundações. Este conceito foi implementado em muitas cidades na China, mas também nos Estados Unidos e na Rússia.
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Nascido em um pequeno vilarejo na província de Zhejiang, na China, Kongjian Yu era professor na Universidade de Pequim, onde fundou uma escola de arquitetura.
As causas do acidente, que ocorreu na noite de terça-feira em uma zona rural do Pantanal, uma vasta área úmida ao sul da Amazônia, no estado do Mato Grosso do Sul (centro-oeste), ainda não foram determinadas, segundo a polícia. As outras três vítimas são os cineastas brasileiros Luiz Fernando Feres da Cunha Ferraz e Rubens Crispim Jr, autores de documentários, e o piloto e proprietário do avião.
Kongjian Yu chegou ao Brasil no início de setembro para participar da Bienal de Arte Contemporânea de São Paulo. Ele estava indo para o Pantanal para filmar um documentário com os dois cineastas, explicou o Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU) em um comunicado.
“Seu conceito de ‘cidades esponjas’ foi aplicado em mais de 1.000 projetos em 250 cidades”, acrescentou o CAU, ressaltando que o arquiteto “defendia soluções baseadas na natureza para lidar com as inundações urbanas e os efeitos da crise climática”.
Fonte: WatsonLink externo em 25.09.2025; BlickLink externo (em francês)
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