O músico que se tornou prefeito de St. Moritz
Um novo vento sopra em St. Moritz. O povo do vilarejo elegeu como prefeito Christian Jott Jenny, um político diferente dos outros. Sua promessa é modernizar a famosa estação de esqui nos Alpes suíços. E como primeiro projeto: direito de voto aos estrangeiros residentes no local.
O prefeito chega trajando sapatos brancos, terno azul e um lenço vermelho pregado no bolso. Christian Jott JennyLink externo sobe no palco.
O novo prefeito de St. Moritz assumiu o cargo no início do ano. Nessa noite, no pomposo salão de teatro do Hotel Rainha Vitoria, com os seus grandes lustres e pinturas de teto, ele apresenta o projeto de uma nova constituiçãoLink externo local. Ao explicar as mudanças, anuncia a primeira surpresa: em St. Moritz estrangeiros devem ter o direito de votar e ser votados.
Isso tornaria a famosa estação de esqui um dos poucos lugares na Suíça a conceder direitos políticos aos estrangeiros residentes. Porém a nova constituição ainda deve ser votada pelos eleitores de St. Moritz, o que deve ocorrer no mais tardar em 2020.
Estrangeiros nas urnas
Dois mil dos cinco mil habitantes de St. Moritz não têm o passaporte vermelho com a cruz branca. A proporção de estrangeiros residentes é de 41%, muito maior do que a média nacional, que é de 25%. Sem essa mão-de-obra especializada, nada funcionaria na região. Agora o prefeito quer dar a esses cidadãos o direito de voto. E não apenas a possibilidade de votar em candidatos ao governo local, mas também de se apresentar como candidato a cargos políticos (direito de voto ativo e passivo).
Os Grisões é um dos únicos três cantões na Suíça que permite às comunas (municípios) dar o direito de voto a estrangeiros. Cinco cantões na parte ocidental da Suíça tornaram obrigatório o direito de voto para os estrangeiros em nível comunal. Jura e Neuchâtel são os únicos cantões que oferecem adicionalmente o direito de voto para estrangeiros a nível cantonal (estadual).
Este é o primeiro grande projeto do prefeito recém-eleito de St. Moritz. Antes de ser político sua área de atuação estava mais voltada à cultura. Ainda criança Jenny foi membro do famoso coro austríaco de crianças, os “SängerknabenLink externo“. Depois, já adulto, fez uma formação de tenor de ópera.
Depois se tornou diretor artístico do “Festival de JazzLink externo“, um evento que organiza há doze anos em St. Moritz e que já trouxe aos palcos locais estrelas como Norah Jones, Chick Corea ou Diana Krall, por exemplo.
Abrir novas portas
Em agosto do ano passado, Jenny decidiu “assumir” o poder no vilarejo e transformar a sua imagem, tanto interna como o externamente. St. Moritz ainda desperta na mente de muitas pessoas a imagem de estação de luxo mundana, frequentada por turistas russos em casacos de pele e com copos de champanha em mãos, gastando grandes quantidades de dinheiro nas lojas chiques. Porém isso não agrada o novo prefeito. “Quando as pessoas pensam em St. Moritz, deveriam imaginar um lugar onde é possível fazer mais”, declara Jenny.
Muitos se surpreenderam quando o animador cultural foi eleito em outubro de 2018. Em primeiro lugar, era um candidato independente sem nenhuma experiência política. Em segundo, por ser originário de Zurique e não um “nativo” do vilarejo, era visto pelos habitantes como “estrangeiro”, mesmo apesar de estar radicado há anos em St. Moritz e pagar lá seus impostos.
“Todos imigraram”
“Não gosto da expressão ‘nativo'”, ressaltou o prefeito durante a entrevista dada em um restaurante de Zurique, uma cidade que ainda gosta de frequentar. “Ela é racista. Toda a região é feita de imigrantes”, defende.
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Estrangeiros em St. Moritz poderão votar em temas locais
O fato de não ser “nativo” de St. Moritz é considerado por ele como uma vantagem. Razão: é uma condição que lhe dá mais independência e liberdade política. Como prefeito chegou até a cantar ópera na recepção de ano novo, acompanhado pelo piano que se encontra no seu escritório.
As solenidades locais já não se realizam sob a luz fria em uma sala polivalente da prefeitura, mas sim em salão pomposo de um dos primeiros hotéis de St. Moritz. “Meu partido são os convidados, os turistas e os jovens que vivem nela. Sistematicamente não vou a nenhuma reunião das seções locais dos partidos, nem sequer às da aliança “Próxima GeraçãoLink externo“, da qual pertenço.
