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Fórum Econômico Mundial 2024: um circo ou um zoológico?

Clown and police at WEF
A grande operação de segurança do WEF: mantendo os palhaços à distância © Keystone / Laurent Gillieron

Enquanto os jatos, limusines e gurus da Inteligência Artificial deixam o resort montanhoso suíço de Davos, analisamos os principais pontos de discussão - e algumas imagens memoráveis - do encontro anual do Fórum Econômico Mundial (WEF) deste ano.

Com a poeira política baixando depois de uma “cúpula particularmente frenética”, nas palavras do Financial Times, os jornais suíços concordam que o WEF 2024 obteve um bom resultado para os anfitriões – mas o governo não deve se deixar levar pelos tapinhas nas costas.

“A Suíça sai fortalecida do WEF, e o governo mais dividido”, foi a manchete do editorial Link externodo jornal zuriquenho Neue Zürcher Zeitung (NZZ).

Parmelin, Cassis and Jans at WEF
Da esquerda à direita: o ministro suíço da Economia Guy Parmelin, o ministro do Exterior Ignazio Cassis e o novo ministro da Justiça Beat Jans durante uma sessão plenária do WEF © Keystone / Laurent Gillieron

“O Fórum Econômico Mundial chegou ao fim. E o mundo inteiro está falando sobre uma possível paz na Ucrânia – e sobre a Suíça”, reportou o jornal. A oferta do país de organizar uma cúpula de paz para a Ucrânia “rendeu ao governo suíço uma grande dose de boa vontade”.

As críticas internacionais, por exemplo, à recusa da Suíça neutra de permitir a reexportação de armas para a Ucrânia ou de congelar os bens russos, “foram silenciadas por enquanto”, disse o NZZ. “A percepção da Suíça mudou na semana passada – de suposta aproveitadora da guerra para potencial provedora da paz.”

Zelensky and Schwab
Todas as atenções se voltaram ao presidente da Ucrânia Volodymyr Zelensky, acompanhado do fundador do WEF Klaus Schwab © Keystone / Laurent Gillieron

Essa é a boa notícia, declarou o jornal, mas advertiu que notícias menos animadoras podem estar por vir. “Por trás da ofensiva de charme autoconfiante, discordâncias também puderam ser observadas em Davos. Por exemplo, no dossiê europeu, cuja prioridade foi um pouco rebaixada devido aos esforços de paz.”

O NZZ observou que, enquanto o “ato duplo” da Ministra da Defesa Viola Amherd, que também detém a presidência rotativa da Suíça este ano, e o Ministro das Relações Exteriores Ignazio Cassis “tentou espalhar euforia aqui também”, os dois ministros do governo do Partido Popular Suíço de direita, Albert Rösti e Guy Parmelin, continuaram a manter sua distância.

O jornal também observou que a ministra da Fazenda, Karin Keller-Sutter, do Partido Liberal Radical, de centro-direita, não deu uma única entrevista coletiva em Davos. “Isso não é necessariamente uma coisa ruim, mas deixa perguntas sem respostas: ela está se isolando como chefe do departamento multissetorial que sempre tem que lidar com todos?”

“Como o governo deve explicar à sua própria população que não tem dinheiro para um 13º mês de aposentadoria [sobre o qual os suíços votarão em 3 de março], mas o suficiente para ajudar os ucranianos?”, perguntou o jornal.

Taking off shoes
As regras de indumentária do WEF contemplam da neve à gala. © Keystone / Gian Ehrenzeller

‘Sucesso improvável’

“Sol radiante, neve, frio intenso e engarrafamentos intermináveis – a edição de 2024 do Fórum Econômico Mundial parece um clássico”, avaliou o correspondente do diário Tribune de Genève em Davos.

Sob a manchete “O improvável sucesso do WEF”, ele explicou Link externopor que o evento permaneceu altamente atraente, apesar das críticas e do aumento das conferências virtuais. 

“Raramente vi tanta empolgação no primeiro dia oficial”, disse ele, entusiasmado. “Claramente, o evento continua a ser um sucesso, mesmo que o contexto geopolítico seja sombrio e dificulte a interpretação do que realmente está sendo dito.” Em sua opinião, o WEF, que estava em declínio devido à proliferação de conferências on-line, “está se beneficiando de uma situação geopolítica em que governos, empresas e sociedade civil sentem a necessidade de se reunir”.

Group photo at WEF
Três dias de intenso ‘networking’ chegando ao fim: foto de grupo no último dia do 54° encontro anual do Fórum Econômico Mundial. © Keystone / Gian Ehrenzeller

De fato, este foi o primeiro fórum desde a Covid-19 a atrair multidões em um nível pré-pandêmico.

“Embora continue sendo um lugar onde a elite consome em excesso e viaja em limusines obscenas e prejudiciais ao meio ambiente, o WEF se tornou o lugar onde as COPs sobre mudanças climáticas são estendidas. Ele foi capaz de se adaptar ao mundo. Ele o influencia? Não tenho certeza, mas continua sendo uma plataforma essencial para o diálogo.”

‘É um zoológico!’

Ou não? O Tages Anzeiger, de Zurique, concordou que a cúpula deste ano foi, mais uma vez, muito mais marcada pela política do que nos anos anteriores, mas, em sua opinião, o WEF atendeu às expectativas apenas de forma limitada. “Os tópicos no palco eram muito variados”, afirmouLink externo seu correspondente.

Road sign in Davos
Confie nos políticos – mas não no GPS. © Keystone / Laurent Gillieron

O jornal listou os muitos líderes que usaram seus discursos para promover suas agendas: o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky colocou a Ucrânia na pauta logo no início, o presidente argentino Javier Milei usou sua primeira viagem ao exterior para condenar o socialismo e a intervenção estatal, o presidente israelense Isaac Herzog chamou o Irã de “império do mal” e o ministro das Relações Exteriores do Irã, Hossein Amir-Abdollahian, negou que seu país tenha vendido drones para a Rússia e disse que, enquanto Israel não cessar seus “crimes de guerra”, todos sofrerão.

“É de se duvidar que tais atitudes correspondam ao lema do fórum: ‘Reconstruindo a confiança'”, disse o Tages Anzeiger. “No entanto, isso é difícil sem diálogo. E em Davos não há diálogo. Os chefes de Estado e de governo geralmente falam um após o outro, e não uns com os outros.”

Está claro, continuou o artigo, que deve haver espaço para diferentes pontos de vista e posições em Davos. “É igualmente claro que o WEF só pode fornecer a plataforma e que cabe aos participantes usá-la ou não. Mas os saltos de agenda tornam o fórum arbitrário. Os palestrantes se sucedem no centro de congressos e os tópicos mudam constantemente. É difícil conseguir um diálogo real com esse sistema. Pelo menos nos vários palcos do centro de convenções. “Davos? Oh, é um zoológico’, disse um executivo de alto escalão de uma empresa suíça.”

Jane Goodall at WEF
Entre os vários cientistas presentes este ano, a primatologista Jane Goodall subiu ao palco de Davos acompanhada de um amigo. © Keystone / Gian Ehrenzeller

Inteligência Artificial (IA) foi outra questão que se disseminou pelas salas de reunião e painéis de Davos, sua promessa anunciada em cartazes e seus riscos de segurança invocados pelo primeiro-ministro da China, Li Qiang. Enquanto as conversas incluíam como regular a tecnologia em expansão e como aplicá-la à descoberta científica, a questão de como monetizá-la persistia. “Todo mundo traz essas  apresentações super ‘cool'”, disse o CEO da Cloudflare, Matthew Prince, “mas onde está o valor real?”

O Tages Anzeiger concluiu que, após cinco dias no WEF, o que resta é a “impressão de um parque de diversões repleto de ideias e tópicos aleatórios. Está claro que o fórum – mesmo sem tópicos econômicos genuínos no topo da agenda – é e continua sendo um evento comercial. Outras expectativas são simplesmente muito altas”.

Adaptado do original em inglês por Eduardo Simantob

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Este conteúdo foi publicado em No WEF 2024, a ênfase foi em IA, comércio, eleições e clima, eclipsando crises em Gaza e Ucrânia. #WEF2024 #EconomiaGlobal

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Eduardo Simantob

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