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Como funciona o Parlamento suíço?

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Não é tão complicado, mas algumas peculiaridades do Parlamento federal talvez sejam ignoradas às vezes. Keystone / Peter Klaunzer

Eleições parlamentares de 22 de outubro de 2023: o eleitorado está convocado a votar nos candidatos a uma instituição que já existe há 175 anos. Como ela funciona? swissinfo.ch explica.

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Você, leitor ou leitora, está acostumado a dissolução de governos, Parlamentos ou até impeachment no seu país? A partidos que aumentam seu eleitorado de 5 a 30% ou vice-versa, de uma eleição a outra? Se você acha que essas evoluções fazem parte da democracia, então ignore as eleições na Suíça.

No país, quando as pesquisas eleitorais são publicadas, a maioria debate sobre o declínio do Partido Verde (PV) ou o avanço do Partido do Povo Suíço (SVP). Declínio e avanço? Os primeiros perderiam 2,5% dos votos em relação a 2019. Já o segundo partido progrediria 1%, de acordo com a última pesquisa de março. A margem de erro é de 1,2%…

Sim, pois se há um elemento que distingue o Parlamento helvético, é a sua extraordinária estabilidade. Não que sua composição tenha permanecido idêntica nos últimos 175 anos. Muito pelo contrário: nos últimos vinte anos, por exemplo, o SVP cresceu, quase triplicando sua força eleitoral entre 1991 e 2015. Além disso, surgiram duas novas forças, o PV e o Partido Verde Liberal (PVL) que, em comparação com formações mais ou menos efêmeras da história política do país, não parecem destinadas a desaparecer tão cedo.

Mas, em comparação com outras democracias ocidentais, na Suíça a mudança de equilíbrios é mais tectônica do que telúrica, como se pode observar neste gráfico, que resume a força dos partidos no Conselho Nacional (Câmara dos Deputados), onde os representantes são eleitores desde 1919 pelo sistema proporcional.

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Duas Câmaras e 246 assentos

A Assembleia Federal – este é o nome oficial do Parlamento suíço – é composta por duas câmaras: o Conselho dos Estados (Senado), que representa os cantões e conta com 46 membros. E o Conselho Nacional, do qual fazem parte 200 deputados-federais.

O vídeo abaixo explica como funcionam as eleições na Suíça:

Este sistema bicameral, instituído em 1848 após o nascimento do Estado federal, se inspirou nos Estados Unidos. Os dois órgãos têm as mesmas competências e toda decisão requer a aprovação das duas câmaras.

O número de representantes no Conselho dos Estados foi sempre o mesmo: dois “senadores” ou “senadoras” por cantão (estado, na Suíça) e um para cada um dos seis semicantõesLink externo. Em outras palavras, 44 membros até 1978 e 46 a partir de 1979, ano em que o cantão do Jura entrou na Confederação.

O Conselho Nacional, por outro lado, passou por várias mudanças. Em 1848, contava com 111 membros. Cada deputado-federal (o masculino é obrigatório, já que as primeiras mulheres foram eleitas para o Parlamento em 1971, após a introdução do sufrágio feminino) representava cerca de 20 mil habitantes (incluindo estrangeiros). O crescimento demográfico resultou em um aumento progressivo do quadro. Desde 1962, é fixado em 200. Hoje, cada membro do Conselho Nacional representa cerca de 40 mil habitantes.

Cada cantão tem um número proporcional de deputados-federais de acordo com sua população. Zurique, por exemplo, tem direito a 35 assentos. Appenzell Rodes interior e outros cantões pequenos têm apenas um. Acontece com frequência relativa que um cantão ganhe ou perca um assento, dependendo de seu desenvolvimento demográfico.

Outra peculiaridade suíça (e relacionada ao federalismo) é que o Conselho dos Estados, por ser a expressão dos cantões, é eleito de acordo com o direito cantonal. Na teoria, então, um cantão pode decidir eleger seus representantes como e quando achar melhor. Na prática, no entanto, as eleições acontecem simultaneamente às do Conselho Nacional, com exceção de Appenzell Rodes interior, que nomeia seu representante no mês de abril anterior às eleições federais.

Em Neuchâtel e Jura, os representantes no Conselho dos Estados podem ser eleitos mesmo por eleitores sem a nacionalidade suíça. Estes cantões são, na verdade, os únicos no país a conceder o direito de voto a nível cantonal a estrangeiros.

Maioritário ou proporcional?

As eleições para o Conselho dos Estados são realizadas praticamente em todos os lugares com o sistema majoritário. Apenas Neuchâtel e Jura aplicam o sistema proporcional.

O Conselho Nacional, por outro lado, é eleito desde 1919 com o sistema proporcional. As circunscrições eleitorais são os cantões.

Essa coexistência de um sistema majoritário e um sistema proporcional tem uma influência não marginal sobre o peso dos partidos no Parlamento. No Conselho Nacional, a representação é determinada pela porcentagem de votos obtida por cada partido. A propósito: essa porcentagem é geralmente utilizada para analisar o resultado de uma eleição e a progressão (ou retração) de um ou outro campo político.

