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Acabou a boa vontade da indústria farmacêutica?

Jessica Davis Plüss

Há algo de errado quando as pessoas estão aproveitando uma euforia pós-vacina em um país e morrendo aos milhares em outro.

Os defensores da saúde pública previram que isso aconteceria em maio do ano passado, quando tentaram reunir países em torno da ideia de agrupar propriedade intelectual, know-how e tecnologia sobre medicamentos e vacinas contra a Covid-19. As grandes empresas se mostraram relutantes à ideia, e os governos se alinharam a elas, optando por manter as regras existentes sobre propriedade intelectual, numa tentativa de manter o dinheiro fluindo para pesquisa e desenvolvimento.

Desde então, as empresas têm atraído muita boa vontade, destacando como desenvolveram vacinas em tempo recorde, assinaram centenas de colaborações e doaram doses. Mas, um ano depois, as questões de propriedade intelectual ainda estão presentes. Elas voltaram aos holofotes na semana passada, quando os EUA anunciaram que apoiariam uma flexibilização das proteções de patentes de vacinas.

Então, qual é o grande problema das patentes? Há um consenso de que simplesmente dar as receitas das vacinas não resolverá a escassez, pelo menos não muito rapidamente. Um exemplo é a dificuldade da empresa suíça Lonza em recrutar trabalhadores para produzir a vacina Moderna. O diretor-executivo da Pfizer, Albert Bourla, chegou a argumentar que uma suspensão da patente poderia piorar os problemas de produção, se todos os países disputassem entre siLink externo todas as matérias-primas das vacinas.

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As patentes são mais do que um mero bloqueio prático – elas são a moeda de troca da indústria, como explicou Gaétan de Rassenfosse, um especialista suíço em inovação. Elas encorajam a indústria a investir em inovação, mas também mantêm o desequilíbrio de poder em seu favor. Algumas pesquisasLink externo mostram até mesmo que as patentes e os monopólios são os culpados pela escassez de algumas matérias-primas.

Uma coisa é clara em tudo isso – o sigilo não ajuda a acabar com as pandemias. Mais de um ano depois que a sequência genômica do vírus foi compartilhada, ainda não há uma noção clara de quanto dinheiro os governos investiram em pesquisas para tecnologias de vacinas, quanto pagaram por doses e quantas fábricas têm a capacidade de produzir vacinas.

À medida que os casos atingem um recorde na Índia, qualquer sinal de que as empresas estão guardando informações para si mesmas por interesse próprio não lhes ajudará em nada.

O que mais me chamou a atenção?

Esforços de empresas para erradicar o trabalho infantil podem estar piorando a situação. Meu colega Anand Chandrasekhar investigou se as normas internacionais sobre trabalho infantil, estabelecidas por políticos bem-intencionados, na verdade fazem mais mal do que bem. No contexto de uma fazenda pobre e familiar na África Ocidental, a proibição de certos tipos de trabalho piora a situação para as crianças, argumentou um especialista. Então, o trabalho infantil é realmente tão ruim assim?

Os leitores da SWI swissinfo.ch tinham opiniões mistas sobre a questão – um afirmou um inequívoco sim, enquanto outros disseram que as crianças deveriam pelo menos receber um salário de adulto e uma boa educação.

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Trabalho infantil é realmente ruim?

Este conteúdo foi publicado em O fracasso de um acordo para acabar com o trabalho infantil na indústria do cacau força o debate sobre o trabalho infantil.

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A questão da responsabilidade empresarial surge novamente. Em novembro, os eleitores rejeitaram a Iniciativa por Empresas Responsáveis em favor de uma contraproposta mais branda. Mas será que ela vai longe o suficiente? A Alemanha e a UE estão avançando com suas próprias propostas para reprimir o abuso corporativo, o que poderia deixar a Suíça um passo atrás de seus vizinhos.

O Neue Zürcher Zeitung aponta que as propostas europeias se assemelham mais à iniciativa original quando se trata das devidas diligências. O governo suíço prometeu aos eleitores que se alinharia às regras da UE. Ele pode, então, sofrer uma pressãoLink externo para endurecer alguns aspectos antes de julho, quando as consultas sobre a contraproposta terminarão.

LafargeHolcim sob pressão dos sindicatos por causa de terceirização. Vários sindicatos emitiram uma declaração conjunta no início de maio apelando para que a empresa de cimento suíça acabe com o “uso extremo de mão de obra terceirizada”, o que eles afirmam levar a salários mais baixos e menos proteções para os trabalhadores. A declaração veio alguns dias antes de a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) responder a uma reclamação apresentada ao Ponto de Contato Nacional Suíço em 2019 sobre o uso de terceirizaçãoLink externo pela LafargeHolcim, e outras questões trabalhistas em sua fábrica em Davao, nas Filipinas. Nenhuma conclusão conjunta foi alcançada, mas a OCDE deu à empresa muito o que refletir.

Comentários ou dicas? Mande-me uma mensagem: jessica.davis@swissinfo.ch

Obrigada por ler.

Adaptação: Clarice Dominguez

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