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Câmara devolverá nacionalidade aos “brasileirinhos apátridas”

Audiência da Comissão Parlamentar: Rita Camata, relatora ,1a à esquerda, e Carlito Merss, presidente, ao centro, de óculos swissinfo.ch

A espera foi longa, mas as comunidades de brasileiros residentes no exterior estão prestes a comemorar uma grande vitória.

Após sete anos de protelação, a Câmara dos Deputados finalmente parece disposta a analisar e aprovar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 272/00, que busca corrigir uma falha na revisão constitucional de 1994 e devolver aos filhos de brasileiros nascidos no exterior após aquela data o direito automático à cidadania.

Essas crianças – cuja primeira geração está chegando agora aos 13 anos de idade – não têm atualmente esse direito assegurado.

Conhecidos como “brasileirinhos apátridas”, elas só poderão obter a cidadania brasileira, segundo as regras em vigor, após completarem 18 anos e, ainda assim, se decidirem residir novamente no Brasil.

Essa é uma realidade que preocupa milhares de pais e mães brasileiros, mas que começou a mudar no dia 26 de abril, quando a Câmara finalmente instalou a comissão especial encarregada de analisar a PEC 272/00.

Indicados para a presidência e a relatoria da comissão, os deputados federais Carlito Merss (PT-SC) e Rita Camata (PMDB-ES) aprovaram, logo na primeira reunião de trabalho, um calendário que prevê a votação da PEC 272/00 ainda na primeira quinzena de junho.

Ponto alto da agenda, foi realizada na quinta-feira (10) em Brasília uma audiência pública sobre o tema. O debate contou com a presença do secretário-executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Telles Barreto, da diretora-geral do Departamento de Estrangeiros do Itamaraty, Mitzi Valente da Costa, e do representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Joelson Dias, além de parlamentares. Também marcou presença na audiência a representante do movimento Brasileirinhos Apátridas em Brasília, Denise da Veiga Alves.

“Todas as manifestações na audiência pública foram favoráveis à aprovação da PEC, que corrige o problema causado pela revisão constitucional de 1994”, conta Carlito Merss.

O presidente da comissão especial diz acreditar que mais duas sessões bastarão para que a proposta seja aprovada e enviada para votação em plenário: “Todos desejam a aprovação da PEC. O direito à nacionalidade é uma questão de cidadania”, diz.

Também otimista com o ritmo ágil dos trabalhos, a relatora Rita Camata promete entregar seu parecer até o dia 31 de maio. Sua expectativa é de que, uma vez enviado ao plenário, o parecer seja aprovado por unanimidade, assim como na comissão especial.

Vanguarda na Suíça

Essa é uma vitória que será celebrada por famílias brasileiras em vários países do mundo, mas especialmente na Suíça, onde está a vanguarda na luta pelo direito dos “brasileirinhos”.

Com presença e trabalho em diversos cantões, iniciativas como Grupo Atitude (Berna), Grupo Vivência (Lucerna), Revista CigaBrasil (Basiléia) e Associação Raízes (Genebra), entre outras igualmente valiosas, transformaram-se em sinônimo de união da comunidade brasileira na Suíça e desempenham papel de destaque na luta pela aprovação da PEC 272/00.

Todas essas organizações estarão presentes nas manifestações que os pais e mães dos “brasileirinhos” realizarão na Suíça no dia 2 de junho.

Se o relatório de Rita Camata for mesmo aprovado pela comissão especial no dia 31 de maio, a manifestação tem tudo para se transformar em comemoração: “Provavelmente as mobilizações terão mais o efeito de demonstrar a vitória de uma campanha de cidadania, que foi capaz de sensibilizar o Ministério das Relações Exteriores e os deputados. Por ações diversas, detonadas em regiões e momentos diversos”, analisa o jornalista Rui Martins, que mora na Suíça e, articulador do movimento, foi o primeiro a fazer chegar aos ouvidos das autoridades em Brasília as angústias dos “apátridas”.