O sistema majoritário aplicado nas eleições para o Conselho dos Estados, no entanto, não favorece necessariamente o partido numericamente mais forte a nível nacional. Outras considerações prevalecem: enraizamento de um partido no cantão, capacidade de criar alianças para apresentar um único candidato/a, vocação ao consenso deste último.

Não é por acaso que o Conselho dos Estados seja ainda dominado por dois partidos históricos, que nas últimas eleições conquistaram juntos pouco mais de 26% dos votos. O Partido do Centro (Mitte) e o Partido Liberal (PL) têm 25 assentos (13 – Mitte, 12 – PL) de um total de 46. O maior partido suíço, o SVP, com uma porcentagem de votos de 25,6%, obteve apenas seis assentos.

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Força do Parlamento suíço

Ao contrário do que acontece em outros países, por exemplo nos Estados Unidos, onde o presidente pode vetar certas normas, o Parlamento suíço é imune aos outros dois poderes. Suas decisões não podem ser contestadas pelo Poder Executivo. Sua constitucionalidade também não pode ser questionada pelo Tribunal Federal, a mais alta instância jurídica na Suíça.

Por outro lado, na Suíça não há moção de censura e a Assembleia Federal não pode destituir o governo. Nem pode remover um ministro durante seu mandato, exceto em casos excepcionais como uma doença grave.

A única possibilidade que o Parlamento tem de manifestar seu eventual descontentamento com um membro do executivo é na ocasião da eleição do governo, que ocorre a cada quatro anos no mês de dezembro, após as eleições federais. O sistema de concordância que caracteriza o sistema político suíço, no entanto, faz com que esse tipo de contestação seja extremamente raro. Desde 1848, apenas quatro ministros não foram confirmados pelo Parlamento. O último foi Christoph Blocher (ministro da Justiça e membro do SVP) em 2007.

Na Suíça, também não há antagonismo entre maioria e oposição. Na maior parte dos casos, o governo e o Parlamento devem buscar um compromisso para que seja apoiado por uma maioria, que pode variar de tempos em tempos, já que não há um acordo de coalizão entre as forças políticas. Ao mesmo tempo, os membros do legislativo dos partidos governistas não são obrigados a apoiar as decisões do Poder Executivo.

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Isso faz com que a Suíça não viva crises de governo ou eleições antecipadas. A atual legislatura é a 51ª desde 1848.

Se suas decisões são lei, sobre o Parlamento suíço paira sempre a espada de Dâmocles: o chamado “referendo facultativo”. Por meio da coleta de 50 mil assinaturas em até 100 dias após a publicação oficial do ato, qualquer eleitor pode se opor às decisões do Legislativo, solicitando que a lei ou o decreto federal sejam submetidos ao julgamento do eleitorado.

Partidos históricos

Desde a fundação do Estado Federal em 1848 até a introdução do sistema proporcional em 1917, a Assembleia Federal foi dominada pelo Partido Liberal (PL), com a única oposição dos Católicos Conservadores (hoje chamado “Mitte”).

A introdução do sistema proporcional para a eleição do Conselho Nacional em 1919 mudou o jogo, permitindo que partidos que até então haviam se contentado com migalhas começassem a pesar realmente na política nacional. Naquele ano, por exemplo, o Partido Socialista passou de 22 a 41 representantes. Nas mesmas eleições, o “Partido dos Agricultores, Artesãos e Independentes” entrou com força. Transformado no SVP em 1971, hoje essa formação é o partido majoritário relativo no Parlamento suíço.

Embora com altos e baixos, esses quatro partidos dominaram o cenário político suíço ao longo do século 20. No entanto, desde o final do milênio, com a crescente conscientização ambiental, o PV e o PVL embaralharam as cartas, de modo que nas últimas eleições federais conquistaram juntos um quinto das cadeiras da Assembleia Federal.

Ao longo desses 175 anos de história parlamentar, é claro que não faltaram partidos menores, às vezes efêmeros ou enraizados apenas em certos cantões, durando talvez o espaço de algumas legislaturas, mas que às vezes conseguiram ditar o ritmo em certos temas. Pode-se pensar, por exemplo, na “Ação NacionalLink externo” e em seu chefe, James Schwarzenbach. Este partido de extrema direita, que chegou a ter um máximo de cinco assentos, foi a origem das iniciativas antimigratórias dos anos 1970.

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Menos efêmero, no entanto, foi o “Circulo dos IndependentistasLink externo“, que contou com representantes no Conselho Nacional – e até mesmo no Conselho dos Estados – de 1935 a 1999. O movimento criado pelo fundador da rede de supermercados Migros, Gottlieb Duttweiler, em 1935, com o objetivo de lutar contra o poder excessivo dos lobbies no Parlamento, conseguiu no final dos anos 1970 quase 10% dos votos, para depois lentamente se dissolver até ser extinto em 1999.