Terceira geração
O grupo “Próxima Geração” foi criado durante o verão de 2018 para apoiar Jenny. O nome refere-se aos seus membros, dos quais muitos são representantes da “futura geração” de famílias hoteleiras.
Esses jovens começam a assumir a direção dos seus estabelecimentos e passam a querer opinar sobre o desenvolvimento de St. Moritz. Claudia Aerni, do Hotel Corvatsch, e Nicolas Hauser, do Hotel Hauser, são alguns deles. Ambos foram eleitos com Jenny e fazem parte hoje do Conselho Municipal, o órgão legislativo local, no qual 17 vereadores votam as novas leis e projetos.
Daniela Märky, diretora administrativa do Hotel Steffani, também pertence à essa nova geração. A jovem suíça declara abertamente seu voto em Jenny, assim como muitos outros amigos, especialmente os que trabalham na indústria do turismo. “Ele é uma pessoa arrojada que vai trazer mudanças à St. Moritz.”
Imagem chamuscada
“St. Moritz não prestou atenção nas questões mais importantes e acabou sendo ultrapassada”, diz. A jovem hoteleira tem uma sugestão: ela defende a revitalização imediata do centro do vilarejo e transformá-lo em uma área exclusiva para pedestres.
A globalização traz novos desafios. “Hoje os concorrentes diretos de St. Moritz não são Zermatt ou Gstaad, mas sim Ilhas Maurício, Nova Iorque ou a região da Toscana, na Itália”, afirma Märky. Os turistas modernos têm mais mobilidade e tendem a decidir espontaneamente via online onde irão passar as próximas férias.
“Vivemos do turismo”
Jenny vê nessa questão um desafio central. “Quase a totalidade da população de St. Moritz vive do turismo”, diz. No século 19 os turistas ficavam de dois a três meses na estação de esqui. Há cinco décadas eram duas ou três semanas. “Hoje eles vêm para passar apenas de dois a três dias.”
Os planos do novo prefeito para tornar St. Moritz mais atraente é investir em cultura e cooperações. “Poucas localidades como a nossa oferecem tanta cultura em um espaço tão limitado: são 42 galerias e inúmeros convidados ilustres. Esse foi sempre o fascínio do vilarejo para mim”, confirma.
Novas ideias apesar do protesto
Esses visitantes ilustres têm suas expectativas e St. Moritz deve se esforçar em concretizá-las. Por essa razão Jenny não tem medo de tomar partido e, se necessário, até com os atores mais poderosos.
Por exemplo: uma habitante local queria impedir a construção de um novo museuLink externo. A ideia era patrocinada pelos herdeiros da Sika, um grande fabricante de produtos químicos para construção. O doador planejava um edifício com um museu de trenós, cinema e discoteca.
Jenny foi discutir pessoalmente com habitante contrariada. “Não é possível ignorar uma pessoa alegando imperativos legais”, justificou. A pessoa aceitou os argumentos e retirou a sua queixa.
Intervenções
Jenny também interveio pessoalmente em outro caso de importância local. O pivô do caso era Tyler Brûlé, um empresário de renome e fundador de uma revista chamada “MonocleLink externo“. Durante um ano o canadense tentou abrir um restaurante em St. Moritz. Porém todos os donos de possíveis locais bateram as portas para o canadense e o levaram a desistir do projeto. Agora o próprio prefeito ofereceu-se para encontrar uma solução. Quem sabe, talvez o influente trendsetter consiga agora abrir o seu tão almejado local.
A fim de evitar tais problemas no futuro, Jenny pretende lançar uma campanha de promoção de negócios, capaz de facilitar o relacionamento comercial entre proprietários de imóveis e empresários. Ele termina a entrevista com uma mensagem: “Minha vantagem é não ter pretensão de carreira política. Sou mais alguém para abrir as portas às novas ideias.”
Este artigo faz parte da série #DearDemocracia, a plataforma para democracia direta da swissinfo.ch. Aqui são articuladas opiniões de autores de nossa redação, bem como as opiniões de autores convidados. As opiniões aqui expressas não representam necessariamente as posições da swissinfo.ch.
Programa transmitido pela televisão suíça SRF sobre o direito de voto para estrangeiros em St. Moritz (idioma: dialeto suíço-alemão)
Adaptação: Alexander Thoele
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