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Para além da COP30: Zurique traz Lygia Clark e brasileira ganha um ‘Nobel’ em Genebra

Protestos e piquetes de ativistas indígenas chamaram mais atenção fora do que dentro do Brasil. As críticas mais contundentes, porém, se deram contra o acesso privilegiado de lobistas da indústria de combustíveis fósseis à conferência.
Protestos e piquetes de ativistas indígenas chamaram mais atenção fora do que dentro do Brasil. As críticas mais contundentes, porém, se deram contra o acesso privilegiado de lobistas da indústria de combustíveis fósseis à conferência. Keystone-AP/Fernando Llano

A COP30 atraiu as atenções da semana, e elencamos aqui cinco destaques do noticiário suíço. Mas, enquanto isso, Zurique recebe a mais completa retrospectiva da artista Lygia Clark, e a ativista brasileira Ana Paula Gomes de Oliveira ganhou o prêmio Martin Ennals, o "Nobel" dos direitos humanos.

Assim como seus pares em todo mundo, a cobertura da Conferência da ONU para o Clima que ocorre em Belém pela imprensa suíça também destacou a presença maciça de lobistas da indústria de combustíveis fósseis, o discurso de LulaLink externo criticando os negacionistas do clima, a presença de algumas personalidades mundiais, como o presidente francês Emanuel Macron e o governador da Califórnia Gavin Newson, e a ausência de outras, como Donald Trump e Xi Jinping.

Porém, para além da “caixinha”, as mídias suíças miraram a participação do país na conferência, como o aporte da Suíça para o Fundo Amazônia. Não passou batido o fato de o conselheiro federal Albert Rösti viajar a Belém num jatinho privado. Além disso, destaques para a diva Fafá de Belém, e uma reportagem investigando se a indústria do açaí representa uma ameaça ou oportunidade para a Amazônia.

COP30 #1: Lobistas demais

Em Belém, há mais representantes da indústria fóssil do que de países vulneráveis, estampa a manchete do portal Blue News, ecoando as de outras mídias. Pelo menos 1602 lobistas das indústrias de petróleo, gás e carvão estão oficialmente credenciados na reunião da ONU no Brasil.

Os lobistas têm mais passes de acesso do que todas as delegações dos dez países mais vulneráveis ao aquecimento global. Trata-se do Chade, Níger, Ilhas Salomão, Micronésia, Guiné-Bissau, Sudão, Somália, Tonga, Serra Leoa, Somália e Eritreia. Juntos, eles somam apenas 1061 delegados em Belém.

Muitas vezes, esses lobistas pertencem a associações comerciais ou econômicas que podem enviar “observadores” às conferências climáticas. 164 lobistas foram credenciados diretamente pelas delegações governamentais. A França, por exemplo, tem em sua delegação oficial 22 representantes do setor de combustíveis fósseis, incluindo cinco da TotalEnergies. E um total de 599 dos cerca de 1.600 lobistas têm uma acreditação “Party Overflow”, o que lhes dá acesso aos círculos internos de negociação.

A coalizão formada por dezenas de organizações ambientais e climáticas exige agora que as Nações Unidas excluam os grandes poluidores das cúpulas climáticas, para que eles não possam influenciar os delegados a portas fechadas, nos corredores ou em reuniões informais.

O argumento: seus interesses de lobby contradizem fundamentalmente a missão da conferência climática, estabelecida pelo direito internacional, de conter o aquecimento global. Além disso, todos os participantes deveriam ser obrigados a divulgar suas fontes de financiamento e potenciais conflitos de interesse, a fim de garantir a transparência.

Na edição anterior da COP, em Dubai, mais de 2.450 lobistas do setor fóssil foram credenciados – um recorde. Em comparação, o número de participantes na COP30 é agora menor, ficando abaixo do cúpula do ano passado no Azerbaijão. Mas a proporção relativa de lobistas aumentou: agora, em Belém, há quase um lobista para cada 25 delegados.

Fonte: BluewinLink externo (em alemão); BlickLink externo (em francês), em 14.11.2025.

COP30 #2: Rösti à jato

Para a segunda semana da conferência climática no Brasil, o conselheiro federal Albert Rösti voará no jato particular do Executivo suíço para as negociações. Este jato, um Bombardier Global 7500, emite 5,4 toneladas de CO2 por hora – ou seja, para transportar o ministro, serão emitidas 108 toneladas de CO2.

O jato foi apresentado no início deste ano. De acordo com o fabricante, ele não só possui um “interior luxuoso”, mas também a cabine mais longa da sua classe.

O ministro Albert Rösti, do partido de direita SVP (UDC em francês), é um dos sete membros do Executivo federal, e acumula as pastas do Meio-Ambiente, Transporte, Energia e Comunicações.
O ministro Albert Rösti, do partido de direita SVP (UDC em francês), é um dos sete membros do Executivo federal, e acumula as pastas do Meio-Ambiente, Transporte, Energia e Comunicações. Keystone

O voo do ministro é seu segundo passo em falso em relação à conferência. Na semana passada, o anúncio de que o ministro viajaria a Belém acompanhado de um executivo da empresa química Syngenta já havia gerado diversas críticas.

