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Famílias não conseguem mais pagar os seguros de saúde

O aumento constante dos prêmios de saúde tornou-se a principal preocupação na Suíça, conforme demonstra uma pesquisa de opinião da televisão pública. Keystone / Martin Ruetschi

Na Suíça, os indivíduos arcam com um quarto dos custos de saúde. O aumento nas mensalidades do seguro de saúde, anunciado para 2024, vai pesar ainda mais no seu orçamento, mas o sistema é complexo demais para ser reformado.

Todos os anos, a história é a mesma: os custos com a saúde aumentam e, com eles, a mensalidade dos planos de saúde. Esses aumentos incessantes se tornaram a preocupação número um dos suíços. Com as eleições legislativas deste domingo 22 de outubro, o problema também animou os debates políticos. Os partidos competem em criatividade para tentar reformar o sistema de saúde suíço, mas as soluções não são simples.

O fato das famílias suíças terem de arcar com uma parte significativa dos custos de saúde é inerente ao sistema suíço. Todas as pessoas que residem no país são obrigadas a contratar um seguro básico de saúde. Para isso, é necessário pagar uma mensalidade fixa.

Soma-se a isso o fato de que o seguro de saúde não reembolsa todas as despesas com saúde. A pessoa assegurada deve pagar do próprio bolso uma quantia anual, chamada de franquia, e 10% dos custos que excedem esse valor, conhecidos como quota-participação e limitados a 700 francos suíços.

Assim, um quarto do sistema de saúde suíço é financiado diretamente pelos pacientes, conforme mostrado no gráfico abaixo, com base nos números da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Essa proporção é maior do que a média dos países da OCDE. Para efeito de comparação, na França, apenas 9,3% das despesas com saúde são de responsabilidade das famílias. Na Alemanha, essa parcela representa 12,7% e na Itália, 23,3%.

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Carlo De Pietro, economista especializado no sistema de saúde suíço, constata que a parcela dos custos com saúde assumida pelos indivíduos na Confederação aumentou apenas ligeiramente ao longo dos anos. “Ela tem sido alta desde que a Lei Federal de Seguro de Saúde (LAMal) entrou em vigor em 1996. Nesse aspecto, a Suíça tem uma posição única na Europa”, explica ele.

Sistema baseado na responsabilidade individual

Carlo De Pietro estima que se trata de uma escolha social baseada na responsabilidade individual, “uma espécie de totem na Suíça”. “Como um país rico, a Suíça poderia se dar ao luxo de socializar mais os custos com saúde, mas também pode se dar ao luxo de colocar uma parte significativa deles sobre os ombros das famílias, porque muitas delas são ricas”, diz ele.

Aos olhos do economista, a particularidade do modelo suíço reside, contudo, no fato de que todas as pessoas que vivem na Suíça devem pagar prêmios de seguro de saúde obrigatórios, que não dependem da renda familiar ou dos recursos financeiros do lar. “Isso é uma exceção no mundo. Em quase todos os outros países, as contribuições são proporcionais à renda das famílias e, muitas vezes, o sistema é financiado por impostos”, explica ele.

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Médicos operando um paciente

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O sistema de saúde suíço brevemente explicado

Este conteúdo foi publicado em O sistema de saúde suíço é uma mistura entre setores público e privado: as companhias de seguros de saúde privados operaram num mercado altamente regulado. Prestadores de serviços, como médicos e hospitais, são parcialmente privados, parcialmente estatais. Adicionado a isso: a saúde é, na verdade, uma questão dos cantões, mas certas coisas são legalmente regulamentadas…

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Acesso igualitário à saúde

A vantagem do sistema helvético é que ele permite que todo mundo tenha o mesmo acesso aos cuidados de saúde. “Uma pessoa pobre com um problema neurológico consultará o mesmo neurologista que alguém da classe média, e será igualmente fácil conseguir uma consulta”, observa Carlo De Pietro.

O economista também salienta que a cobertura oferecida pelo seguro de saúde obrigatório é ampla em comparação internacional. Cobre 44,3% dos custos com saúde, uma proporção superior à média da OCDE, também segundo dados da OCDE.

