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Caso do UBS revela prática de serviço secreto

Uma das técnicas usadas: uso de telefones celulares descartáveis para evitar ser rastreado. Reuters

O mundo sofisticado e sombrio da evasão fiscal foi revelado até nos últimos detalhes através de um tratado que entrega correntistas do UBS ao governo americano.

Os clientes do maior banco helvético, que usavam empresas de fachada, telefones celulares descartáveis e até cartões de crédito para canalizar dinheiro à Suíça, também serão investigados pelas autoridades fiscais dos Estados Unidos.

Logo depois que o UBS confessou que alguns dos seus funcionários ajudaram ativamente cidadãos americanos a sonegar impostos, o governo suíço firmou um acordo com os Estados Unidos em agosto para entregar nomes de 4.450 clientes do UBS. Foi o preço a pagar para evitar a falência do UBS nos Estados Unidos.

Os detalhes dos nomes que seriam divulgados foram mantidos em sigilo até o prazo final da recente anistia oferecida pela receita federal dos EUA (IRS na sigla em inglês).

O Ministério suíço da Justiça declarou na terça-feira (17/11) que o bloco principal das contas selecionadas é de depósitos a partir de um milhão de francos. Porém o limite pode ser reduzido a 250 mil francos se houver uma prova concreta de fraude.

O comissário do IRS, Doug Shulman, afirma que os critérios serviam para as contas que eram as “maiores, mais difíceis de encontrar e com o comportamento mais flagrante”.

Um bom exemplo, coberto pelo tratado, seria a propriedade indireta de conta-correntes. Em outras palavras, clientes que escondem a sua identidade através de “trusts” (ver coluna da direita) no exterior, empresas ou fundações – muitas vezes sob o nome de terceiros – que encaminham os ativos para contas bancárias suíças.

“Completamente pessimista”


Medidas adicionais de proteção poderiam incluir o uso de telefones celulares descartáveis para impedir que usuário seja rastreado e também a retirada de dinheiro de contas não declaradas através de cartões de crédito emitidos em outro país.

O advogado suíço especializado em direito fiscal, Paolo Bernasconi, contou ao jornal Le Temps, de Genebra, que houve uma profusão de contas “offshore” (fora dos EUA), criadas pelos bancos suíços para contornar a introdução da Diretriz de Poupanças da União Europeia em 2005.

Ao transferir bens para a Suíça através de uma operação desse tipo no Panamá, por exemplo, o cliente poderia escapar tendo parte dos seus ganhos de juros desviados pelo banco em direção ao seu país de domicílio na União Europeia.

Acabar com esse sistema teria efeitos profundos sobre o mercado financeiro suíço – um “desastre”, como Bernasconi o considera. “Dessa vez, temos elementos para sermos absolutamente pessimistas na questão”, disse ao Le Temps.

Falso início


O IRS reivindica uma grande vitória na luta contra a evasão fiscal pelo fato de 14.700 pessoas se declararem durante o período da anistia. Mas o advogado especializado em direito fiscal nos EUA, Asher Rubinstein, acredita que a maioria deles são apenas pequenos “peixes” dos fundos depositados nas contas.

O escritório de advocacia sediado em Nova Iorque, Rubinstein & Rubinstein, já aconselhou clientes de todos os calibres financeiros. Porém poucos dos que tinham ativos acima de 10 milhões de francos, o grupo que preferencialmente utilizaria a estratégia de contas offshore com filtros – decidiram regularizar sua situação. Isso mesmo nos últimos dias da anistia, quando houve um aumento repentino do número de voluntários.

“Se um contribuinte americano, detentor de 100 milhões de dólares decide que não vai entregar metade dos seus bens (pagamento retroativo de impostos), não penso que ele teria mudado de ideia nos últimos dias do programa”, avalia Rubinstein. “Algumas pessoas podem ter um motivo religioso e dar um passo, mas muitos não poderiam digerir a perda de uma parcela tão grande de suas contas.”

Rubinstein adverte que clientes do UBS tinham mais disposição de falar do que aqueles com contas em outros bancos e que a revelação dos detalhes na terça-feira pode levar mais pessoas a fazê-lo. Mas ele continua convencido de que muitos sonegadores continuam se escondendo.

“Esse comportamento deve ser influenciado pela confiança no sigilo passado, fazendo de conta que não aconteceu nada ou simplesmente esperando que, apesar do acordo de 2009, eles continuarão protegidos pelo segredo”, disse.

Rubinstein alerta para o fato de que mesmo os mais sofisticados métodos de disfarçar a identidade, enchendo os bolsos de dinheiro não declarado, podem estar fadados ao fracasso, sobretudo se levar em conta o nível atual de cooperação entre as autoridades suíças e americanas.

“Todos os códigos podem ser quebrados e casos recentes (como a investigação do UBS e a revelação do acordo entre a Suíça e os EUA) mostraram que essas administradoras de holdings são extremamente vulneráveis”, conclui.

Matthew Allen, swissinfo.ch
(Adaptação: Alexander Thoele)

Em agosto o governo suíço concordou em revelar o nome de 4.450 clientes do UBS aos EUA. A decisão foi posterior a uma investigação realizada pelas autoridades fiscais americanas (IRS, na sigla em inglês), que descobriu que alguns dos funcionários do maior banco helvético aconselharam sonegadores americanos.

O UBS é obrigado a transmitir detalhes para o governo suíço. Este depois irá passar os nomes das pessoas envolvidas às autoridades americanas.

O critério para selecionar os nomes incluem quaisquer clientes domiciliados nos Estados Unidos, proprietários de contas não declaradas com um valor superior a um milhão de francos suíços entre 2001 e 2008, onde há suspeita de “fraude fiscal ou atos semelhantes”.

Se a fraude for comprovada, o limite pode ser reduzido para 250 mil francos. Isso inclui pessoas que transferiram fundos de uma trust (estipulação testamentária em que o testador constitui uma pessoa como legatário ou herdeiro, mas impõe que, uma vez verificada certa condição, deverá transmitir a outra pessoa, por ele indicada, o legado ou a herança; substituição, empresaa ou fundação onde não está constando o seu nome.

Cidadãos americanos também correm risco de ter seus dados revelados se sua conta tem ganhos não declarados de 100 mil francos, em média, em juros e dividendos no espaço de três anos, entre 2001 e 2008.

Os primeiros 500 nomes serão entregues no final do mês e o restante até agosto do ano que vem.

Essas pessoas incluídas na lista terão trinta dias para recorrer ao Tribunal Administrativo Federal suíço.

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