Em um comunicado à imprensa divulgado em outubro, o governo federal declarou que a Suíça se empenharia na conferência climática para que, especialmente os países com altas emissões de gases de efeito estufa, estabelecessem novas metas ambiciosas de redução e adotassem medidas eficazes para cumprir a meta de 1,5 grau. É questionável como o voo de Rösti em jato particular se coaduna com isso: o restante da delegação suíça já viajou para o Brasil em um voo regular na classe econômica.

Na enquete que acompanha a notícia no portal 20Minuten, o voo de Rösti pegou mal: 35% responderam que ele deveria dar exemplo e viajar com a delegação; outros 25% acham a atitude do ministro “hipócrita”. Mas 30% dos leitores acham que a posição de ministro justifica a regalia.

Fonte: 20MinutenLink externo, 14.11.2025 (em alemão).

COP30 #3: A esmola suíça

A Suíça vai doar 5 milhões de francos ao Fundo para a Amazônia. Trata-se da segunda contribuição da Confederação para esse fundo, após uma primeira verba de 5 milhões em 2023.

O anúncio foi feito na segunda-feira durante a conferência da ONU sobre o clima em Belém, no Brasil, informou um porta-voz da Secretaria de Estado da Economia (SECO). Esse fundo, criado em 2018, ajuda o Brasil a reduzir as emissões de gases de efeito estufa causadas pelo desmatamento e a promover alternativas econômicas sustentáveis, explicou o porta-voz.

Fonte: BlickLink externo, 11.11.2025 (em francês)

COP30 #4: Zum de besouro, imã

Cestas de açaí à venda na Feira do Açaí, no mercado Ver o Peso, em Belém.
Cestas de açaí à venda na Feira do Açaí, no mercado Ver o Peso, em Belém. Copyright 2023 The Associated Press. All Rights Reserved

No mercado do porto de Belém, uma pequena baga roxa chega por barco e é comercializada entre pequenos produtores e outros membros da cadeia produtiva. A baga de açaí, que o mundo começou a descobrir no início dos anos 2000, está passando por um desenvolvimento fulgurante. Entre 2009 e 2019, sua produção registrada multiplicou-se por 10.

O açaí cresce naturalmente nas zonas úmidas da Amazônia. Para as populações locais que o cultivam desde sempre, essa fruta permite mostrar que é possível estabelecer uma economia baseada em uma floresta que não é destruída.

Para atender à demanda, outros métodos de cultivo foram desenvolvidos. Em vez de colher a fruta nas árvores que crescem naturalmente nas zonas úmidas, palmeiras podem ser plantadas em áreas menos irrigadas, em terra firme, no lugar de outras espécies. E de forma mais densa para aumentar a rentabilidade.

Às vezes se fala em “açaízação”, mas esse método mostrou suas limitações: o cultivo em terra firme requer uma quantidade incrível de água, da ordem de 120 litros por dia e por pé. Além disso, pessoas que praticavam a monocultura perceberam que a produtividade desses espaços acaba diminuindo.

Embora seu sucesso internacional possa prometer um destino semelhante ao da quinoa, do cacau ou do matcha, que sofrem com a forte demanda que perturba os mercados, o açaí está suficientemente enraizado na cultura local para resistir às turbulências.

Contraintuitivamente, a visibilidade internacional do açaí estimulou a economia circular e local. Um “círculo virtuoso” mantido principalmente graças ao consumo local, que continua predominante: apenas 5% do açaí é consumido fora das fronteiras brasileiras.

Fonte: Le TempsLink externo, 10.11.2025 (em francês)

COP30 #5: A divina Fafá

Entre as personalidades que participam da COP30 está Fafá de Belém, estrela da música brasileira e fervorosa defensora da Amazônia.

Maria de Fátima Palha de Figueiredo, seu nome verdadeiro, tornou-se, em cinquenta anos de carreira, uma verdadeira embaixadora de Belém, capital do estado do Pará, de onde tirou seu nome artístico. Com trinta álbuns e quinze milhões de discos vendidos, Fafá de Belém, aos 69 anos, continua a encarnar os ritmos da sua região natal, inspirados em sonoridades caribenhas como o calypso, o zouk ou a cumbia.

Em Belém, não se fala de samba ou bossa nova, mas de lambada, brega ou carimbó. O carimbó, gênero musical local, é classificado como patrimônio imaterial da UNESCO.

>> Veja aqui entrevista com a cantora, produzida pela plataforma oficial do governo brasileiro para a COP30:

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Fafá de Belém começou sua carreira nas ruas de sua cidade natal no início dos anos 1970, antes de alcançar o sucesso em 1975 com seu primeiro single, “Filho da Bahia”. Essa música, usada como tema de uma novela da rede nacional TV Globo, lhe rendeu fama imediata em todo o Brasil e até mesmo em Portugal.

Sua voz de mezzo-soprano levemente rouca, seu sorriso contagiante e seu status de sex symbol contribuíram para torná-la uma figura incontornável da música brasileira. Mas Fafá de Belém é muito mais do que uma simples cantora.