“Temos um sistema luxuoso”, ressalta Carlo De Pietro. No entanto, ele aponta a dificuldade de financiar tal sistema, fazendo com que ricos e pobres paguem em partes iguais. “É como obrigar os pobres a comprar um carro de luxo”, compara o especialista. 

Uma conta alta demais para muitos

Como resultado, uma grande parte da população não consegue ou tem dificuldade em pagar os prêmios do seguro de saúde obrigatório. Émilie Rosenstein, diretora do observatório das precariedades da Escola Superior de Serviço Social e Saúde de Lausanne, concorda: “Os prêmios do seguro-saúde são uma das despesas que pesam cada vez mais no orçamento das famílias, e podem gerar dificuldades financeiras ou até mesmo o endividamento”.

As autoridades públicas devem, assim, ajudar mais de um quarto da população. Elas concedem a essas pessoas um desconto nas mensalidades, sob a forma de subsídios. A taxa de beneficiários dessas ajudas permanece relativamente estável, variando entre 25% e 30% dependendo do ano.

No entanto, em vista da explosão dos custos com saúde, a Confederação e os cantões precisam desembolsar cada vez mais dinheiro para financiar as reduções nas mensalidades. De acordo com o Departamento Federal de Estatística, os valores pagos pelas autoridades públicas aumentaram quase 70% em quinze anos, passando de cerca de 3,2 bilhões em 2005 para mais de 5,4 bilhões em 2021 (veja o gráfico abaixo)

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Por enquanto, os subsídios são um dos únicos instrumentos disponíveis para ajudar as pessoas seguradas a pagar suas mensalidades. O outro instrumento diz respeito apenas às pessoas que recebem benefícios suplementares, ou seja, auxílios estatais destinados a complementar aposentadorias ou pensões por invalidez insuficientes e a cobrir despesas médicas.

“Os subsídios não são, assim, uma exceção, mas fazem parte do sistema”, constata Carlo De Pietro. E como as despesas com saúde aumentam muito mais rapidamente do que os salários, ele adverte que o número de pessoas em dificuldades deve continuar a crescer no futuro.

Auxílios variam de região para região

Os subsídios são financiados pela Confederação e pelos cantões. Os cantões podem definir por si própriosLink externo o círculo de pessoas que tem direito a esses descontos na mensalidade e qual o valor desses descontos. Como resultado, há grandes disparidades entre as diferentes regiões do país.

Por exemplo, nos cantões de Vaud e Genebra, 36% da população se beneficia deles, de acordo com uma reportagem recenteLink externo da RTS. Isso permite, portanto, apoiar famílias mais modestas, bem como parte da classe média.

No entanto, os cantões que enfrentam dificuldades financeiras tendem a reduzir os orçamentos alocados para a redução das mensalidades. Em Jura, por exemplo, 40% dos segurados recebiam subsídios em 1997, em comparação com 28% atualmente.

Aumentar os auxílios ou reduzir os benefícios

“A verdadeira solução, mas também a mais difícil, seria abrandar o crescimento dos custos com saúde”, ressalta Carlo De Pietro. Os preços, de fato, aumentam de maneira quase irremediável. “Avanços tecnológicos e o envelhecimento da população são fatores que impulsionam o aumento dos custos com saúde e são difíceis de influenciar”, explica o especialista.

O economista identifica duas outras opções a fim de melhorar o sistema: “A primeira consiste em aumentar a parcela dos custos diretamente cobertos pelos regimes públicos, por meio de impostos. A outra opção é não modificar o sistema, mas conceder mais subsídios para ajudar as pessoas que não conseguem pagar suas despesas com seguro de saúde”.

Essas vias são apoiadas pela esquerda do espectro político. Notadamente, o Partido Socialista lançou uma iniciativa que demanda que ninguém tenha que pagar mais do que 10% de sua renda disponível para seguros de saúde. Para isso, ele propõe que a Confederação e os cantões contribuam mais para a redução das mensalidades.

A direita, por outro lado, defende antes uma redução nos benefícios. Em maio passado, o Partido Liberal-Radical (PLR) propôs a criação de um seguro “low cost”. A ideia é substituir o atual sistema de mensalidades fixas, que dá ao segurado o direito de “consumir tudo”, por um menu “à la carte”.

Adaptação: Karleno Bocarro

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