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Nestlé sofre sanções por maquiagem de produtos no Brasil

Fábrica da Nestlé recém inaugurada em Feira de Santana, Bahia. Keystone

Empresa do setor alimentício mais conhecida e admirada pelos brasileiros, segundo a pesquisa "Top of Mind" realizada pelo Ibope no ano passado, a Nestlé vive uma crise sem precedentes junto ao Ministério da Justiça no Brasil.

A empresa suíça é acusada de diminuir o peso ou a quantidade de nutrientes em diversos de seus produtos sem reduzir o preço ou informar as mudanças aos consumidores.

Na última autuação, ocorrida no dia 26 de agosto, a Nestlé e a Dairy Partners Brasil (empresa à qual a Nestlé terceiriza parte de sua produção no país) foram multadas em R$ 94,5 mil por reduzir o peso das bebidas lácteas Neston e Molico sem que fossem feitas as devidas advertências nas embalagens.

Segundo o DPDC, a alteração nos pesos ou componentes de qualquer produto não configura irregularidade em si, mas ao não advertir os consumidores, a Nestlé incorreu no crime conhecido como maquiagem de produto.

De acordo com o órgão fiscalizador, as bebidas Molico Batido e Molico Polpa de Frutas tiveram seus pesos reduzidos de 950g para 850g (embalagem grande) e de 190g para 170g (pequena). A bebida Neston Três Cereais, por sua vez, teve suas embalagens reduzidas de 1kg para 900g e de 200g para 180g, respectivamente.

A Nestlé tem 30 dias, a contar da data da multa, para recorrer junto à Secretaria de Direito Econômico (SDE), também subordinada ao Ministério da Justiça.

Em nota pública, a Nestlé afirma que “na linha de sua postura de respeito ao direito de informação do consumidor, atende a todas as exigências legais aplicáveis à embalagem e rotulagem de alimentos, em especial no que se refere à informação da alteração da quantidade de seus produtos”.

Reincidência

Apesar da argumentação apresentada, o fato é que a empresa suíça é reincidente nesse tipo de irregularidade. No caso considerado mais grave, o DPDC autuou em março deste ano a Nestlé no valor de R$ 591 mil por prática de maquiagem nas embalagens de seis tipos de produtos, entre biscoitos, cereais e chocolates.

A Nestlé deu entrada em um pedido de anulação da cobrança dessa multa, mas na última quinta-feira (4) o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (Brasília) confirmou a multa, que também já havia sido corroborada pela SDE.

Na autuação de março, a Nestlé foi acusada de reduzir de 200g para 160g a embalagem do biscoito Tostines, e de 200g para 170g a embalagem do chocolate branco Galak. A pior irregularidade constatada pelo DPDC, no entanto, foi a redução de nutrientes na Farinha Láctea, o produto clássico da empresa suíça no Brasil.

Segundo os laudos, houve redução de Vitamina A (600mg para 375mg), Ferro (12mg para 7,5mg), Vitamina D (12 mg para 7,5 mg), Cálcio Fólico (90mg para 56 mg) e Vitamina C (54mg para 34mg), entre outros nutrientes.

Histórico

Mas, o histórico de problemas da Nestlé com o DPDC não pára por aí. Em janeiro de 2007, a empresa já havia sido objeto de outra pesada multa, no valor de R$ 394,1 mil, por praticar redução de peso sem advertência nas embalagens de uma outra série de produtos, que desta vez incluíam chocolates em barra, ração para animais e outro produto tradicional da marca suíça: as papinhas alimentares para crianças na primeira infância.

Segundo o DPDC, as investigações demonstraram que os casos de maquiagem de produtos feitos pela Nestlé no Brasil remontam a 2001, e atingiram pelo menos 44 produtos da respeitada empresa, como as conhecidas marcas de chocolate Crunch, de cereal Neston e de leite em pó infantil Nan, entre outros.

Por intermédio de sua assessoria de imprensa, o Ministério da Justiça informa que “o Código de Defesa do Consumidor permite que os fabricantes reduzam a quantidade de um produto sem reduzir o preço, desde que façam campanha ou anunciem a mudança com destaque na embalagem por um prazo mínimo de três meses”.

Presidente da Nestlé reage

Além da nota oficial na qual nega as irregularidades, a direção da Nestlé tem preferido manter discrição acerca dos casos envolvendo as multas aplicadas pelo DPDC até que os mesmos sejam julgados de forma definitiva. No entanto, uma coluna do jornalista Elio Gaspari publicada simultaneamente em alguns dos principais jornais do país -na qual o jornalista “psicografa” uma carta do fundador da empresa, Henri Nestlé, ao seu presidente no Brasil, Ivan Zurita – provocou uma rara reação deste último.

Em carta aberta, também divulgada nos principais jornais brasileiros, Zurita afirma que “só é noticiada pela mídia a aplicação da multa, e não as decisões que consideram tais multas exageradas ou descabidas”.

O presidente da Nestlé Brasil afirma ainda que “hoje, o consumidor, com família menos numerosa, busca produtos que atendam às suas necessidades e à sua capacidade financeira. Assim, os produtos são em quantidades adequadas que requerem menor reembolso. Nesse contexto é que deve ser analisada a redução de peso de embalagens e outras alterações nos produtos”.

swissinfo, Maurício Thuswohl, Rio de Janeiro

A Nestlé esclarece que, em respeito absoluto ao direito de informação do consumidor, atende a todas as exigências legais aplicáveis à rotulagem e embalagem de alimentos.

Por esta razão, a empresa apresentará os competentes recursos em relação às decisões proferidas pelo Ministério da Justiça – sobre alteração da quantidade de Molico e Neston, promovida em 2004, em que pese o consumidor ter sido devidamente informado de acordo com os preceitos legais vigentes – e pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região – sobre a alteração da composição de Farinha Láctea –, já que tais decisões não são definitivas.

Assessoria de imprensa da Nestlé Brasil
São Paulo, 10 de setembro de 2008.

Segundo o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), reduzir o peso dos produtos sem reduzir seu preço ou advertir de maneira adequada ao consumidor – a chamada maquiagem – é uma prática adotada por diversas empresas no Brasil.

Desde 2001, o órgão fiscalizador subordinado ao Ministério da Justiça já abriu uma centena de processos contra cerca de 35 empresas ou fabricantes dos setores alimentício, farmacêutico e químico, entre outros.

Mas não é só a maquiagem de produtos que configura prática ilegal. Em março deste ano, por exemplo, o DPDC multou o banco de origem holandesa ABN Amro Bank em R$ 532 mil por ter enviado cartões de crédito a seus clientes sem que eles houvessem solicitado.

Outras empresas conhecidas que estão na lista de processos abertos recentemente pelo DPDC são a Pepsico, a Marilan e a Cipa, todas atuantes no setor alimentício.

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