Em 1984, quando a ditadura militar vivia seus últimos meses no Brasil, ela se tornou a figura de proa do movimento em favor das eleições livres. Fafá de Belém tornou-se porta-voz do movimento ao cantar o hino nacional em manifestações por todo o país.

Há três anos, ao participar de uma reunião preparatória da COP30 em Nova York, ela ficou chocada ao constatar a ausência de representantes da Amazônia. Em resposta, ela criou o Fórum Varanda da Amazônia, uma espécie de COP dissidente que reuniu no mês passado mais de mil participantes para sua terceira edição.

Fafá de Belém pretende aproveitar o fato de a conferência da ONU sobre o clima ser realizada em sua terra natal para que não apenas sua voz seja ouvida no show que ela dará no dia 14 de novembro, intitulado “Amazonica”, mas também a de toda a Amazônia.

A cantora brasileira não estará presente na COP30 apenas para cantar, mas também para defender a Amazônia, sua região de origem. Seu engajamento e notoriedade fazem dela uma voz importante para levar adiante as questões climáticas e ambientais dessa região crucial para o equilíbrio ecológico mundial.

Fonte: RTSLink externo, 14.11.2025 (em francês).

Lygia Clark, Artur Lescher e a conexão concretista Brasil-Suíça

Lygia Clark com sua "Obra Mole", 1964
Lygia Clark com sua “Obra Mole”, 1964 Photo: Sérgio Zalis © Associação Cultural O Mundo de Lygia Clark

Dois artistas brasileiros estão ligados aos concretos de Zurique e, em especial, a Max Bill. Atualmente, suas obras podem ser vistas na Haus Konstruktiv e na Kunsthaus Zürich. Destaca-se o vencedor do Zurich Art Prize 2025, Artur Lescher.

Já na década de 1930, havia uma corrente na arte brasileira que, inspirada pelos construtivistas russos e holandeses, se dedicava a formas geométricas concretas. Essa incursão no experimental refletia o forte impulso da industrialização e urbanização do país, mas, a princípio, não encontrou ressonância na arte.

Somente com o fim do regime autoritário do ditador Getúlio Vargas, por volta de 1945, a cultura e a sociedade se abriram para uma modernização fundamental, na qual as vanguardas também encontraram seu lugar. A arte e a arquitetura do Brasil deram forma e expressão a essa nova era, tanto na continuação das abordagens modernistas da década de 1930 quanto no intenso intercâmbio com os desenvolvimentos na Europa.

Max Bill (1908–1994), considerado um dos concretos de Zurique, inscreveu-se na cena artística brasileira em 1951 com sua exposição individual no Museu de Arte de São Paulo e sua participação na 1ª Bienal de São Paulo. Suas influências são diversas e evidentes, sobretudo na obra de Lygia Clark (1920–1988), que se tornou a grande dama da vanguarda brasileira.

Assim como Max Bill, Lygia Clark, em seus primeiros trabalhos, a composições geométricas e seriais e, assim como ele, é uma eminente designer espacial, que pensa e trabalha fortemente em categorias esculturais e arquitetônicas.

O Museu Haus Konstruktiv explora essas relações com a exposição “Neoconcretismo”, que apresenta Max Bill e Lygia Clark em salas adjacentes. Mas enquanto o Kunsthaus Zürich organiza simultaneamente uma grande retrospectiva sobre Clark, coordenada com o Haus Konstruktiv, a brasileira é, por assim dizer, o programa paralelo à grande apresentação de seu compatriota Artur Lescher (*1962), vencedor deste ano do “Zurich Art Prize”, na casa que cultiva a herança dos concretos de Zurique.

Fonte: Urs Meier no Journal21.chLink externo, 14.11.2025 (em alemão).

Brasileira leva o ‘Nobel’ dos direitos humanos

Ana Paula Gomes de Oliveira
Ana Paula Gomes de Oliveira Keystone/ ATS

A ativista afro-brasileira contra a violência policial, Ana Paula Gomes de Oliveira, é a vencedora deste ano do Prêmio Martin Ennals, em Genebra. Ela receberá seu prêmio no dia 26 de novembro, informou na segunda-feira a Fundação que administra este ‘Nobel’ dos direitos humanos.

Oliveira cofundou o coletivo “Mães de Manguinhos” após o assassinato de seu filho de 19 anos em uma favela, morto a tiros pelas costas por um policial militar quando voltava da casa de sua namorada. “Ela deu tanto, depois de ter perdido tanto”, afirmou o presidente do júri, Hans Thoolen.

E acrescentou que “a violência racista que assola as ruas do Brasil merece toda a atenção do governo federal e da comunidade internacional”. A abordagem da polícia contra os narcotraficantes, que muitas vezes causa dezenas de mortos, provoca regularmente a reprovação da ONU.

Além de Oliveira, uma estudante ugandense que luta contra a corrupção foi finalista do prêmio este ano, junto com uma ativista tunisiana dos direitos humanos que continua detida arbitrariamente.

Fonte: BluewinLink externo, 10.11.2025 (em francês).

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