
Ofensiva israelense em Gaza deixa centenas de milhares de palestinos sem opções de fuga

O diretor do hospital Al Shifa na Cidade de Gaza coordenava neste sábado (20) a resposta à ofensiva de Israel sobre a localidade quando os corpos de seu irmão e sua cunhada, mortos em um bombardeio, foram transportados para a unidade de emergência.
“Fiquei chocado e devastado ao ver os cadáveres de meu irmão e de sua esposa”, declarou Mohamed Abu Salmiya, que trabalha na unidade de emergência do principal hospital do território palestino.
“Quando você recebe seus entes queridos como mártires ou feridos, percebe que tudo é possível”, disse à AFP.
Israel intensificou a grande ofensiva terrestre para tomar o maior centro urbano do território, apesar dos temores e da inquietação expressados pela comunidade internacional, que teme pela população local e pelo destino dos reféns israelenses.
O doutor Salmiya não é o único que enfrenta a morte de parentes. Um jornalista da AFP viu ambulâncias com sirenes chegando ao complexo hospitalar, transportando mais corpos de pessoas mortas nos bombardeios israelenses.
A Defesa Civil de Gaza – que opera sob a autoridade do governo do movimento islamista Hamas – relatou que pelo menos 87 pessoas morreram neste sábado em ataques israelenses contra o território, entre elas 70 na Cidade de Gaza.
Centenas de milhares de palestinos fugiram, mas outros permanecem bloqueados, exaustos demais para caminhar ou sem dinheiro para pagar as quantias elevadas necessárias para escapar em algum veículo.
Mohamed Nasar, de 38 anos, da área de Tal al Hawa na Cidade de Gaza, é um dos palestinos que permanece na cidade apesar de temer por sua esposa e suas três filhas. Segundo ele, faltam força e dinheiro para migrar: “Vamos esperar até o último momento”, afirmou.
O Exército israelense não respondeu imediatamente às solicitações de comentários da AFP sobre o balanço total de mortos, nem aos relatos sobre a morte dos familiares do doutor Salmiya.
– “Não temos dinheiro” para fugir –
Israel bombardeia a Cidade de Gaza por via aérea e também atinge com o fogo de seus tanques em sua ofensiva para tomar o que apresenta como um dos últimos redutos do Hamas.
A guerra estourou em 7 de outubro de 2023, quando comandos islamistas mataram em Israel 1.219 pessoas, a maioria delas civis, segundo uma recontagem da AFP com base em fontes oficiais.
A campanha de represália israelense matou mais de 65.100 palestinos na Faixa de Gaza, igualmente em sua maior parte civis, segundo números do Ministério da Saúde do território — governado pelo Hamas — que a ONU considera confiáveis.
A ONU e muitas potências instam Israel a deter sua operação por temores de que a ofensiva piore a crítica situação humanitária na Cidade de Gaza, onde a Classificação Integrada da Segurança Alimentar (IPC), um organismo apoiado pelas Nações Unidas, declarou em agosto que há fome.
O Exército lançou seu assalto terrestre na terça-feira e pediu aos moradores que se deslocassem para o sul da Faixa.
Muitos dos que fugiram afirmam que levaram mais de 12 horas para chegar às zonas do sul designadas pelo Exército.
Os custos de transporte dispararam, contam os que partiram. Proprietários de caminhões cobram a partir de 1.500 dólares (cerca de 8 mil reais) por um trajeto de aproximadamente 30 quilômetros.
A Defesa Civil palestina informou na sexta-feira que 450 mil palestinos abandonaram a Cidade de Gaza. Por sua vez, o Exército israelense estimou o número de deslocados em 480 mil, após alertar que usará uma “força sem precedentes” na operação.
No fim de agosto, a ONU estimou que cerca de um milhão de pessoas viviam nesta localidade e arredores.
O Exército insta os palestinos a se transferirem para uma “zona humanitária” em Al Mawasi, na costa, onde afirmou que terão ajuda, atendimento médico e infraestrutura humanitária.
Israel declarou a área como segura no início da guerra, mas também lançou ataques ali, alegando que tinha como alvo posições do Hamas.
“Queremos evacuar, mas não temos dinheiro”, explicou Raeda al Amarin.
“Nem sequer temos para comprar pão. O que se supõe que devemos fazer? Ficaremos aqui, seja até morrermos ou até alguém encontrar uma solução para nós”, suspirou.
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