A comunidade brasileira na Suíça também foi decisiva para que o pedido de instalação da comissão especial para analisar a PEC 272/00, que dormia há sete anos na gaveta do presidente da Câmara, fosse finalmente aprovado.

Foi numa visita a Genebra no começo do ano, onde participou de uma reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC), que o deputado Carlito Merss, membro da Comissão de Relações Exteriores, conheceu a Associação Raízes e ouviu o apelo para que assumisse a luta dos “brasileirinhos” na Câmara.

Promessa cumprida, ela conta agora com a gratidão da comunidade brasileira: “Queremos a presença do deputado aqui na Suíça para as mobilizações do dia 2 de junho”, revela Marco Antônio Miranda, que é diretor de cidadania da Associação Raízes.

Próximo objetivo é o Conselho

A vitória na luta dos “brasileirinhos” e a retomada na relação com o Congresso Nacional promete inaugurar uma nova etapa na organização da comunidade brasileira na Suíça.

O objetivo é unificar os esforços das várias organizações que representam os mais de 40 mil brasileiros que, segundo estimativas extra-oficiais, vivem atualmente em solo helvético.

Experiência acumulada já existe, afinal já foram realizados três Encontros Brasileiros na Suíça: em 1998, 2003 e 2005. No último encontro foi criada uma comissão para agilizar a criação do Conselho Nacional Representativo da Comunidade Brasileira na Suíça, que funcionará como uma espécie de central onde serão tratados os interesses da comunidade.

Organizadora dos encontros brasileiros, coordenadora do Grupo CigaBrasil e membro da Comissão Pró-Conselho Brasileiro, a jornalista Irene Zwetsch explica a proposta do Conselho Brasileiro: “O objetivo é unir os esforços regionais que já existem no país, encabeçados pelas várias associações e grupos brasileiros espalhados nos diversos cantões. Acreditamos que, tendo uma plataforma central que reúna informações e se responsabilize pela conexão e intercâmbio dos diversos grupos, poderemos atingir melhor o todo da comunidade brasileira na Suíça”, diz.

A idéia é transformar o Conselho Brasileiro num instrumento que possa, inclusive, facilitar as relações bilaterais entres os governos da Suíça e do Brasil: “Com o Conselho, institucionalmente poderemos ter um peso maior na hora de tratar com os órgãos oficiais, tanto brasileiros quanto suíços. Não seremos apenas grupos isolados defendendo esta ou aquela bandeira, mas uma organização que pode representar, segundo estimativas, os 50 mil brasileiros espalhados em território helvético. E isso faz uma diferença muito grande”, aposta Irene.

swissinfo, Maurício Thuswohl, Rio de Janeiro

Sobre o Conselho:

“Estamos discutindo as questões que são relevantes, as tarefas que o Conselho deveria assumir e, principalmente, como viabilizar financeiramente a existência desse órgão representativo. E aí está o xis da questão. É ilusão pensar que, sem alguma fonte de financiamento mais ou menos estável, se consiga construir uma estrutura, ainda que simples e pequena, para fazer o Conselho funcionar”.

“Ainda estamos nessa fase de análise e não pretendemos dar um passo maior do que nossas pernas. A página do Conselho na internet já está em fase de construção e, a princípio, poderemos funcionar ‘virtualmente’, por telefone e por meio das representações regionais”.

Sobre as mobilizações:

“Mais importante do que as mobilizações previstas e a repercussão que elas possam ter nos diversos países e no Brasil, considero fundamental o trabalho de base que tem sido feito ao longo desses anos todos pelo jornalista Rui Martins e, mais recentemente, pelas associações e grupos brasileiros na Suíça, que abraçaram a causa e movimentaram meio mundo em prol dos nossos brasileirinhos”.

“Foi esse trabalho de formiguinha que possibilitou chegarmos a um Dia Internacional de Manifestação. Sem a colaboração de cada pessoa que falou com seus amigos, vizinhos, parentes e convenceu todos a assinarem os abaixo-assinados e sem a disposição das pessoas para trabalhar na organização do manifesto, nada teria acontecido”.

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