Também pode ser mencionado o “Partido ComunistaLink externo“, que na Suíça nunca conseguiu se estabelecer, pelo menos a nível nacional, e foi proibido em 1940, sendo substituído em 1944 pelo “Partido do TrabalhoLink externo“. Ou o “Partido dos AutomobilistasLink externo“, uma formação de direita contrária à regulamentação estatal na área econômica e de proteção ambiental, fundado em 1985 e posteriormente rebatizado como “Partido da Liberdade”.

Parlamento de milícia

Muitos acreditariam que o termo “milícia” está relacionado às forças armadas. Porém essa expressão designa “um princípio organizacional difundido na vida pública suíça, baseado na ideia republicana de que todo cidadão apto deve assumir, honorificamente ou como atividade secundária, cargos e funções públicas”, explicaLink externo o Dicionário Histórico da Suíça.

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No contexto político e institucional suíço, o sistema de milícia é entendido como o oposto do profissionalismo. O Parlamento suíço é composto por políticos que, além de suas atividades parlamentares, ainda tem o seu próprio trabalho. Ou melhor, essa era a visão ideal que prevaleceu até algumas décadas atrás.

Hoje, o trabalho de parlamentar tornou-se mais complexo e absorve o equivalente a uma atividade de 50%. Praticamente um em cada três eleitos é um político em tempo integral, segundo uma pesquisaLink externo realizada pela Universidade de Lausanne em 2019.

Até o final dos anos 1960, os membros da Assembleia Federal não recebiam salário, mas sim diárias e subsídios de viagem. Hoje os deputados e senadores recebem uma remuneração anual de 26 mil francos suíços, uma diária de 440 francos por dia de sessão, uma indenização de 33 mil francos para cobrir despesas de pessoal e material e vários outros subsídios para viagens, refeições e pernoites.

Entre 2011 e 2015, a renda bruta média foi de 68.400 francos para os membros do Conselho Nacional e de 79.500 para os do Conselho dos Estados (que geralmente participam de um maior número de sessões de comissões e delegações), segundo um estudoLink externo da Universidade de Genebra.

A essa renda direta, no entanto, devem ser adicionados os pagamentos fixos não gastos, em particular a parte não utilizada para indenizações de despesas com pessoal. Em outras palavras, um membro da Assembleia Federal pode ganhar cerca de 100 mil francos por ano, um salários que está acima da média salarial nacional, que é pouco mais de 80 mil francos.

Comparados aos salários de muitos de seus homólogos europeus, os parlamentares suíços são definitivamente mal pagos. Na Itália, por exemplo, onde o custo de vida é muito mais baixo em comparação com a Suíça e a renda média é pouco mais de 30 mil euros, os membros da Câmara e do Senado recebem mensalmente cerca de 14 mil euros. Em Bruxelas, os eurodeputados têm um salário mensal bruto de 9.400 euros, sem contar os vários subsídios que ainda recebem.

Em resumo, ser político na Suíça não é certamente o trabalho mais bem pago.

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Quem pode se tornar deputado ou senador?

Qualquer cidadão suíço, homem ou mulher, com mais de 18 anos, residente ou não na Confederação, pode ser eleito para o Parlamento. A maioria dos parlamentares pertence a um partido político, mas isso não é obrigatório. É possível ser eleito sem ser membro de um partido. Apenas pessoas interditadas por enfermidade ou fraqueza mental são excluídas.

Na legislatura atual, o Conselho Nacional é composto por 41,5% de mulheres, enquanto o Conselho dos Estados continua a ser um reduto masculino. Apenas uma em cada quatro ‘senadoras’ é mulher.

No Conselho Nacional, a idade média é de 51 anos, enquanto no Conselho dos Estados é de 57 anos. Essa estatística demográfica permaneceu praticamente estável desde o início do século 20, embora nos últimos 30 anos a idade média no Conselho Nacional tenha diminuído ligeiramente.

Diplomados: 60% dos candidados eleitos possuem um diploma acadêmico. No entanto, a porcentagem varia significativamente de um partido para outro. Entre os membros do PVL a proporção é de quase 90%, enquanto nas fileiras do SVP essa proporção cai para 33%, de acordo com uma pesquisaLink externo da Universidade de Lausanne sobre o perfil socioprofissional dos membros do Parlamento.

Em relação às profissões, o perfil dos membros do Parlamento suíço, como geralmente ocorre, não reflete inteiramente a sociedade. Além dos profissionais da política, destacam-se – embora não seja uma surpresa – uma proporção elevada de executivos de empresas, advogados, agricultores ou professores.

Os advogados, por exemplo, representam cerca de 0,3% da população ativa, enquanto no Parlamento ocupam mais de um décimo dos assentos. Isso vale para os agricultores: são cerca de 1% da população ativa, mas seu peso no Legislativo é consideravelmente maior.

Adaptação: Alexander Thoele

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