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Os negócios escusos com prostitutas brasileiras

O processo contra proxenetas ocorre no Tribunal Federal Penal em Bellinzona. Ti-Press / Carlo Reguzzi

No Tribunal Federal Penal em Bellinzona (su), cinco pessoas, dentre elas o proprietário de um bordel, estão sendo processadas por favorecimento à prostituição e tráfico humano.

O processo revela como funciona o negócio de trazer brasileiras à Suíça para se prostituir.

O acusado de 60 anos é açougueiro de profissão. Quando seus amigos depõem frente ao juiz como testemunhas, a impressão é que se trata de um pessoal jovial e amigável. O único problema é seu hábito de beber demais. As mulheres que ele trazia ao restaurante, conta o proprietário, eram sempre divertidas e alegres.

Porém uma imagem completamente diferente é dada de H. (n.r.: nome conhecido pela redação), quando ex-prostitutas depõem sobre ele. H. seria o proprietário de três bordéis no cantão de Solothurn (centro): um em Olten e os outros dois nos arredores da cidade. A Procuradoria Federal, responsável pela acusação contra H. e os outros quatro coautores, está convencida que ele ocultou sua verdadeira relação com os negócios.

Desde o início dessa semana os acusados estão sentados no banco de réus no Tribunal Federal Penal em Bellinzona. Concretamente são acusados de ter aliciado 150 jovens mulheres brasileiras da região de Belo Horizonte, em grande parte de bairros pobres, entre 2001 e 2006, para explorá-las em bordéis.

Em parte, algumas dessas mulheres foram enganadas sobre as atividades que estariam exercendo na Europa. Outras sabiam antes da viagem que iriam se prostituir. A prostituição é uma atividade legal na Suíça.

Dívidas para pagar 

Indiscutível é o esquema em que a quadrilha operava. Nele, as mulheres que já haviam trabalhado como prostitutas na Suíça aliciavam amigas ou conhecidas. Para isso recebiam comissões em dinheiro.

Novas mulheres, que queriam ou deveriam vir à Suíça, recebiam passagens aéreas e um adiantamento em dinheiro para se apresentarem como turistas ao entrar no país no aeroporto. Alguém esparava e de lá Lá elas eram levadas diretamente para os bordéis. O proprietário H. lhes confiscava o passaporte e a passagem de volta para impedir sua fuga, como acusa a Promotoria.

A razão: elas precisavam pagar as dívidas contraídas a partir do momento em que chegavam ao país. Pelo passagem aérea e outras despesas, H. calculava nove mil francos (US$ 9.718). Algumas vezes o valor poderia ser consideravelmente maior. Do dinheiro que faziam nos bordéis, as prostitutas eram obrigadas a entregar a metade, acrescidos de 20 francos diários. A outra metade era utilizada para o pagamento das dívidas.

Dessa forma, as mulheres permaneciam muito tempo sem receber um centavo. Para poder enviar dinheiro às suas famílias, elas precisavam contrair novas dívidas. O pagamento delas poderia durar meses. H. explicou no tribunal que os custos efetivos da viagem eram de quatro mil francos por pessoa. Devido à fuga de algumas das mulheres, suas dívidas foram transferidas pelo proxeneta às outras.

Consciente ou inconscientemente? 

Uma dos pontos primordiais no processo é determinar se as brasileiras sabiam em que negócio estavam se envolvendo. Pelo menos em relação ao tratamento das despesas de viagem apresentadas, isso parece ser o caso. Porém muitas vezes elas não sabiam avaliar o valor de 10 mil francos, por exemplo.

O Promotor citou o seguinte testemunho: “Então ele me deu um papel, onde estava escrito que eu lhe devia 10.000 CHF. Eu não sabia o que isso significava. Quando me explicaram que isso valia 30 mil reais, tive uma crise de nervos. Eu disse então que queria voltar imediatamente ao Brasil. Nós discutimos sobre a questão. Ele me disse que eu teria que ficar aqui e pagar essas dívidas.”

Outra controvérsia é descobrir se as mulheres foram, em parte, escondidas ou mantidas em cárcere privado. Para a Promotoria isso está provado. Os advogados de defesa veem na cerca de madeira e circuitos internos de TV uma proteção às prostitutas, pois nos bordéis já teriam ocorridos assaltos. Além disso, eles também refutaram a acusação de que passaportes tenham sido confiscados das prostitutas.

Promotoria pena pena de 8 anos e meio de prisão

Para o Promotor Vincens Nold, a culpa dos acusados está provada. Ele pede para o principal acusado, H., oito anos e meio de prisão por favorecimento da prostituição, tráfico humano e encarceramento, solicitando ao mesmo tempo que a pena seja executada de imediato. Para os outros acusados, entre eles três brasileiras – das quais duas não comparecem ao processo – ele pede penas de prisão entre 2,5 e 3 anos

Vincens Nold acusa o proprietário do bordel de ter agido somente por ganância. H. é acusado de ter forçado as mulheres de forma desumana à prostituição. Durante todo o decorrer do processo ele não demonstrou nenhum remorso ou sentimento de ter cometido uma injustiça.

Já Rolf Liniger vê a situação de forma diferente. Durante várias horas, o advogado de defesa do principal acusado argumentou que as mulheres teriam vindo voluntariamente do Brasil e já sabiam o que lhes esperava. Essa era a intenção delas, sendo que muitas já haviam vindo várias vezes à Suíça.

Por isso ele refuta a acusação de tráfico humano, mesmo se lamenta as condições de trabalho dessas mulheres. Ele pede absolvição de seu cliente das demais acusações, com exceção da lavagem de dinheiro. Uma vez H. trocou conscientemente dinheiro do tráfico de drogas para uma amiga. Nesse caso a pena de prisão de seis meses em condicional já seria suficiente, já que o cliente cumpriu 487 dias de prisão sob custódia.

O veredicto do processo, que é um dos mais importantes casos supostamente ligados a  tráfico de seres humanos, será pronunciado em 1° de dezembro de 2011.

O Código Penal Suíço trata do tráfico de seres humano no artigo 182. Os dois primeiros parágrafos determinam:

1) Qualquer fornecedor, intermediário ou cliente de um serviço que envolve uma pessoa no comércio para fins de exploração sexual ou exploração de sua força de trabalho ou para a remoção de um órgão do corpo, será punido com pena de prisão ou multa. Recrutar uma pessoa para esses fins é igual ao comércio.

2) Tratando-se da vítima de um(a) menor de idade ou o autor atua com fins comerciais, então a pena de prisão está acima de um ano.

O artigo 195 do Código Penal Suíço prevê:

Qualquer um que tire partido da dependência de uma pessoa ou de vantagens financeiras para levá-la à prostituição,

Quem limita a liberdade de uma pessoa que exerce a prostituição ou tem influência, ou controla o exercício dessa atividade ou determina seu exercício em local, hora ou quantidade ou outro contexto da prostituição,

Quem mantém uma pessoa na prostituição será punido com uma pena de prisão de até dez anos ou multa.

Adaptação: Alexander Thoele

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