Perspectivas suíças em 10 idiomas

Alvoroço na Argentina por editorial contra julgamentos pelos crimes da ditadura

Foto divulgada pela equipe de jornalistas do jornal La Nación mostra os jornalistas segurando cartazes em repúdio ao editorial do jornal, em Vicente Lopez, Argentina, no dia 23 de novembro de 2015 afp_tickers

Um editorial do jornal La Nación que pedia o fim dos julgamentos por crimes da ditadura (1976/83) causou exaltação na Argentina e foi repudiado por organismos humanitários, como o das Avós da Praça de Maio.

O artigo publicado na segunda-feira sob o título “No más venganza” (sem mais vingança), foi interpretado como uma pressão ao recém-eleito presidente da Argentina, o liberal de direita Mauricio Macri, que derrotou o governista Daniel Scioli no segundo turno das eleições de domingo.

O editorial pedia ao novo governo que resolvesse “o vergonhoso padecimento dos condenados, processados e inclusive suspeitos da comissão de crimes contra a humanidade durante os anos da repressão subversiva e que se encontram presos, apesar de sua idade avançada”.

Em resposta, a líder das Avós da Praça de Maio, Estela Carlotto, advertiu que “quem comete um delito tem que pagar por ele com o que corresponda a lei. Se são prisões perpétuas, não importa a idade”.

“São pessoas muito perigosas, o que o La Nación não menciona. São pessoas mais velhas que não se arrependem, não confessam; além disso, prometem voltar a fazê-lo caso seja necessário”, afirmou, em declarações ao canal Telesur.

Os funcionários do jornal rejeitaram o artigo e emitiram um comunicado para “repudiar o editorial contra os julgamentos por crimes contra a humanidade”, que, disseram, “em nada nos representa”.

“Sim à democracia, à continuidade desses julgamentos. Dizemos não ao esquecimento”, expressaram em texto difundido inicialmente nas redes sociais e publicado, nesta terça-feira, nas páginas internas do mesmo jornal.

Uma foto de toda a equipe de jornalistas do La Nación acompanhou o comunicado.

Mais de 500 sentenças, muitas delas à prisão perpétua, foram produzidas em dezenas de julgamentos devido aos crimes contra a humanidade ocorridos durante a ditadura.

Esses julgamentos foram retomados em 2003, após a anulação de duas leis de anistia da década de 1980, por impulso do ex-presidente Néstor Kirchner (2003/2007).

A ditadura argentina deixou 30 mil desaparecidos e cerca de 500 crianças foram roubadas durante o cativeiro de seus pais e apropriadas, isto é, entregues ilegalmente a pessoas vinculadas ao regime.

O trabalho das Avós, organização criada em 1977, em plena ditadura, possibilitou a recuperação da identidade de 118 dessas crianças roubadas, hoje já adultas. A última foi encontrada há apenas 20 dias.

Na segunda-feira, em sua primeira coletiva de imprensa, Macri assegurou que dará continuidade aos processos judiciais contra os civis e militares acusados de crimes durante a ditadura.

Mais lidos

Os mais discutidos

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR