Anvisa defende decisão de vetar compra da vacina russa Sputnik V
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) afirmou nesta quinta-feira (29) que decidiu vetar a importação da vacina Sputnik V com base na informação enviada pelo próprio desenvolvedor russo, que ameaçou processar a agência por difamação.
“As informações sobre a presença de adenovírus replicante [uma versão viva do vírus] constam nos documentos entregues à Anvisa pelo desenvolvedor da vacina Sputnik V”, disse o diretor-presidente da agência, Antônio Barra Torres.
Após a rejeição de segunda-feira da importação de vacinas Sputnik V, os fabricantes russos anunciaram pelo Twitter a apresentação de uma ação judicial “por difamação contra a Anvisa por difundir informação falsa e incorreta”.
“A Anvisa fez declarações incorretas e enganosas sem ter testado a vacina Sputnik V”, destacaram os criadores do fármaco.
Barra ressaltou que a decisão da Anvisa baseou-se em evidências de que a vacina russa continha uma versão viva do adenovírus, que causa uma doença respiratória leve.
Barra Torres refutou as “graves acusações [do Sputnik] que impactam a confiança e credibilidade da autoridade sanitária brasileira”.
“A Anvisa foi acusada de mentir, de atuar de maneira antiética, e de produzir ‘fake news’ sobre a identificação do adenovírus replicante em documentos que tratam da vacina Sputnik V”, acrescentou.
– A porta continua aberta –
Apesar da polêmica, Barra Torres assegurou que a vacina russa ainda pode ser autorizada no Brasil, mediante a entrega de mais informações.
A avaliação atual “é um retrato temporal, ele pode ser modificado. Não estamos fechando portas a absolutamente nada. Esses dados apresentados podem ser revistos, corrigidos e reapresentados”, disse o diretor-presidente da Anvisa.
“Na segunda-feira passada não nos foi possível aprovar, o que nos deu grande tristeza. Foi o único motivo”, acrescentou.
Após a declaração, o Instituto Gamaleya, fabricante do Sputnik V, reiterou que sua vacina não contém o vírus replicador.
“Que bom que a Anvisa começa a esclarecer a confusão que criou”, disse em seu Twitter.
O pedido de importação da vacina russa foi feito por governadores do Nordeste, preocupados com a falta de imunizantes.
O Brasil, onde a pandemia já causou 400.000 mortes, iniciou sua campanha de vacinação contra a covid com grande atraso.
Até agora, usa duas vacinas: a chinesa CoronaVac, produzida em colaboração com o Instituto Butantan, e a sueco-britânica AstraZeneca – feita em conjunto com a Fundação Oswaldo Cruz.
Os dois imunizantes têm sofrido, no entanto, atrasos nas entregas.
A Sputnik V, do laboratório Gamaleya, está sendo usado em vários países além da Rússia, incluindo Bolívia, México, Argentina e Venezuela.
Mas até agora não foi aprovada pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA) ou pelo FDA (Federal Food and Drug Administration) dos Estados Unidos.
– Adenovírus –
Em sua exposição, os técnicos da Anvisa exibiram documentos e inclusive um vídeo de uma reunião virtual, realizada em março com os fabricantes russos para sanar estas dúvidas.
O problema se centra em um “vetor de adenovírus”, um patógeno que normalmente causa doença respiratória leve, mas que nas vacinas é modificado geneticamente para impedir sua replicação.
Esse patógeno também é modificado para portar instruções de DNA a fim de que as células humanas desenvolvam a proteína ‘spike’ do coronavírus, causador da doença.
Isto, por sua vez, treina o sistema imunológico caso se depare com o coronavírus real.
O colegiado de cinco diretores da Anvisa acolheu a documentação da área técnica do organismo, que identificou diversas “incertezas” em relação à segurança e eficácia do imunizante, que ainda não foi aprovado pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA), nem pela FDA (Agência Federal de Alimentos e Medicamentos) dos Estados Unidos.